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Opinião: “Ainda está cedo para falar em impeachment, mas o caminho traçado pelo governo não é nada confortável”

Em 20 de Abril de 2024 às 18:05

A possibilidade de o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), dar andamento a algum dos vários pedidos de impeachment contra o presidente Lula (PT) aparentemente não faz sentido, apesar das notórias divergências recentes.

Mas já começa a ser considerado, ainda remotamente, por vários analistas políticos que acompanham o que acontece em Brasília, a capital do poder em nosso país.

E foi assim, inicialmente de forma embrionária, que aconteceram os processos de impeachment dos ex-presidente Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff.

Tal hipótese é avaliada pelo jornalista Rodolfo Borges:

“As tensões do governo Lula com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), despertaram em alguns petistas o trauma do impeachment de Dilma Rousseff, informa o site Metrópoles. O receio é de que Lira aja da mesma forma que Eduardo Cunha agiu quando sua relação com o Palácio do Planalto se tornou insustentável e desengavete um dos 19 pedidos de impeachment apresentados contra Lula.

O medo dos petistas não faz sentido a esta altura dos acontecimentos. Não surgiram sinais, até agora, de que Lira tenha sequer cogitado a possibilidade de iniciar um processo que poderia levar à queda de Lula. Mas o alarme é um indício do problema no qual os governistas se meteram, e, mais uma vez, por conta dos próprios erros de cálculo.

Há nos petistas um orgulho que Jair Bolsonaro, por exemplo, não tem. Encurralado por questões de família no Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente simplesmente se rendeu à influência do Congresso Nacional, que não deu trela a nenhum dos cerca de 150 pedidos de impeachment que recebeu contra Bolsonaro.

Emendas

Já o governo Lula se enxerga muito mais forte do que é. E, a exemplo do que ocorreu na época do mensalão e do impeachment de Dilma, calcula que tudo pode ser resolvido com dinheiro — emendas, na linguagem técnica.

Mas a moeda da política é o poder, que o PT nunca quer dividir com ninguém, como ficou claro na insistência em manter a desgastada Nísia Trindade à frente do Ministério da Saúde.

O Palácio do Planalto editou na sexta-feira passada, 12, uma portaria para devolver a Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, a função de liberar emendas parlamentares. A medida, tomada depois de Lira chamar o ministro de incompetente.  e de desafeto, foi tomada para dar poder a Padilha, que Lula disse que manterá no cargo ‘só por teimosia’.

Como era de se esperar, a decisão de fortalecer Padilha incomodou líderes partidários, que tinham negociado manter comunicação direta com os ministérios por emendas.

Um primo

O Palácio do Planalto também não se ajudou ao demitir um primo de Lira. E pouco importa se o presidente da Câmara deveria ou não ter tanto poder nas mãos quanto o de pautar um processo de impeachment assim que desejar — o fato é que ele tem.

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira (PT), afirmou nesta sexta-feira, 19, que o impasse criado pela demissão de Wilson César de Lira Santos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de Alagoas ‘está superado’.

Santos era alvo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) há tempo. Agora, para evitar a ampliação da crise, Teixeira disse que ‘o próprio presidente Lira já enviou uma proposta de nome para substituí-lo’.

Almoço

Lula convocou seus líderes no Congresso para almoçar nesta sexta, na tentativa de desarmar pautas-bomba armadas para estourar na próxima semana, e traçar as estratégias do governo para enfrentar a sessão que deve derruba seu veto ao PL das saidinhas.

A Câmara aprovou na quarta-feira, 17, um projeto que limita a cobrança da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) pelo Ibama — falta passar pelo Senado. A taxa é uma das principais fontes de recursos do órgão ambiental.

No Senado, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou no mesmo dia uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que concede aumento salarial de 5% a cada cinco anos para membros do Judiciário. O texto, que ainda precisa passar pelo plenário, seria uma ‘bomba [fiscal] que pode estar por vir’, resumiu o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

Filme antigo

Também está no radar, entre outras questões, a manutenção da desoneração da folha de 17 setores. O impacto potencial das pautas-bomba nas contas pública em 2024 é calculado em torno de 80 bilhões de reais. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, antecipou sua volta de Washington na quinta-feira ‘tendo como foco a agenda econômica em Brasilia e negociações com o Congresso envolvendo os projetos de interesse do governo’.

O deputado federal Kim Kataguiri (União-SP) resumiu assim a ópera em vídeo:

‘Toda essa conjuntura, articulação política ruim, articulador político do governo tomando baile, um cenário econômico ruim, um presidente cada vez mais impopular, o dólar disparando, os preços disparando, discordância na distribuição de emendas, uma péssima relação com o Congresso, uma desavença pessoal com o presidente da Câmara dos Deputados… Meus amigos, esse filme eu já assisti, no segundo mandato de Dilma Rousseff, e terminou em impeachment’.

Ainda está muito cedo para falar em impeachment, mas o caminho traçado pelo governo Lula não é nada confortável.”

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