Prefeitura de Porto Alegre foi alertada há seis anos sobre risco de falha no sistema contra enchente

Publicado em 22/05/2024, às 08h57
O centro histórico da capital gaúcha está há duas semanas debaixo d'água | Crédito: Gilvan Rocha / Agência Brasil
O centro histórico da capital gaúcha está há duas semanas debaixo d'água | Crédito: Gilvan Rocha / Agência Brasil

Por Mariana Zylberkan / Folhapress

A Prefeitura de Porto Alegre foi alertada em 2018 do risco de falhas no sistema de bombeamento na região central de Porto Alegre em caso de cheia do lago Guaíba acima da cota de inundação, de 3 metros. A informação constava de um parecer técnico elaborado em setembro daquele ano por funcionários municipais.

O centro histórico da capital gaúcha, assim como boa parte do Rio Grande do Sul, está há duas semanas debaixo d'água após serem atingidos por fortes chuvas. Segundo especialistas, o sistema criado para impedir as enchentes não funcionou corretamente.

A reportagem teve acesso ao documento assinado por dois engenheiros integrantes da gestão municipal que apontaram a necessidade de rever o projeto de parte do sistema de prevenção de cheias por possível "falha na proteção". Os técnicos se referiam a duas casas de bombas projetadas para escoar a água da chuva do centro da cidade para o Guaíba.

Na época que o parecer foi feito, o prefeito era Nelson Marchezan Júnior (PSDB) –em 2021, ele foi substituído pelo atual mandatário, Sebastião Melo (MDB).

Segundo os engenheiros, a única barreira ao transbordamento de água captada abaixo do piso, antes de ser despejada no lago, era a presença de uma tampa de ferro comum, quando o necessário deveria ser um sistema estanque com vedação para suportar a pressão em caso de cheias.

"A cota do piso é 3,30m, logo em situações onde o nível do Guaíba supere esta cota é provável que ocorra extravasamento para a área interna da estação", diz trecho do documento.

Em novembro do ano passado, quando houve transbordamento do lago, um novo parecer foi enviado. "Informamos que ocorreram grandes dificuldades na operação das unidades citadas, quando o Guaíba passou da marca de 3,2 m, em especial quando passou de 3,4 m, ponto onde se observou o limite para o acionamento das bombas com segurança", diz trecho do documento. A cota de inundação do lago é três metros.

Em nota, o Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), da gestão Melo disse que a instalação de tampas herméticas nas casas de bombas 17 e 18 está em "fase de viabilidade técnica para a elaboração do projeto".

Em entrevista coletiva nesta terça, o prefeito acusou "pessoas de extrema esquerda" de "montar uma narrativa mentirosa" sobre as enchentes em Porto Alegre.

O documento com o alerta sobre as falhas no sistema da cidade foi divulgado pelo deputado estadual Matheus Gomes (PSOL) em suas redes sociais na noite de segunda (20). Melo disse também que politizar a questão não irá resolver o problema das enchentes no município.

"O impacto poderia ter sido muito menor", disse o deputado em relação às falhas no sistema de bombeamento. Ele afirmou que irá pedir investigações sobre os contratos ao Ministério Público do Rio Grande do Sul e ao Tribunal de Contas.

A paralisação no sistema de bombeamento é apontada por engenheiros hídricos e ambientais como agravantes para a inundação do centro histórico de Porto Alegre e dos bairros Menino Deus, Cidade Baixa e Sarandi. Das 23 estações instaladas por toda a cidade, 3 permaneceram em funcionamento durante os primeiros dias após as fortes chuvas.

O mau funcionamento das bombas ficou evidente já que as águas do Guaíba não se sobrepuseram ao limite de seis metros, que corresponde à altura dos diques instalados na cidade. A máxima registrada até o momento foi de 5,35 m em 4 de maio. Às 17h desta terça-feira (21), a altura era de 4 metros.

Nos últimos sete anos, duas gestões municipais não executaram a totalidade de verba direcionada a contratos de manutenção do sistema de prevenção. O prefeito reconheceu que os investimentos não foram suficientes.

As 23 estações de bombeamento de águas pluviais, conhecidas como casas de bombas de drenagem, abrigam reservatórios que servem como estruturas hidráulicas artificiais para drenar a água da chuva da cidade para o Guaíba.

Construído na década de 1960, o mecanismo anticheias da capital gaúcha é formado também por um muro de 2,6 km de extensão, com 14 comportas de proteção.

A estrutura foi criada para proteger a cidade de inundações já que cerca de 35% do território urbano está três metros acima do nível do mar e, portanto, bem próximo da altura dos 27 córregos que passam pela cidade, além de trechos do rio Gravataí, lago Guaíba e lagoa dos Patos.

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