Situações de estresse na meia-idade elevam risco de Alzheimer, diz estudo

Publicado em 11/04/2024, às 10h38
Divulgação / Ebserh
Divulgação / Ebserh

Por Acácio Moraes / Folhapress

Experiências de grande estresse vividas na meia-idade podem deixar marcas mais duradouras do que se pensa. Um novo estudo publicado na revista científica Annals of Neurology mostra que esses eventos podem estar associados ao risco elevado de surgimento de Alzheimer e outras demências no fim da vida.

Segundo Paulo Caramelli, professor de neurologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), as evidências são especialmente alarmantes para o Brasil. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o país é o 2º com maior nível de estresse no mundo, e o primeiro em termos de ansiedade.

Na pesquisa, conduzida em Barcelona, os especialistas entrevistaram mais de mil participantes para avaliar o número de eventos estressantes vividos por eles. Além disso, foram realizados exames para identificar biomarcadores relacionados à ocorrência de Alzheimer, como a inflamação cerebral (também chamada neuroinflamação).

Um desafio do estudo foi avaliar de forma objetiva experiências que são vividas de maneira subjetiva. Para contornar esse problema, os autores usaram uma lista prévia com 18 possíveis eventos capazes de provocar mudanças na vida das pessoas de forma geral.

Caramelli explica que existem eventos estressores maiores universalmente reconhecidos, como crise financeira, perda de emprego, separação conjugal ou morte de familiar próximo. Com base em experiências assim, e não no nível geral de estresse do indivíduo, que o estudo foi feito.

Já a neuroinflamação e o acúmulo de betamiloide são fatores chave no desenvolvimento de diversas demências, como o Alzheimer. Típicas da velhice, cada vez mais evidências apontam que as raízes dessas doenças podem estar presentes também nos primeiros anos de vida.

Na pesquisa, a hipótese principal dos pesquisadores não foi confirmada. Eles acreditavam que os eventos estressores em geral poderiam favorecer a neuroinflamação, mas os dados não comprovam essa suposição. Entretanto, quando foi feito um recorte pela fase da vida, se viu que esses eventos podem ter efeitos neurodegenerativos em um determinado período da vida adulta: a meia-idade.

Os resultados revelam que a concentração de eventos na meia-idade está associada ao aumento de acúmulo da proteína betamiloide no cérebro, além da infância, que também é uma fase sensível. Além disso, mulheres e pessoas com doenças neurológicas se mostraram mais vulneráveis aos efeitos.

Orestes Forlenza, professor titular de psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo), explica que a relação direta entre estresse e doenças neurodegenerativas é muito observada na prática clínica, mas ainda pouco explorada cientificamente.

Por outro lado, está bem estabelecido que eventos estressantes nessa fase da vida são capazes de desencadear outras condições, como a depressão, que estão diretamente ligadas à demência.

O estudo, contudo, ainda é preliminar. "O trabalho associa alterações inflamatórias que aparecem no Alzheimer com eventos estressores ao longo da vida. Há uma sugestão, porém não há uma confirmação", afirma Caramelli. Ele ressalta que estudos mais robustos são necessários para confirmar as evidências, mas reconhece que os dados são informativos e consistentes com o que os pesquisadores já sabiam.

A deficiência de saúde mental do brasileiro traz efeitos nefastos para o físico que já são conhecidos há muito tempo. Já em 2004, com a publicação do estudo Interheart conduzido em 52 diferentes países, o Brasil foi onde o estresse teve o maior impacto associado ao infarto do miocárdio.

"Temos que olhar para a sociedade brasileira considerando o estresse um dos gatilhos preditores de adoecimento com consequências graves para a saúde da população", afirma Caramelli.

Em 2023, a depressão foi apontada como um preditor importante de demência precoce em um estudo publicado na revista científica Jama Neurology. No trabalho, os especialistas analisaram os dados do UK Biobank, um banco genético com informações de mais de 350 mil pacientes do Reino Unido.

Embora a genética seja responsável por alguns dos 14 preditores apontados pelo estudo, as evidências apontam cada vez mais que mudanças de estilo de vida podem reduzir os riscos de demência e Alzheimer.

Se combinado com estresse crônico, o potencial de risco da depressão chega a quase dobrar. Uma pesquisa realizada na Suécia com dados de mais de um milhão de pacientes mostra que os diagnósticos de problemas psiquiátricos são especialmente danosos para os casos de Alzheimer.

Para Caramelli, cuidar da saúde mental não traz apenas benefícios imediatos, mas também favorece a neuroproteção. O especialista afirma que o gerenciamento do estresse pode ser feito através de atividade física, suporte social, meditação e atenção plena, terapia e análise, com uso de medicamentos em alguns casos e até mesmo buscando mais conexão com a espiritualidade, independente da matriz religiosa.

Gostou? Compartilhe  

+Lidas