O cinema mundial perdeu na noite da última quinta-feira 28 um de seus nomes mais brilhantes. Agnès Varda, diretora e roteirista nascida na Bélgica e criada na França, filmou mais de 50 títulos ao longo de 64 anos de carreira, entre longas de ficção, documentários, curta-metragens e episódios para séries da TV. Ela foi uma precursora e um dos principais expoentes da Nouvelle Vague, o movimento que transformou o cinema francês na década de 1960 e influenciou várias cinematografias ao redor do mundo. Com um olhar curioso e sobretudo feminino para a humanidade e o cotidiano, manteve a paixão pelo cinema ao longo dos seus 90 anos de vida. Única diretora homenageada com o Oscar honorário pelo conjunto da obra até hoje, Varda se interessou por temas variados ao longo da carreira, que teve incursões até mesmo no documentário político (ela produziu curtas sobre Cuba, os Panteras Negras e a guerra do Vietnã). Sua marca autoral, porém, está no encontro do engajamento feminista com uma reflexão permanente sobre a arte.
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Neste que se tornou o longa mais famoso da diretora francesa, Corinne Marchand dá vida a Cléo, uma cantora que caminha durante horas por ruas, cafés e lojas com a cabeça fervilhando, enquanto espera pelo resultado de um exame que pode ou não confirmar uma grave doença.
O drama de 1965 questiona padrões de masculinidade, família e expectativas sobre a felicidade com um olhar perspicaz e sem julgamentos. O protagonista é François, um carpinteiro casado e feliz, com dois filhos, que ama sua esposa, mas se envolve com outra mulher.
Cartaz do filme ‘Daguerreótipos’, de Agnès Varda
Cartaz do filme ‘Daguerreótipos’, de Agnès Varda (IMDB/Reprodução)
Varda constrói seus documentários com a mesma curiosidade pelo humano com que costura seus filmes de ficção. Aqui, ela volta seu olhar para a rua Daguerre, em Paris, onde morava desde a infância. Com a câmera, a diretora busca as figuras que povoam o bairro e tenta compreender a partir desse microcosmo as mudanças na cultura e na vida francesa no século XX.
Ficção e documentário sempre andaram juntos na carreira de Varda. Em Os Renegados, ela junta os dois. A história é ficcional: Mona é uma mulher independente, solitária e sem rumo cujo corpo é encontrado congelado no início do filme. A partir daí, sua trajetória é reconstituída em forma de documentário, por meio de “entrevistas” com pessoas que a viram nos seus últimos dias de vida.
A curiosidade de Varda era mesmo infinita e podia ser despertada por qualquer pessoa. Em Os Catadores e Eu, ela se inspirou numa pintura de Millet, do século XIX, mostrando catadores de frutas, e partiu com sua câmera para descobrir como vivem essas pessoas nos dias atuais. O filme acaba se transformando em uma análise do trabalho da própria artista, que passou a se definir como uma “catadora de imagens”.
A diretora olha para a própria carreira e traça um diálogo sincero consigo mesma nesta autobiografia, feita aos 80 anos de idade. Agnès revisita os cenários de sua juventude, quando despontou na Nouvelle Vague ao lado de colegas do cinema francês, percorre as praias no litoral da França e Bélgica, e observa fotografias antigas e vídeos com cenas de seus próprios filmes, sem deixar de analisar acertos, erros e aprendizados.
No documentário indicado ao Oscar em 2018, a artista une forças ao jovem fotógrafo JR e viaja com ele pelo interior da França para produzir retratos de seus habitantes e transformá-los em murais. Ao mesmo tempo, capta suas reações e histórias em filme. Varda também aproveita para eternizar conversas com o colega, debatendo temas como juventude, velhice e arte.
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