Um capacete de respiração assistida criado por pesquisadores no Ceará tem ajudado no tratamento de pacientes internados por Covid-19. Batizado de Elmo, em referência ao equipamento que protegia a cabeça de soldados na era medieval, o aparelho já está sendo usado em ao menos oito estados.
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"Recebemos 50 capacetes há 45 dias e o pessoal aqui está bem empolgado, realmente consegue trazer um diferencial de assistência ventilatória não invasiva. Nossa experiência tem mostrado que diminui a chance de pacientes serem intubados", disse o infectologista Guillermo Sócrates, 43, diretor-geral do Hcamp, hospital de campanha da gestão estadual em Goiânia.
Feito de silicone e PVC, o Elmo oferece oxigênio em alto fluxo. Ele envolve toda a cabeça do paciente, é fixado no pescoço em uma base que veda a passagem de ar e é indicado para pessoas que precisam de oxigênio em um estágio pré-intubação.
"Pense em uma escada de tratamento para pacientes que precisam de oxigenação. O primeiro degrau é o catéter de oxigênio, passando depois para a máscara. Nesse momento entra o capacete, com ventilação não invasiva, sem a necessidade do respirador", explicou o pneumologista Marcelo Alcantara, 53.
O paciente fica, em média, de sete a dez dias usando o equipamento, se necessário até 24 horas por dia -ele pode ser retirado para a alimentação.
Superintendente da ESP (Escola de Saúde Pública) do Ceará, Alcantara liderou a força-tarefa que elaborou o Elmo, inspirado em máscaras de mergulho usadas por médicos italianos no tratamento de Covid-19 e em capacetes hiperbáricos utilizados em doenças de descompressão nos EUA e na Europa.
Estudo feito em parceria com a UFC (Universidade Federal do Ceará) mostrou que 60% dos pacientes internados que usaram o equipamento deixaram de ser intubados.
Uma contra-indicação apresentada no período de testagem foi para pessoas que tenham claustrofobia, já que o Elmo envolve toda a cabeça do paciente.
"A estética do Elmo, num primeiro momento, assusta um pouco. Mas indico a todas as pessoas que possam usar, o capacete salvou minha vida", contou o servidor público Francisco Fábio Santiago, 39.
Morador de Chorozinho, cidade a 70 km de Fortaleza, Santiago pegou Covid no fim de 2020. Ele foi internado na capital em 24 de novembro no hospital Leonardo da Vinci, adquirido pelo governo do Ceará no ano passado para uso exclusivo de pacientes com a doença.
"Estava com 80% do pulmão comprometido, fui direto para a UTI e os médicos disseram que era caso para intubação. Foi quando deram a opção do Elmo, que não era conhecido ainda. Em 30, 40 minutos de uso já senti um conforto respiratório. Usei por cinco dias, dos 17 que fiquei internado. Não precisei da intubação", contou Santiago.
Em novembro de 2020, após cinco meses de testes, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou a produção em escala industrial, e uma empresa cearense foi licenciada para a fabricação -hoje o valor de um capacete é, em média, de R$ 1.200.
Os royalties são divididos entre as cinco instituições que participaram da força-tarefa de criação: a ESP, a UFC, a Unifor (Universidade de Fortaleza), a Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará) e o Senai-CE.
No início de fevereiro, três profissionais da ESP foram a Manaus treinar médicos e enfermeiros para o uso do Elmo -o governo do Ceará doou 40 capacetes ao Amazonas. O mesmo ocorreu em março, no Maranhão.
A maioria dos produtos hoje é comprado por instituições privadas e doado a prefeituras e governos estaduais. O Hcamp de Goiânia, por exemplo, recebeu suas unidades de uma empresa que reverteu na compra do Elmo uma multa recebida do Ministério do Trabalho.
A Secretaria de Saúde de São Paulo obteve em abril a doação de 150 capacetes que estão sendo testados, informou o governo estadual -algumas prefeituras do interior, como de Paraguaçu Paulista, compraram o equipamento por conta própria.
O governador do Rio, Cláudio Castro (PSC), sancionou uma lei em 15 de abril autorizando o Elmo nos hospitais estaduais, mas segundo a Secretaria de Saúde o equipamento ainda não está em uso.
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