As queimadas podem dar ao Brasil a chance de recuperar o prestígio perdido.
Antes, o governo precisa deixar de culpar outros pelo que é de sua responsabilidade.
É o entendimento do empresário e articulista Nuno Vasconcellos:
“De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), órgão responsável pelo acompanhamento das queimadas no Brasil, o mês passado encerrou com um total de 68.635 focos de incêndio registrados em todo o país. O número significa um crescimento de mais de 140% em relação aos 28.056 focos de incêndio registrados em agosto de 2023. O número é assustador, mas está longe de ser o recorde histórico. Em 2007, para se ter uma ideia, o Programa Queimadas do INPE registrou nada menos que 91.085 incêndios em todo o país.
Seja como for, os quase 70 mil focos de incêndio do mês passado se espalharam pelo Brasil inteiro. Todos os biomas foram atingidos. O Pampa gaúcho foi o menos afetado — com pouco menos de 70 focos de fogo, ou 0,1% do total. Em seguida, veio a Caatinga nordestina, com 1,8% do total. Depois, o Pantanal que se estende pelo Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, com 6,4%. A Mata Atlântica vem na sequência, com 8,8%. O Cerrado, que cobre as extensas áreas agrícolas do Sudeste, boa parte do Centro Oeste e um pedacinho da Amazônia, fica com 27,1% do fogaréu. Os 55,8% restantes afetaram a Amazônia.
Pelo que se vê, o problema é grande demais para ter sido tratado pelo governo como se tudo não passasse de uma manobra orquestrada por forças contrárias ao presidente Lula com o objetivo de criar dificuldades. ‘Esse fogo é criminoso’, disse o presidente na terça-feira passada em Manaus, num evento em que se reuniu com prefeitos amazonenses para tratar de medidas de combate aos efeitos da estiagem.
No encontro, Lula ofereceu mais uma dose do único remédio que os governantes brasileiros conhecem para lidar com situações emergenciais. Ofereceu dinheiro para obras porque, segundo ele, os prefeitos da Amazônia ‘têm direito’ a isso. Os recursos se destinam basicamente a dragagem de rios e igarapés na tentativa de melhorar a navegabilidade e oferecer condições de operação, ainda que precárias, àquela que é a única forma de acesso a muitos dos 62 municípios amazonenses.
Em muitos casos, as catraias, voadeiras, rabetas, balsas, navios e outras embarcações que viajam pelo rio Amazonas e seus afluentes são as únicas formas de se chegar a povoados ribeirinhos. Mas, como já foi dito, mas não custa repetir, é preciso mais do que dinheiro para resolver um problema que ano após ano vem se agravando na região que além de abrigar a maior floresta tropical do mundo, sempre foi bem servida por água abundante.
As consequências econômicas desse desastre, claro, não atingem apenas o povo da Amazônia. Sem considerar os efeitos dos fenômenos climáticos atípicos sobre a saúde das pessoas, há consequências econômicas que não podem ser desprezadas. Algumas, como a alta dos preços dos alimentos temida pelo ministro Haddad, são tão evidentes que nem precisam de muita explicação. Outras se manifestam de forma indireta e chegam a causar espanto quando se observa que são causadas pelas chuvas.
Todo mundo sabe, por exemplo, que quase todos os aparelhos eletroeletrônicos e motocicletas produzidos no Brasil são montados na Zona Franca e a maioria deles utiliza componentes de origem asiática que chegam a Manaus a bordo de navios, acondicionados em contêineres.
Quando o nível dos rios baixa e a navegação fica mais difícil, os proprietários dos navios passam a cobrar um adicional chamado ‘Taxa de Pouca Água’, que chega a custar US$ 5000 por contêiner. Esse valor, claro, é repassado para o preço das mercadorias — e quem paga por ele é o consumidor final.
As consequências desse problema, claro, vão muito além da elevação dos preços dos aparelhos de TV e de outros artigos produzidos na Zona Franca — mas esse caso é suficiente para mostrar que a questão ambiental se manifesta em situações que pouca gente imagina. É apenas um exemplo.
Há outras situações bem mais evidentes e preocupantes. Entre elas, a própria deterioração das condições do Planeta que, em última instância, pode inviabilizar a vida na Terra. Precisamos agir para impedir que isso aconteça.”
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