Mercado de Trabalho

Justiça de Maceió reconhece vínculo empregatício entre motorista e empresa de aplicativo de transporte

Ascom TRT | 06/04/22 - 14h38
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Em decisão proferida na última segunda-feira (4/4), a juíza titular da 9ª Vara do Trabalho de Maceió, Alda de Barros Araújo Cabús, reconheceu vínculo empregatício entre um trabalhador e a empresa Uber. A magistrada determinou que a plataforma proceda, em um prazo de 30 dias após o trânsito em julgado, ao recolhimento do FGTS pelo período do contrato, com base na remuneração de R$ 1.191,68 que o ex-empregado recebia.

Condenou, ainda, a reclamada a anotar, em um prazo de 48 horas, o contrato de emprego na CTPS do obreiro, com as datas de admissão e demissão, o cargo que ocupava e a remuneração recebida, bem como a pagar 10% de honorários sucumbenciais em favor do autor da ação, calculados sobre os depósitos de FGTS.

Ao defender a inexistência do vínculo empregatício, a UBER sustentou que é uma plataforma de tecnologia utilizada pelos motoristas parceiros para a captação de usuários, e que não explora a atividade empresarial de transportes. Também alegou que atua na denominada economia de compartilhamento, especificamente da espécie sob demanda (on-demandeconomy).

Assim, argumentou que, nesse modelo, por meio de um sistema conectado à internet (aparelho celular), apresenta um grande número de consumidores (demanda) a trabalhadores independentes (oferta), que também se encontram cadastrados na mesma rede.

Acrescentou que seu sistema funciona como verdadeiro agrupador de solicitações de viagens, as quais são compartilhadas com os motoristas parceiros (trabalhadores independentes), que nela se cadastram com o intuito de maximizar os seus ganhos e, assim, prospectar os seus empreendimentos individuais.

Vínculo - No entanto, a juíza Alda Cabús embasou sua decisão em jurisprudências de âmbitos nacional e internacional que convergem para o reconhecimento do vínculo de emprego desses obreiros com as empresas do ramo. Como exemplo, citou recente decisão da Corte Francesa, que reconheceu que o sistema de geolocalização implantado por esses grupos empresariais permite o controle e a presença de um poder sancionador, sendo suficiente para demonstrar a subordinação.

A magistrada ainda destacou a posição da Corte de Justiça da União Europeia, que é de qualificar a Uber como um grupo de transporte, e não como de sociedade da informação. Ela também enfatizou o conteúdo dos depoimentos da prova testemunhal e do preposto.

A testemunha afirmou que, para a segurança da empresa, se o trabalhador ficar inativo por um longo período, há o descadastramento, mas o mesmo pode ser recadastrado imediatamente quando solicitado. Também salientou que o trabalhador pode ser descadastrado se houver recusas recorrentes de corridas em dinheiro.

Já o preposto admitiu que o motorista pode ser desativado se obtiver avaliação baixa pelo usuário e que, nessa análise subjetiva, ainda são levadas em consideração as condições do veículo. “Caso estivéssemos tratando de uma plataforma de informação, com o único objetivo de ligar usuários a motoristas, haveria, por exemplo, o pagamento de uma mensalidade desse trabalhador para o uso do aplicativo, e não o efetivo controle de corridas, preços, geolocalização e possibilidade de descadastramento”, considerou a magistrada.

As decisões de primeira e segunda instâncias seguem o princípio do duplo grau de jurisdição, sendo passíveis de recurso conforme o previsto na legislação processual.

Em nota enviada ao TNH1, a Uber afirmou que vai recorrer judicialmente desta decisão. Leia na íntegra: 

"A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 9ª Vara do Trabalho de Maceió, que representa um entendimento isolado e contrário ao de outros casos já julgados por diversos Tribunais Regionais do Trabalho e pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho) - o mais recente deles em novembro de 2021.

Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça brasileira formaram jurisprudência consistente sobre a relação entre a Uber e os parceiros, apontando a ausência dos quatro requisitos legais para existência de vínculo empregatício (onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação). Em todo o país, já são mais de 1.800 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho reconhecendo não haver relação de emprego com a plataforma.

Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima. 

O TST já reconheceu, em cinco julgamentos, que não existe vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. Em novembro de 2021, a 4ª Turma afastou o vínculo sob o entendimento de que motoristas trabalham "sem habitualidade e de forma autônoma" e que não existe "subordinação jurídica entre o aplicativo e o trabalhador". Em maio, a 5ª Turma já havia afastado a hipótese de subordinação de um motorista com a empresa porque ele podia "ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse" e "se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos de viagem desejasse". 

Outro julgamento de 2021, em março, decidiu que o uso do aplicativo não configura vínculo pois existe "autonomia ampla" do parceiro para escolher "dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber". 

Esse entendimento vem sendo adotado pelo TST desde 2020, com decisões em fevereiro e em setembro. Também o STJ (Superior Tribunal de Justiça), desde 2019, vem decidindo que os motoristas "não mantêm relação hierárquica com a empresa porque seus serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos, e não recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício" - a decisão mais recente neste sentido foi publicada em setembro de 2021."