A pequena Lua Andrade Nonato Tourinho, de Salvador, na Bahia, tem2 anos já encanta a web com a sua meiguice. A menina possui uma condição rara, chamada síndrome do cromossomo 7 em anel, e tem chamado a atenção dos internautas, acumulando mais de 45 mil seguidores nas redes sociais.
A mãe, a professora Gisele Tourinho Pereira, 35, resolveu criar um perfil para a filha para disseminar informações sobre a condição. "Eu procurei tanto sobre a síndrome dela e achei poucos estudos, muito antigos, com informações rasas. Senti que precisava a expor para o mundo. Vivo tentando achar outro caso [igual]", diz em entrevista à CRESCER.
Gisele também busca conscientizar sobre a síndrome e compartilha diversas situações do dia a dia que parecem inofensivas, mas podem causar incômodo. Em vários vídeos, que já acumulam milhões de visualizações, ela explica que muitas pessoas pensam que Lua é apenas uma bebê de poucos meses, por ser pequena. "Acontece sempre. Todo dia", afirma.
"No início, na fase de negação e luto, me sentia muito mal. Depois que estruturei minha maternidade atípica, entendi que as pessoas são curiosas e eu penso que tenho o dever de orientar. Então, com paciência, explico todos os dias que tem uma síndrome rara e por isso é pequena", diz.
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Gestação e mistério no diagnóstico
Gisele descobriu que estava grávida em 2022. Tudo corria bem até que, no segundo ultrassom morfológico, já no sexto mês da gestação, descobriu que sua filha Lua estava muito pequena para a idade gestacional. Ela pesava apenas 1kg. "Os médicos acharam que era insuficiência placentária, mas eu não apresentava pressão alta, nem diabetes ou outra comorbidade", lembra.
Os médicos seguiram acompanhando a gravidez de perto. "Passei um mês realizando ultrassom com doppler para ver se evoluía o quadro até que, com oito meses, eu fui internada para continuar avaliando de lá", afirma. Após 11 dias, com 33 semanas, Gisele precisou passar por uma cesárea e Lua chegou ao mundo em 4 de fevereiro de 2023, pesando 1,045kg. "Fiquei muito feliz que ela nasceu, mas com medo porque não pude segurar e amamentar. Ela foi direto para incubadora. Usou CPAP [aparelho de suporte de respiração] por horas, depois já ficou sem", recorda.
Os médicos ainda não sabiam o diagnóstico da pequena, o que deixou Gisele preocupada. "As neonatologistas decidiram chamar um geneticista porque Lua era toda pequena — tinha perímetro encefálico menor e pele marmórea (marmorata), que é quando o bebê parece estar com frio", explica.
No entanto, o genetista demorou alguns dias para ir ao hospital. "Os primeiros cinco dias foram mais angustiantes, pois os médicos apontavam as diferenças físicas para os outros bebês", lamenta. "Ao mesmo tempo, sentia tanto amor e só mentalizava sua cura de qualquer situação. Não pude pegá-la no colo por pouco mais de uma semana. Isso me deixava triste. Quando a peguei, fiquei tão feliz, tão radiante", diz.
"Evento genético aleatório"
Após um mês de espera, o resultado do exame de cariótipo, teste que analisa os cromossomos de uma pessoa, permitindo identificar alterações genéticas, revelou que Lua tinha a síndrome do cromossomo 7 em anel. Receber a notícia foi um alívio para Gisele. "Enquanto esperávamos o diagnóstico, uma das neonatologistas confessou que eles suspeitaram de T18 (trissomia do 18), também conhecida como síndrome de Edward. Fiquei muito consternada, achando que minha filha não vingaria. Após saber que a síndrome dela era outra, senti um aparente alívio, mesmo não sabendo nada sobre ela", afirma.
Lua fez uma série de exames no hospital e tudo parecia bem. "Isso me confortava. Meditei muito nesse período. Após tentar ingerir seu diagnóstico, passei brevemente pelo período de negação, que foi quando rezava para Deus pelo seu desenvolvimento típico. Depois, o luto me pegou. Eu fui engolindo seco e tendo má digestão da condição da minha filha. Só pensava que ela ia morrer. Aos poucos, fui entendendo o funcionamento dela e o amor foi crescendo cada vez mais", destaca.
