Sebos de Arapiraca apostam no virtual para vender livros físicos

Publicado em 23/04/2019, às 18h18
Reprodução/Secom Arapiraca
Reprodução/Secom Arapiraca

Por Secom Arapiraca

A folha que antes era galho, cada vez mais, desliza sob os nossos dedos na página digital, num outono estranho.

O leitor que chegou até esta matéria certamente está fazendo este mesmo movimento, obrigando a tela a se mover e as palavras a pegar escada acima.

É bem verdade que a relação das pessoas ao longo dos últimos anos têm mudado de forma aparente neste sentido: não se lê mais como antes.

Não no sentido de quantidade, mas no de virtualidade. Leitores digitais (Kindle, Kobo, Lev etc.) tomaram o mercado, os mais tradicionais jornais aderiram ao formato online, as cartas de amor agora são encaminhadas juntamente com emojis em aplicativos sociais. Realmente estamos lendo e vivendo o mundo de outra forma.

Por isso, neste Dia Mundial do Livro, terça-feira (23), trazemos dois enredos dignos de nota manuscrita.

Um deles é a história de dois jovens empreendedores de Arapiraca que estão investindo nesse mecanismo digital para, paradoxalmente, fazer as pessoas voltarem o rosto de novo para o papel com tinta impressa.

Os estudantes do curso de Psicologia, Thalysson Brito, de 22 anos, e Paloma Gomes, 21, abriram em janeiro deste ano o Sebo Arapiraca, um ambiente digital para troca e venda de livros.

A principal janela deles é hoje o Instagram. Nesta rede, eles têm investindo tempo e energia para o que julgam ser um “bastão literário”.

“Temos que repassar o livro já lido. A obra na estante é história parada. Então trabalhamos nesta perspectiva para que a cultura do livro físico não acabe”, diz Thalysson, que está no 10º período de Psicologia na Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

Ele, que é do Coité do Nóia, conheceu a arapiraquense Paloma no campus Palmeira dos Índios há dois anos. Na oportunidade, eles apostaram quem leria primeiro o romance “Um Sopro de Vida”, de Clarice Lispector.

Era o vento necessário para balançar a vida dos dois, conectando-os mais fortemente através das letras mais sensíveis.

Começaram, então, a namorar e levaram a parceria para os negócios.

“Nós iniciamos com apenas 10 livros para ver se dava certo, utilizando a ferramenta Stories do Instagram. E vimos que as pessoas estavam interagindo com nossas postagens. Isso foi em agosto do ano passado. Apenas no começo de 2019 começamos pra valer, após um longo planejamento”, conta a futura psicóloga Paloma, já no 7º período do curso.

A ideia veio depois de seu namorado participar de uma caminhada através do projeto Ouricuri Caiçara. Nele, Thalysson passou por provações físicas e mentais – momentos redentores e de reais transformações que ampliaram sua visão.

Ele se perguntou: “O que quero construir? O que quero deixar no mundo?”. Então, juntamente com Paloma, respondeu isso com a criação do alfarrábio virtual Sebo Arapiraca.

“Quando eu era mais novo, ia na biblioteca durante as minhas férias. Passava horas a fio por lá. Até hoje adoro ler, o cheiro do livro, a textura das folhas. É outra imersão”, afirma Thalysson, a respeito da experiência com o livro em mãos em detrimento à leitura digital.

Com Paloma não foi diferente. Por influência de uma professora da Escola Professor José Quintella Cavalcanti, ele adentrou no mundo da literatura através de best-sellers – e levou junto o seu irmão gêmeo Paulo, o qual também virou leitor assíduo.

Essa bagagem deu aos dois as ferramentas ideais para o desejo se materializar, ainda que virtualmente.

Com uma presença marcante no feed e postagens diárias, eles têm angariado muitas curtidas, comentários e compartilhamentos. Já são cerca de 1.500 pessoas seguindo o @sebo_arapiraca no Instagram, tamanho o engajamento, em menos de quatro meses. Tudo de forma orgânica.

E há pouco eles criaram um grupo no WhatsApp para manter os clientes sempre informados de novidades, que vão desde pérolas contemporâneas como “O Filho de Mil Homens”, do escritor português Valter Hugo Mãe, passando por HQs como “Demolidor”, de Frank Miller, até clássicos como “Iracema”, de José de Alencar, ou obras acadêmicas como “A Estrutura na Obra Lacaniana”, de Taciana de Melo Mafra.

As opções são muitas, indo da ficção para a biografia, da autoajuda até a filosofia. Quaisquer que sejam as escolhas, é efetuada a compra em dinheiro vivo e marcado o encontro em carne e osso, em pontos centrais de Arapiraca, Coité do Nóia, Palmeira dos Índios e Craíbas.

“Apesar de os processos serem todos digitais, onde as pessoas veem dados técnicos das obras no post, o preço e perguntam se ainda está disponível, a entrega é feita pessoalmente; é física. Assim como o livro físico comprado no meio digital”, completa Thalysson. E há certa poesia nisso tudo.

Libre Ler

Um interessante aspecto que pode ser notabilizado em quem repassa livros à frente é o desapego.

A palavra carrega grande carga espiritual, mas aqui se trata de deixar fluir o que se tem para que outra pessoa possa se utilizar daquilo. Liberdade e partilha.

Foi assim que o estudante de História da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), Lucas Calixto, iniciou sua jornada igualmente numa espécie de sebo online.

“Algumas pessoas do meu curso também faziam isso. O nome do meu espaço era Sebo Camarada. Usei por um curto período, por necessidade de venda mesmo”, lembra ele, que logo depois de comercializar os livros desativou o perfil nas redes sociais. Quem sabe um dia volte.

Ao contrário da também estudante de História da Uneal e de Design Gráfico na ClickAki, Jôsy França, do Libre Ler (@libre_ler).

Este é outro perfil online de venda de livros de Arapiraca, talvez menos conhecido que o @sebo_arapiraca.

“A princípio foi mesmo uma questão de desapego dessas obras que já li e não pretendo lê-las novamente. Além disso, há a motivação financeira: existe um público, uma demanda. Então resolvi ser esta oferta”, pontua.

Segundo ela, não dá para cobrar o valor de cada livro pelo que eles representam afetivamente ou pela qualidade das edições. O preço sai até mais barato pela necessidade de girar e “virar as páginas”, pela necessidade de os livros circularem.

“Nos tempos atuais, a palavra tem muita força e precisa criar outros caminhos para não ficar restrita às estantes ou aos meios virtuais. Livros são de fato mais valiosos do que eu pensava quando tive a ideia de me ‘desfazer’ deles”, enfatiza Jôsy.

Para ela, uma vantagem é o formato de venda online, o qual viabiliza o cliente escolher e “reservar” uma obra, deixando acertado o dia da compra.

E há muita coisa boa a se garimpar no Libre Ler (que em livre tradução do espanhol quer dizer “livre ler”), como “O Código da Vinci”, de Dan Brown; “O Alienista”, de Machado de Assis; “O Príncipe”, de Maquiavel; e “Leviatã”, de Thomas Hobbes. A entrega no bairro do Centro para compras acima de R$ 20, por exemplo, é gratuita.

Pois o que você, leitor, está esperando para conferir os livros de ambos os sebos virtuais de Arapiraca? A matéria já acabou. Livre-se.

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