A família de William Green, um homem negro morto em janeiro por um policial nos Estados Unidos, vai receber US$ 20 milhões (R$ 113,2 mi) em indenizações após fechar um acordo, nesta segunda-feira (28), com o condado de Prince George, em Maryland, onde o crime aconteceu.
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"É um acordo histórico que reflete a natureza hedionda, a natureza brutal, a natureza sem sentido do que aconteceu com Green", disse William Murphy, um dos advogados da família.
Green tinha 43 anos e havia sido detido pela polícia no dia 27 de janeiro sob suspeita de ter batido seu carro contra outros veículos. Após uma ligação para o serviço de emergência, o policial Michael Owen chegou ao local e algemou Green com as mãos nas costas.
De acordo com a apuração dos investigadores, Owen colocou Green dentro da viatura para esperar um especialista que faria um exame para detecção de drogas. Minutos depois, entretanto, o policial, que também é negro, atirou sete vezes contra Green. Seis tiros o acertaram e ele morreu pouco depois, em um hospital.
A versão de Owen é que Green teria resistido à prisão e tentado pegar sua arma durante um embate físico. Os investigadores responsáveis pelo caso, porém, refutaram a versão do policial, que foi preso sob acusação de homicídio de segundo grau, que na lei brasileira equivale ao homicídio doloso, com intenção de matar.
"Há um padrão terrível de violência sem sentido, algumas coisas em seu entorno eram aterrorizantes", disse Murphy durante a entrevista coletiva em que foi anunciada a decisão civil.
O acordo milionário firmado com a família de Green é um dos maiores já registrados na Justiça americana para circunstâncias semelhantes. O caso também representa a primeira vez em que o condado de Prince George, nos arredores da capital americana, acusam um policial por homicídio durante o cumprimento do dever.
"Acreditamos que, quando estamos em falta, assumimos a responsabilidade", disse Angela Alsobrooks, chefe do governo de Prince George. A ex-promotora, que também é negra, afirmou que a polícia "recebe da comunidade uma responsabilidade incrível e extremamente difícil de proteger a vida" e que "quando essa confiança é violada, é necessária uma ação rápida e decisiva".
"E neste caso estamos aceitando a responsabilidade. Não há quantia apropriada de dinheiro para compensar uma perda como essa, mas acreditamos que as ações tomadas naquela noite contra o senhor Green e, em última instância, contra sua família, justificam este acordo", disse Alsobrooks.
"Esta não é a forma como queremos gastar o dinheiro dos impostos, e é por isso que estamos fazendo tudo que podemos para garantir que isso nunca aconteça novamente."
Parte da família de Green estava presente na entrevista coletiva. Ele tinha dois filhos e trabalhava como carregador de bagagens em uma empresa de ônibus. Sua filha, Shelly Green, 21, disse que o valor acordado não trará seu pai de volta, mas a família pretende utilizar parte da quantia em ações para combater a violência policial.
"Esse acordo histórico mostra que a vida negra de William Green e as vidas negras de sua mãe, filho e filha em luto são realmente importantes. Vidas negras importam", disse Murphy, o advogado da família, repetindo a frase que se tornou o principal lema das manifestações antirracistas mundo afora.
Em nota, o advogado do policial acusado pelo assassinato de Green disse que seu cliente foi acusado de maneira "automática", com base em "fatos não comprovados ou desconsiderados".
Apesar do acordo civil, as acusações criminais contra Owen continuam pendentes, segundo a promotoria de Prince George. A seleção do júri para o julgamento do policial está marcada para março de 2021.
"É importante lembrar que ele é presumido inocente e tem direito a um julgamento justo", disse, em comunicado, a promotora Aisha Braveboy.
Os casos de violência policial contra negros nos EUA motivaram uma série de protestos em todo o país denunciando o racismo e os excessos dos agentes de segurança contra minorias raciais.
Neste ano, casos como os de Breonna Taylor, morta a tiros em seu apartamento durante uma operação policial em março, e George Floyd, asfixiado por um policial branco em uma ação filmada por testemunhas em maio, geraram uma onda de indignação que continua se traduzindo em manifestações em várias cidades americanas.
Como a polícia dos EUA tem ampla proteção para suas ações durante o serviço, conhecida como imunidade qualificada, as famílias das vítimas estão cada vez mais se voltando para processos civis contra municípios e condados em busca de justiça.
Há duas semanas, autoridades da cidade de Louisville, no Kentucky, concordaram em pagar US$ 12 milhões (R$ 67,6 mi) em indenizações à família de Breonna. A cidade também concordou em instituir mudanças na conduta policial local, mas apenas um dos três agentes envolvidos no caso foi processado pela Justiça.
Brett Hankinson foi indiciado sob a acusação de expor cidadãos a risco injustificado, pois atirou contra uma janela e uma porta que estavam fechadas, violando uma regra do departamento de polícia que exige que os agentes tenham uma linha de visão clara ao atirar.
Ele foi demitido da polícia e chegou a ser preso, mas pagou fiança no valor de US$ 15 mil (R$ 84 mil) e deve aguardar o julgamento em liberdade.
Em julho, a família de George Floyd também processou a cidade de Minneapolis, mas ainda não houve uma decisão judicial sobre possíveis indenizações.
Segundo o advogado da família Floyd, Ben Crump, o objetivo do processo era "estabelecer um precedente que torne financeiramente proibitivo para a polícia matar injustamente pessoas marginalizadas -especialmente as negras- no futuro".
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