A causa nunca foi descoberta. "Lua foi um evento genético aleatório. Não é hereditário. Eu e o pai fizemos o cariótipo e deu normal. Após Lua engordar um pouco mais, chegando aos 2 kg, o aspecto da pele melhorou e manchinhas marrons foram aparecendo", explica.
"Meiga, carinhosa, de bem com a vida"
A síndrome do cromossomo 7 em anel afeta o desenvolvimento de Lua. "Além de parecer um bebê de cinco meses, ela não anda, não fala, só balbucia, não tem interação cognitiva como uma criança de 2 anos", diz a mãe. A pequena faz acompanhamentos com diversos especialistas, incluindo geneticista, neuropediatra, neurocirurgião, nutricionista, gastro, endócrino, oftalmo, otorrino, além de terapias (ocupacional, fisioterapia e fonoaudióloga).
Graças às intervenções médicas, a menina vem evoluindo bem. "É meiga, carinhosa, dengosa, sorridente, de bem com a vida e está se desenvolvendo dentro das suas limitações", comemora. No fim do ano passado, Gisele descobriu que está grávida novamente, dessa vez, de um menino. Ela já está com 23 semanas e o nascimento está previsto para 15 de julho. Até agora, não há indícios de que o bebê tenha a mesma síndrome de Lua. "Fiz a morfológica e deu tudo bem", explica.
Sobre a síndrome do cromossomo 7 em anel
Síndrome genética é um conjunto de sinais e sintomas causados por alterações no nosso DNA que afetam o desenvolvimento e o funcionamento do organismo. Cromossomos são estruturas formadas por DNA enrolado, e todos nós temos 46 cromossomos organizados em pares. As anomalias cromossômicas podem ocorrer por alterações numéricas (quantidade de cromossomos) ou estruturais (formato ou integridade do cromossomo).
O cromossomo em anel é um tipo de alteração estrutural em que as extremidades do cromossomo se perdem e ele se fecha em forma de anel. Essa mudança pode afetar genes importantes para o desenvolvimento. A síndrome ocorre quando essa alteração envolve especificamente o cromossomo 7, levando a manifestações clínicas que podem incluir atraso no desenvolvimento, alterações no crescimento, entre outras.
É uma condição considerada rara. Existem poucos casos descritos na literatura médica. Estima-se que alterações cromossômicas em anel ocorram em cerca de 1 a cada 25 mil nascimentos, mas o cromossomo 7 em anel é ainda mais incomum, com menos de 30 casos documentados na literatura médica até hoje.
Sinais da síndrome
Os sintomas da síndrome do cromossomo 7 em anel podem variar bastante de uma criança para outra, mesmo com o mesmo diagnóstico. Os sinais mais comuns incluem:
Enquanto alguns sinais estão presentes ao nascimento, outros só surgem ao longo do desenvolvimento. A gravidade depende do tamanho da perda genética e de como o cromossomo alterado está distribuído no corpo.
A síndrome do cromossomo 7 em anel pode impactar o desenvolvimento da criança de diferentes formas, afetando tanto o crescimento físico quanto aspectos motores, cognitivos e comportamentais. Algumas crianças podem demorar mais para sentar, engatinhar, andar ou falar. Outras podem apresentar dificuldades de aprendizado, atenção, linguagem ou socialização. A forma como essa síndrome afeta cada criança é única, e os sinais podem se manifestar de maneira mais leve ou mais evidente, dependendo das regiões do DNA que foram perdidas ou alteradas.
O diagnóstico é feito por meio de exames genéticos que analisam os cromossomos. O cariótipo é o exame mais tradicional e permite visualizar o formato e o número dos cromossomos — é ele que geralmente identifica a presença de um cromossomo em anel.
Terapias
É possível oferecer qualidade de vida para pessoas com cromossomo 7 em anel com um acompanhamento adequado. A criança deve ser acompanhada por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar, que pode incluir fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, psicólogo, neuropediatra e outros especialistas, conforme as necessidades individuais.
O médico geneticista tem um papel central nesse processo, pois é quem avalia a alteração genética, orienta sobre possíveis riscos associados, direciona exames complementares e conduz o aconselhamento genético da família. Esse cuidado conjunto é essencial para promover o melhor desenvolvimento possível e prevenir complicações.
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