Relator diz que Cunha usou contas na Suíça para receber propina

Publicado em 01/06/2016, às 18h40

Por Redação

O relator do processo por quebra de decoro contra o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Marcos Rogério (DEM-RO), citou em seu relatório os gastos com cartão de crédito da mulher e da filha de Cunha como evidência de que o parlamentar desviou recursos oriundos de corrupção. "Os valores (gastos em cartão de crédito) são completamente incompatíveis com rendimento do deputado e familiares", afirmou e voltou a criticar o uso de truste pelo deputado.

"Trustes instituídos por Cunha representam, na verdade, instrumentos para tornar viável a prática de fraudes: uma escancarada tentativa de dissimular a existência de bens, sendo isso tudo feito de modo a criar uma blindagem jurídica para esconder os frutos do recebimento de propinas cujos valores foram relatados por testemunhas e lastreiam a denúncia já recebida do Supremo, também confirmados perante este conselho."

O relator destacou que o uso do mecanismo de revogabilidade do truste é um mecanismo para que Cunha tivesse livre acesso ao patrimônio ocultado no exterior.

Rogério também mencionou que autoridades suíças apontaram a existência de ao menos quatro contas relacionadas a Cunha no País, todas no banco Julius Baer. "Há documentação bastante ilustrativa, relacionada à política do Banco Julius Baer voltada a conhecer os próprios clientes. Aqui, fica evidente que era Eduardo Cunha o titular da conta e não o truste", afirmou na leitura do relatório.

Crédito: André Dusek/ Estadão

Marcos Rogério (DEM-RO), durante leitura do relatório do processo contra Eduardo Cunha, nesta quarta, 1º

O relator alega que ficou "cristalino" que Cunha omitiu de forma intencional informações relevantes e prestou informações falsas às autoridades brasileiras.

Em sessão do Conselho de Ética da Casa, Marcos Rogério afirmou que a figura do truste vem sendo usada em crimes como lavagem de dinheiro.

"O truste pode facilitar a vida de quem quer esconder bens", disse, durante a leitura do relatório ao colegiado. Rogério rebateu o advogado de Cunha, Marcelo Nobre, que o precedeu nas falas. O relator argumentou que a situação de Cunha no uso do truste é "ainda mais grave" por ele ter constituído um truste revogável "a seu puro arbítrio".

A figura do truste é usada, por exemplo, quando uma pessoa quer destinar parte de sua herança a uma causa ou para impor cláusulas a futuros herdeiros. A pessoa, originalmente por esse mecanismo, confia o dinheiro a uma instituição financeira e deixa de ser detentora do patrimônio, deixa de ter acesso aos recursos. Mas o truste foi desfigurado, através do mecanismo de ser "revogável", o que abre brecha para que se possa esconder bens e valores provenientes de corrupção e o criador continue tendo acesso ao patrimônio.

Rogério lembrou ainda que a legislação brasileira deixa claro que é crime esconder não apenas bens, mas também direitos no exterior que sejam provenientes de infração penal. Por isso, segundo o relator, é "descabida" a tese de que Cunha não era obrigado a declarar bens e valores ao Banco Central e à Receita Federal. Ele classificou também como falácia o argumento de que a criação de um truste altera a situação de Cunha, tornando-o imune às leis.

Em sua explanação, Nobre destacou por diversas vezes que não há prova de que Cunha tenha conta no exterior e insistiu que truste não é o mesmo que uma conta corrente.

O relator também defendeu, ainda, que o processo não se resume a apurar se Cunha mentiu à CPI da Petrobrás ao alegar não ter contas no exterior, mas também apurar se o deputado recebeu vantagens indevidas. "O Conselho de Ética não estava proibido de apurar fatos sobre vantagens indevidas", disse.

"A apuração da mentira não remete apenas a existência ou não de contas no exterior, mas também o recebimento de vantagens indevidas. O representado afirmou categoricamente diante parlamentares jamais ter recebido vantagens ilícitas", disse Rogério na leitura de seu relatório, em sessão que já dura mais de três horas. O processo contra Cunha é o mais longo no colegiado, já dura mais de sete meses com diversas idas e vindas após manobras de aliados do peemedebista.

Rogério cita no relatório delações na Lava Jato e também provas que evidenciam a participação de Cunha no esquema de corrupção da Petrobrás. O relator afirma também que Cunha mentiu deliberadamente aos seus pares na CPI destinada a apurar malfeitos na estatal petrolífera. A argumentação de seu relatório é que Cunha usou a figura do truste para esconder patrimônio no exterior e o fez de forma deliberada, conscientemente mentindo à CPI.

"O contexto, portanto, deixa evidente que a conduta do deputado Eduardo Cunha não decorre de uma mera interpretação equivocada da legislação tributária aplicável ao caso, mas sim de uma intenção deliberada de escamotear a existência de toda uma estrutura montada e dedicada ao recebimento de propina e ocultação de patrimônio."

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