“A direita no Congresso se mobilizou com sucesso para acabar com as saidinhas da cadeia em datas festivas. Disse, com razão, que são intoleráveis assassinatos e outros crimes violentos cometidos durante o Natal ou o Dia dos Pais, por bandidos que não deveriam ter deixado a prisão. Até que o Estado seja capaz de realizar uma triagem correta, faz sentido restringir as saidinhas.
O mesmo raciocínio precisa valer para o caso das armas. Também são intoleráveis os assassinatos cometidos por bandidos que burlaram os mecanismos de compra e registro legal para obter fuzis ou pistolas. Enquanto não for possível controlar de verdade o destino das armas, é preciso endurecer as regras de acesso a elas.
Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) obtido pelo Estadão mostra que nos últimos anos a bandidagem conseguiu comprar e registrar armamento em grande quantidade, escapando ao controle do Exército – o órgão que o governo Bolsonaro tornou responsável pelos registros.
Os criminosos se apresentam como Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs) para obter suas armas de maneira ‘regular”’ Cabe ao Estado verificar se cumprem as exigências da lei, mas os militares falharam nessa tarefa.
O Exército não consegue verificar se atestados de “nada consta” da Justiça Criminal são procedentes, muito menos se a pessoa que pleiteia o direito ao armamento tem ocupação lícita. Vai engolindo autodeclarações falsas de idoneidade. Como resultado, cerca de 5 mil pessoas condenadas criminalmente conseguiram comprar armas entre 2019 e 2022. Mais da metade delas tinha mandado de prisão em aberto.
Outra falha grave: mais de 20 mil armas continuam com registro regular, muito embora seus donos tenham morrido. Sabe-se há muito tempo que esse é um dos principais caminhos para que armas cheguem ao mercado paralelo: adquiridas de maneira legítima, acabam caindo nas mãos da bandidagem em algum momento, por roubo ou outro tipo de desvio.
É óbvio que tudo isso deixa os criminosos mais equipados para a barbárie e o Brasil mais inseguro.
E que a bancada da bala não venha com estatísticas, dizendo que os bem intencionados não devem pagar pelos criminosos. No caso das saidinhas, criminosos que não retornam à penitenciária no fim do período estabelecido são uma minoria de 5% ou 6% do total. Adotou-se uma lógica: se mortes nas saidinhas tornaram-se uma praxe que pode ser evitada, cabe então evitá-la.
Assim também para as armas: se os bandidos passaram a obtê-las com maior facilidade, cabe impedir que isso aconteça. Até porque nenhuma estatística digna de crédito mostra que o acesso de pessoas comuns a armamentos tem algum impacto sobre a criminalidade.
A insegurança no Brasil tornou-se uma chaga profunda demais. É inaceitável que esquerda e direita percam tempo com pautas de estimação enquanto o país queima. Não há que insistir em políticas que não deram certo e não tem como dar certo no curto prazo. A vida das possíveis vítimas precisa vir em primeiro lugar…”
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