"Pensei que ele ia pegar uma arma", diz PM que matou motorista em briga de trânsito em Maceió

Publicado em 03/05/2024, às 12h31
Policial aposentado está sendo julgado nesta sexta-feira (03) | Foto: Cortesia / Ascom MPAL
Policial aposentado está sendo julgado nesta sexta-feira (03) | Foto: Cortesia / Ascom MPAL

Por Eberth Lins

O policial militar da reserva Gedival Souza Silva, acusado de matar o motorista Fábio Jhonata da Silva, no Centro de Maceió, durante uma briga de trânsito, disse no interrogatório, durante o júri popular desta sexta-feira (03), que atirou no jovem por achar que ele pegaria uma arma.

Conforme o depoimento do aposentado, durante a discussão naquele 14 de outubro de 2021, a vítima voltou para o carro e se agachou, posição que, segundo o réu, o deu a entender que ele teria se armado. Leia o depoimento do PM na íntegra:

“Ele voltou ligeiro (para o carro após a discussão). Quando vi ele voltar pro carro, também corri para o meu. Eu vi ele agachado no carro. A posição dele era como se tivesse pegando algo com a mão direita. Eu pensei que ele ia pegar alguma arma, alguma coisa. Como qualquer militar, mesmo ele preparado, a pessoa vendo que outra pessoa vai pegar alguma coisa, você tem que se preparar primeiro. Eu nervoso e ele também por conta das discussões, eu não sabia o que ele ia pegar. Por isso aconteceu. No momento de desespero, eu atirei para pegar na parte das pernas para ver se ele parava. Como estava agachado, não pegou na parte das pernas. No momento, estava juntando pessoas, como ali é no centro da cidade. Imediatamente, com medo de represália, peguei o carro e saí. Eu acredito que corria risco de vida”

"Banalizaram o pior de todos os crimes, que é o crime de homicídio", diz promotor de justiça

Durante a sustentação oral, o promotor de justiça Napoleão Amaral chamou atenção para a violência gratuita com a qual a morte do motorista se deu, destacou que a sociedade não suporta mais essas violências e lembrou que há quase três anos a família de Fábio busca por justiça.

A vítima não teria morrido se o réu não tivesse atirado nele. Não estamos aqui por conta da conduta de Fábio Jhonata. Agora, o réu pede clemência, clemência que ele não teve no dia 14. Fábio Jhonata poderia estar com sua mãe, na companhia da sua esposa, se não fosse a conduta do réu aqui presente. Tenta-se aqui traçar um perfil, como se a vítima fosse culpada por isso. Ela não foi culpada. Quem de nós pode dizer que não se envolveria numa briga de trânsito? Todos estamos sujeitos a isso.


O réu está sentindo o peso dos atos. Mas ele pode conviver, pode respirar, pode comer. Ele pode ter o convívio com a sua família. Ele vai ser condenado e vai sair. Como todos saem. A única pessoa que não sai é o Fábio Jhonata. Esse está condenado. Ele não acorda. Fabio Jhonata, um jovem de 26 anos de idade, trabalhava, tinha sonhos, carinhoso, leal. Fabio Jhonata não vai mais ter o carinho da mãe, da esposa, da irmã. Esse está condenado para o resto da vida. O réu vai sair. Será condenado, mas sairá um dia. Ele está aqui, vivo, respirando. Fábio Jhonata teve todos os seus sonhos abortados.

Há três anos, a família está clamando por justiça. Justiça que vai ser feita porque o Conselho de Sentença não vai dar o aval para que coisas como essa continuem acontecendo. É necessário ter coragem para mudar.

Age em legítima defesa quem realiza um disparo nas costas? A vítima ficou no chão agonizando. Quando foi levado para o hospital, já não conseguia respirar. Ele sabia que ia morrer. Ele pedia socorro à assistente social: “Socorro, eu não quero morrer”. A preocupação de Jhonata, até na hora da morte, era falar com a sua esposa. Ele agonizou naquela calçada e ninguém prestava socorro.
Sete dias após dar entrada ano hospital, ele morreu por complicações. O Jhonata não conseguia respirar. Ele chegou ao hospital pedindo socorro, pedindo a oportunidade de viver. A vítima não estava com a arma. Não havia sequer um canivete com ele.

Há vidas que sepultam mais que a própria morte. Volto a dizer da situação da mãe da vítima. A vida sepultou ela mais que própria morte porque quebra a lógica uma mãe ou um pai tendo que enterrar um filho. Não existe um nome para dar a um sofrimento como esse. Se uma esposa perde seu marido, ela é uma viúva. Mas e quando uma mãe perde um filho? Que nome se dá a isso? Essa mesma mão que acalentou carrega a alça do caixão do seu filho. Quando analisamos o sofrimento dela, mais repugnante se torna a conduta do cidadão que deu causa a esse sofrimento. A justiça vai ser feita na tarde de hoje. E a mãe da vítima não derramará mais uma lágrima por justiça a partir de hoje.

Veja mais sobre o julgamento, que acontece nesta sexta-feira (03) mais de dois anos após a morte de motorista. O júri estava marcada para o dia 22 de abril, mas acabou sendo adiado para hoje devido à ausência de três testemunhas tidas como imprescindíveis pela defesa e pela alegada falta de tempo para analisar o prontuário médico da vítima.

O caso - Consta no processo que o denunciado e a vítima tiveram uma discussão de trânsito, e ambos desceram do veículo. Em seguida, Fábio foi em direção ao seu carro, procurando algo no piso. Neste momento, o PM correu para se armar e disparou duas vezes contra a vítima. Gedival confessou o crime, afirmando que interpretou que Fábio iria fazer algo contra ele. Ainda durante o interrogatório, o acusado disse que estava arrependido e que não tinha intenção de matar a vítima.

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