Certidão de óbito de Rubens Paiva é corrigida e diz que morte foi causada por Estado na ditadura

Publicado em 24/01/2025, às 13h58
A mudança atende a uma determinação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) de dezembro do ano passado - Reprodução
A mudança atende a uma determinação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) de dezembro do ano passado - Reprodução

Por Arthur Guimarães de Oliveira e Luis Eduardo de Sousa / Folhapress

A certidão de óbito de Rubens Paiva, cuja história é contada no filme "Ainda Estou Aqui", foi retificada nesta quinta-feira (23) para constar que o ex-deputado teve morte violenta e causada pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar. A informação foi revelada pela TV Globo e confirmada pela Folha de S.Paulo.

A nova versão do documento indica que a causa da morte foi "não natural; violenta; causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964".

Na versão anterior, emitida no ano de 1996 pelo cartório da Sé, em São Paulo, após mobilização de Eunice Paiva, mulher de Rubens, pelo reconhecimento da morte do marido, constava apenas que ele tinha desaparecido em 1971.

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A mudança atende a uma determinação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) de dezembro do ano passado para que cartórios de registro civil lavrem ou corrijam os documentos de pessoas mortas e desaparecidas políticas.

"É um acerto de contas legítimo com o passado", afirmou na ocasião o presidente do conselho e presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luís Roberto Barroso. A iniciativa foi do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

De acordo com o CNJ, levantamento realizado pelo ONRCPN (Operador Nacional do Registro Civil de Pessoas Naturais) mostrou que há 202 casos de retificação de certidões de óbito e 232 novos registros de óbito a serem produzidos.

A história de Rubens Beyrodt Paiva, engenheiro, empresário e político brasileiro, é contada no longa de 2024 "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles e protagonizado por Fernanda Torres, Selton Mello e Fernanda Montenegro.

A obra é a adaptação para o cinema do livro homônimo do escritor Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado perseguido e desaparecido durante a ditadura militar no Brasil, e conta a história da mãe, Eunice Paiva.

Também na última quinta-feira, Fernanda Torres foi indicada ao Oscar de melhor atriz pelo desempenho no filme. A obra, por sua vez, foi indicada a melhor filme e melhor filme internacional, sendo o primeiro longa do país a disputar o prêmio principal.

Nascido em 1929, em Santos (SP), Rubens Paiva foi eleito em 1962 deputado federal por São Paulo, pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), mesma legenda do então presidente da República João Goulart. Foi cassado após golpe militar em 1964.

Exilou-se na embaixada da Iugoslávia, no Rio de Janeiro e, em junho de 1964, deixou o Brasil, partindo para a França e depois para a Inglaterra. Retornou ao país natal no início de 1965 onde se instalou com a família inicialmente em São Paulo, e, depois, no Rio de Janeiro.

Em 1971, agentes da repressão invadiram a casa do deputado cassado, que tinha 41 anos, e o levaram em seu próprio carro para prestar depoimento. Desde o sequestro as torturas já teriam sido iniciadas. Enquanto isso, a família permanecia incomunicável e detida em casa.

Informações colhidas pela CNV (Comissão Nacional da Verdade) apontam para a permanência de Rubens Paiva em unidade do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna), onde teria sido torturado e executado.

A mulher dele, Eunice Paiva, se tornou símbolo de luta contra ditadura militar pelo papel de busca ativa por informações sobre o paradeiro do marido. Ela chegou a ser detida e, depois da libertação, passou a exigir a verdade sobre Rubens.

Ao saber do assassinato, demandou o reconhecimento da morte e a revelação do local onde o corpo foi enterrado, algo nunca esclarecido. A atuação dela contribuiu para a criação da lei que reconhece como mortas as pessoas desaparecidas durante a ditadura militar.

Eunice Paiva morreu aos 89 anos, em 2018, em São Paulo.

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