Um trecho da Rua 15 de Novembro, no bairro de Pirajá, era tomado de uma ponta a outra por uma barreira de entulhos. Sobre carcaças de geladeiras e fogões estavam o mato crescido e a ferrugem. Havia também colchões e sofás velhos. Tudo cercado por arames farpados, formando uma espécie de barricada, imposta por traficantes da região, para dificultar o acesso do inimigo, neste caso, a polícia. No entanto, a trincheira improvisada ainda com pedras e pedaços de madeira foi retirada, depois que a Polícia Militar ocupou o local na manhã desta segunda-feira (21).
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A barreira foi colocada há cerca de um mês para retardar o acesso dos policiais ao Parque São Bartolomeu, área de mata fechada, costumeiramente usada pelos traficantes para se esconderem quando perseguidos por policiais. A região é controlada pela facção Bonde do Maluco (BDM). O líder da organização criminosa no bairro era o lendário João Teixeira Leal, o Jão de Pirajá, traficante morto em dezembro do ano passado, durante uma ação do Comando de Operações Especiais (COE) da Polícia Civil, no bairro do Jardim de Alah.
A ação é um desdobramento da Operação Coagulação, realizada no dia 14 deste mês, quando foram ocupados os bairros de São Caetano, Fazenda Grande do Retiro e Bom Juá. “Realizamos diversas ações para coibir a criminalidade através do trabalho conjunto de várias unidades da Polícia Militar e agora chegou a vez de Pirajá “, disse o subcomandante do Policiamento na Região da Baía de Todos-os-Santos (BTS), tenente-coronel Antônio Lopes.
Segundo o tenente-coronel, nessa operação já foram realizadas 1.500 abordagens, 520 veículos e 37 estabelecimentos revistados, sete pessoas conduzidas à delegacia e duas pessoas presas em flagrante por tráfico de drogas.
Ainda dando continuidade à Operação Coagulação, a Polícia Militar pretende, na manhã desta terça-feira (22), retirar quebra-molas que foram colocados pelo tráfico de drogas. A mesma ação foi realizada no Complexo do Nordeste de Amaralina, no início deste mês. Lá, foram destruídas 16 lombadas erguidas fora dos padrões estabelecidos pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
Barricada
Por volta das 10h, policiais militares tiveram a informação do Serviço de Inteligência da 9ª Companhia Independente (CIPM/ Pirajá) que uma rua havia sido bloqueada para retardar o tempo de reação das guarnições. A rua é um local estratégico para o BDM porque dá acesso direto ao Parque São Bartolomeu, região usada pelos traficantes como rota de fuga. “Um local que eles conhecem muito bem, pois a maioria é nascida e criada aqui, uma vantagem para eles, porque dominam a mata. Para a gente entrar, o ideal é um efetivo maior para não ser alvo fácil deles”, disse um policial da 9ª CIPM.
Ao chegar ao local, um deserto. As viaturas pararam a 500 metros da barricada, e as portas e janelas das casas no entorno estavam fechadas – incomum para o horário. Após o desembarque, a tropa se posicionou rapidamente em posições de defesa e ataque, escorando entre os muros. Além dos policiais, os únicos sinais de vida eram três cachorros latindo, os assobios dos pássaros do parque e o som de uma canção evangélica que vinha de uma das dezenas de casas trancafiadas.
A barreira era formada por carcaças de fogões (cinco) e de geladeira (quatro) – todas cheia de pedras –, três sofás, dois colchões, além de madeiras de móveis quebrados. Todo entulho estava coberto por uma cerca de arame farpado. “Com certeza é para dificultar a retirada do bloqueio. Tivemos conhecimento, mas não retiramos antes porque precisamos de um efetivo maior. Veja que atrás das casas já é o parque e aqui moraram muitos ‘olheiros’”, disse um outro policial da 9ª CIPM.
Enquanto a barricada era retirada por um grupo de PMs, uma outra parte da tropa sinaliza para todos a prova de que momentos antes da chegada do comboio da PM, traficantes estavam no local. As evidências foram um saco com quatros pães e uma garrafa de suco deixados em frente a uma casa abandonada, feita de ponto de observação do tráfico. “Com certeza fugiram quando perceberam a nossa chegada”, disse um PM. Na entrada do imóvel havia uma gambiarra. “Eles colocaram para carregar o celular”, emendou o policial.
Nos fundos da casa, a tropa encontrou uma trilha que dá acesso ao Parque São Bartolomeu. No chão, havia a embalagem de uma balança portátil de precisão, do mesmo tipo usada por traficantes para pesar a droga. Já na mata, mesmo durante o dia, era possível enxergar uma outra gambiarra, por conta das lâmpadas acesas. “Isso aí eles usam para se nortearem durante a noite. É por essas e outras que a gente não vem por aqui. Normalmente a gente logra êxito vindo por baixo, pelo início do parque. Aqui por cima a nossa desvantagem é maior por diversos motivos, principalmente pelo fato de alguns dos moradores fazerem parte da bandidagem”, declarou o policial.
Quando os policiais já finalizavam a retirada da barricada, um homem carregando frutas saiu de uma das casas. Perguntado sobre a barreira, ele respondeu amedrontado: “Foi a turma deles lá. Mas não posso falar mais nada, infelizmente”. Mais à frente, uma família, que estava de mudança, colocava os móveis dentro de um caminhão. Questionado se o motivo da saída estava relacionado com a questão do tráfico local, um homem respondeu “sim” balançando a cabeça, antes de dar as costas.
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