Ganhando novo fôlego na literatura contemporânea com a força de nomes como do cearense Braulio Bessa, a Literatura de Cordel não sai de cena, se atualizando sem perder a essência do verso matuto que tão bem desenha o cotidiano do interior rural brasileiro. Aqui em Alagoas, um dos representantes dessa nova leva de poetas é Gilmar da Pindoba, que imprime já em sua assinatura o nome do pequeno sítio onde cresceu ouvindo estórias de trancoso, à luz do candeeiro, contadas por sua mãe, uma das poucas que sabia ler na pequena propriedade na zona rural de União dos Palmares, Zona da Mata alagoana. Os versos desse professor de 40 anos poderão ser conferidos em 16 poesias reunidas no livro “Versos pra Terra’, com lançamento marcado para o próximo dia 27.
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A obra, de 110 páginas, traz o frescor de um jovem poeta somado aos bons e velhos versos em sextilha e setilha, inconfundíveis do cordel. Em suas rimas calejadas de um professor de escola pública dado a lutar pela literatura em sala de aula, Gilmar atualiza o universo matuto introduzindo temáticas contemporâneos como as relações virtuais e a homofobia, mostrando que nenhum universo escapa às paginas de um bom cordel. “A paquera no aplicativo”, “O cabra macho ameaçado pelo número 24” e “A ruindade de Cassiano e seu passado oculto” introduzem esse temas.
Mas cordel não é cordel sem abordar a fé do homem do campo, presente em poemas como “Não queria ser Santo Antônio” e “Uma estrela em minha vida”, entre outros. E claro, o bom humor do matuto, nos versos de “Com cuspe é mais gostoso”, que, não fala sobre o que as “mentes poluídas” poderão pensar.
“O livro reúne vários cordéis meus. São poesias que passeiam por minhas vivências. Então é sobre minha relação com a zona rural, com a religiosidade. Trato também sobre questões de homofobia, que é algo que não vejo acontecendo nos cordéis. Então são poesias que trazem um pouco dessas minhas inquietações, dessas minhas percepções, entendesse?” conta Gilmar, com seu sotaque nordestino, alagoano, digno dos melhores cordelistas.
E para deixar um gostinho de quero mais, Gilmar deu um spoiler do livro, nos cedendo um de seus versos.
MEU VERSO ARRETADO
Nas cordas do coração
Por onde o sangue caminha
São transportados meus versos
Que alegra a vida minha.
Da poeira e do torrão,
Vem das raízes, do chão,
Da terra que me acarinha.
Meu verso vem lá de longe,
Mas aqui ficou vistoso.
Na terra rachada e seca
Ele cresceu mais formoso.
Deu voz ao povo da gente
Tratado como indigente
Pelo poder ardiloso.
Tá no canto de improviso,
Na força do agricultor.
Tá na viola afinada,
Na lua com seu fulgor.
Tá na mulher tão faceira
Com sua graça brejeira
E seu jeito encantador.
Tá na fúria observada
Nos olhos do cangaceiro,
No pau de arara lotado
De gente pro Juazeiro,
Na donzela agoniada
Doida pra ser cortejada,
Sem arranjar pareceiro.
Tá na sulanca ou forró
De lá de Caruaru,
Nas histórias de Trancoso,
No pé de mandacaru.
Tá nas comidas gostosas
Feitas por mãos tão zelosas,
No pirão de sururu.
Meu verso é muito arretado
E é bem mais doce que mel.
Ele é profundo e valente,
Mas cabe no meu papel.
Tiro do meu coração
E penduro no cordão:
É o folheto de cordel.
Quem é o autor - Gilmar de Oliveira Silva, formado em Letras pela Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), lugar onde teve o nome do sítio Pindoba integrado ao seu.
O universo literário foi se ampliando em torno de sua vivência como professor de Língua Portuguesa da Escola Estadual Rocha Cavalcanti, onde tem sempre produzido projetos pedagógicos difusores da literatura, estimulando a leitura e a escrita nos jovens, chegando a ser premiado por conta das ações desenvolvidas nesses projetos (servidor destaque 2018, medalha Sílvio Vianna 2018, medalha de bronze na Olimpíada de Língua Portuguesa 2019, campeão da Olimpíada de Língua Portuguesa 2021 – como o gênero artigo de opinião).
Serviço
Livro: “Versos pra Terra” (editora Q Gráfica)
Onde: União dos Palmares
Como adquirir: @gilmardapindoba / WhatsApp: 98815-2727
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