Já sabemos há algum tempo que Marte, em seu passado remoto, foi habitável -ou seja, tinha a capacidade de preservar água em estado líquido na superfície. Agora, graças ao jipe Curiosity, da Nasa, sabemos que nessa época, 3 bilhões de anos atrás, o planeta tinha os ingredientes necessários para a vida -moléculas orgânicas complexas.
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Ao analisar amostras colhidas na cratera Gale com idade de cerca de 3 bilhões de anos, o robô estabeleceu de forma conclusiva que havia abundância de compostos orgânicos no planeta. Os resultados sugerem um conteúdo orgânico comparável ao de rochas sedimentares ricas nessas substâncias aqui da Terra.
Ninguém está dizendo que houve vida em Marte, claro. Mas saber que os ingredientes estavam lá -água e moléculas orgânicas- é um passo importantíssimo em busca dessa resposta. Tanto que o principal objetivo do Curiosity, assim que chegou por lá, em 2012, era achar esses compostos. E a busca não foi fácil.
A ausência de compostos orgânicos no planeta vermelho era uma grande surpresa. Afinal, essas moléculas de carbono parecem estar em toda parte no espaço –em asteroides, cometas, planetas, luas e até nebulosas. Por que Marte seria tão pobre nelas?
Ocorre que a superfície marciana hoje é bem hostil a moléculas orgânicas. Raios ultravioletas do Sol encontram pouca filtragem na tênue atmosfera daquele mundo, quebrando com facilidade moléculas orgânicas maiores. E, para completar, o solo é rico em percloratos. São moléculas sem graça feitas de oxigênio e cloro, mas que, quando aquecidas, se quebram e destroem qualquer molécula orgânica maior que esteja por perto.
Até que chegamos à resposta definitiva: analisando amostras melhores, e se concentrando apenas nos gases evaporados delas a temperaturas bem altas (assim descartando o que pudesse ser ação de percloratos ou de contaminantes vindos da Terra), os pesquisadores encontraram moléculas orgânicas relativamente grandes e que continham enxofre -sintoma de que provavelmente compunham cadeias de moléculas ainda maiores. E tudo isso em perfurações de apenas 5 cm de profundidade em rochas.
O artigo científico reportando a descoberta, que tem como primeira autora Jennifer L. Eigenbrode, da Nasa, sai na edição desta sexta-feira (8) da revista Science. E, na mesma publicação, outro artigo relata outra fascinante descoberta feita pelo Curiosity.
Mais química orgânica. Desta vez na atmosfera. Além de procurar compostos complexos em rochas, o Curiosity tinha como meta primordial fazer a primeira detecção de gás metano na atmosfera, estando ele envolto nela.
Resultados anteriores obtidos por telescópios e missões orbitais sugeriam a presença de uma quantidade significativa dele, ainda que medido em partes por bilhão.
O metano é uma molécula que não dura muito na atmosfera, exposta aos raios ultravioletas solares –se ela existe no ar marciano, mesmo em quantidades pequenas, algo está constantemente lançando mais dela na atmosfera.
E, ao menos na Terra, a maioria do metano atmosférico é produzido por formas de vida.
A aposta dos cientistas é que haja grandes quantidades do gás presas no subsolo marciano no interior de cristais baseados em água chamados de clatratos. Para eles, as mudanças sazonais de temperatura poderiam explicar as flutuações na liberação do gás observadas pelo jipe.
Ainda resta a pergunta mais importante: o que teria produzido o metano aprisionado nesses clatratos?
Pode ser vida, pode ser um processo abiótico. A resposta terá de esperar – talvez por novos resultados, mais provavelmente por novas missões.
O Trace Gas Orbiter, da ESA (Agência Espacial Europeia), acabou de começar sua missão em órbita marciana, e seu objetivo é estudar a distribuição e os padrões de emissão do metano em escala global. Ele poderá corroborar ou colocar em dúvida os atuais resultados do Curiosity, mas certamente agregará peças ao quebra-cabeça.
Em 2020, tanto europeus quanto americanos prometem enviar jipes capazes de procurar evidências diretas de vida marciana.
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