As relações entre o Poder Judiciário e Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República pela terceira vez, vêm sendo questionadas desde quando o petista, cumprindo prisão após decisões condenatórias em três instâncias, foi colocado em liberdade após ser “descondenado”.
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A questão se agravou durante a campanha eleitoral de 2022 e, mais ainda, após o reconhecimento pelo TSE da vitória de Lula sobre Jair Bolsonaro, até hoje atribuída pelos bolsonaristas a fraude na apuração dos votos – acusação até hoje não comprovada tecnicamente.
Esse clima de suspeição, por conta da estreita relação entre o atual chefe do Executivo e a cúpula do Judiciário, persiste até hoje e é analisada neste texto do jornalista Felipe Moura Brasil:
“Enquanto o corregedor-nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, indicado por Lula ao STJ em 2008, afastava juízes da Lava Jato como Gabriela Hardt, que condenou Lula no caso do sítio de Atibaia, ministros do STF jantavam com Lula e seu ministro intermediário Ricardo Lewandowski na casa de Gilmar Mendes na segunda-feira, 15, cobrando do presidente a defesa deles e de sua agenda política.
‘STF se vê sob ataque, e ministros recorrem a Lula por apoio’, destacou a Folha. ‘Ataque’ é um conceito elástico, usado para tratar de ações que vão desde a revelação de informações verdadeiras, porém inconvenientes, sobre qualquer ministro do STF, como o codinome ‘o amigo do amigo do meu pai’, até a invasão do prédio da Corte, com depredação de patrimônio público, no 8/1.
A estratégia é colocar ações legítimas no bolo das ilegítimas para garantir a blindagem pessoal, a ampliação do poder, o andamento dos negócios familiares, o silêncio de críticos e a punição de desafetos.
Segundo relatos colhidos pelo jornal, ‘o tom da conversa foi de preocupação com o avanço das reclamações e principalmente com a constatação de falta de ação por parte de políticos mais alinhados para blindagem do tribunal’.
Como nem a cúpula das Forças Armadas no governo Bolsonaro aderiu ao golpismo, o fato objetivo é que, no governo Lula, o tribunal, em si, está blindado, até porque nunca mais contrariou os interesses do PT, como na época em que José Dirceu e Wadih Damous queriam esvaziar seus poderes e fechar o STF. Tanto que Damous já confessou a aliança de Gilmar com o partido contra a Lava Jato.
O que não está a salvo é a agenda política dos ministros comensais, incluindo os poderes acumulados pelo relator-geral da República e ‘principal alvo de críticas no Congresso’, Alexandre de Moraes, que jantou juntinho aos indicados de Lula no atual mandato, Cristiano Zanin e Flávio Dino.
Nem o presidente da Câmara, Arthur Lira, o palestrante do ‘Gilmarpalooza’ protegido por Gilmar contra investigações, tem conseguido conter os ânimos dos parlamentares e ‘passou a articular formas de limitae os poderes da Corte’. A percepção de que o clima vem se deteriorando ‘se acentuou após as acusações por parte de Elon Musk contra Moraes sobre censura, ao criticar ordens de bloqueio de contas na rede social X’.
‘No jantar, os ministros pediram ao presidente da República maior empenho do governo em defesa da democracia e do próprio Supremo, explicitando a visão de que a corte está sob ataque. Segundo um dos participantes, a avaliação foi a de que o STF vem assumindo um protagonismo contra iniciativas antidemocráticas e, por isso, é alvejado pela direita. Um dos diagnósticos foi a falta de um coro governista em defesa de propostas encampadas pelos ministros, como a questão da regulação das redes.’
Traduzindo para o português no contexto atual, o STF se vê sob críticas, e ministros da Corte dão mais motivos para críticas, rotulando a direita como antidemocrática, assumindo o lado de Lula na polarização, ilustrando a hipocrisia com que acusam integrantes da Lava Jato de ‘conluio’, escancarando a promiscuidade com o chefe do Executivo e cobrando seu apoio à censura das redes, que o governo ainda não consegue controlar com verbas de publicidade, como faz com emissoras de TV e rádio. Tanto que decidiu tirar verbas do X para retaliar Musk, mas o dono da plataforma, ao contrário de uma porção de empresários da comunicação, continuou incomodando o atual regime.
… Barroso (ministro Luís Roberto Barroso) disse, na Brazil Conference, que ‘toda e qualquer crítica ao Supremo é legítima numa democracia’. Esse painel, aqui nos Estados Unidos, é uma chance para exercer essa liberdade muitas vezes reduzida ou inexistente no nosso país.’
Agora, 5 anos depois da censura à Crusoé, é preciso fazer outro contraponto.
Barroso explicou o populismo como a estratégia discursiva do ‘nós’ contra ‘eles’, e afirmou que ‘o populismo autoritário pode ser de direita ou de esquerda, temos experiência nos dois sentidos, embora nos últimos tempos o de direita tenha se revelado mais perigoso: racista, xenofóbico, misantrópico e antiambientalista’.
Nos tempos atuais, também tem se revelado perigoso o populismo do STF, ou supremo populismo, sobretudo quando casado com o populismo autoritário de esquerda e o servilismo de emissoras de TV e rádio.
O suposto ‘nós, defensores da democracia’ contra ‘eles, antidemocráticos’, reforçados em jantares que afrontam a separação e a independência entre os Poderes, encobre condutas muito menos nobres e republicanas do que seus proclamadores afetam ter.
Sobre cada uma delas, claro, não vamos nos calar.”
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