Aos 80 anos, cantora Anastácia lança EP comemorativo

Publicado em 23/06/2020, às 12h46
Foto: Divulgação
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Por Estadão Conteúdo

Quando começou a se apresentar em concursos de calouros, ainda na adolescência, Anastácia costumava ouvir que mulher não tinha fôlego para cantar forró. Tinhosa, como gosta de se definir, deu de ombros. Queria ser artista. “Eu pensava: se mulher tem fôlego para parir, também tem para cantar forró”, diz ela, que agora completa 80 anos, mais de 60 de carreira e, ainda com fôlego, lança um EP comemorativo com cinco canções inéditas – uma delas criada com Dominguinhos, com quem foi casada – e participações de novos e velhos amigos.

Anastácia, embora diga que componha todos os dias, confessa que não tinha certeza se lançaria algo para comemorar a data. “Quem ainda liga para disco?”, pergunta, ignorando as plataformas digitais, que desde 29 de maio, um dia antes de seu aniversário, abrigam Anastácia 80 – Lado A, trabalho produzido por Zeca Baleiro e Adriano Magoo.

O projeto é maior do que as canções que já foram divulgadas. Porém, as gravações tiveram de ser interrompidas por conta da pandemia do novo coronavírus e serão retomadas assim que tudo voltar ao normal.

Nesse Lado A, Anastácia assina duas parcerias com Baleiro: o baião-canção O Sertão Está Chorando, cantada em dueto com Amelinha, e o xote Venha Logo, com participação de Chico César. “Ela escreve o tempo todo, a mulher é danada (risos)”, diz Baleiro, que afirma que, ao comandar o trabalho, se preocupou em manter a essência da artista no forró, mas com toque de modernidade nos arranjos.

Venceu a Solidão, com vocal de Mariana Aydar e Mestrinho na sanfona, é parceria inédita de Anastácia e Dominguinhos, com quem ela foi casada entre 1967 e 1978. A melodia estava com a compositora, que colocou letra quando Dominguinhos estava doente – ele morreu em 2013, aos 72 anos, vítima de um câncer de pulmão. “Pensei na solidão que uma doença traz, ele naquele hospital. Gravei só agora”, conta Anastácia, dizendo ainda ter outras músicas inéditas do antigo companheiro guardadas, esperando por letra.

Poderia ter mais, mas colocou fogo em várias fitas cassetes quando o casamento terminou. “Na hora da raiva…”, lamenta. Baleiro conta que a emoção foi grande ao gravar a faixa. “A música é linda e emocionante. Mariana caiu no choro. Foi comovente para todos nós. Dominguinhos é um melodista único”, diz.

A faixa A Saudade Me Trouxe Pelo Braço, que Anastácia assina com a filha, Liane, tem a participação de um antigo companheiro de sanfona e estrada: o alagoano Hermeto Pascoal, que era o sanfoneiro da Rádio Jornal do Commercio, do Recife, e a acompanhava quando ela tinha 14 anos de idade. Outra que ela fez com a filha é Contando as Estrelas, que gravou acompanhada de Roberta Miranda. “Foi uma festa receber todos esses convidados. Uma verdadeira comemoração”, comemora a compositora.

Zeca Baleiro concorda que é preciso festejar a data. “Eu sou suspeito porque sou muito fã, acho Anastácia imensa. Vamos celebrá-la – em vida – de preferência”, diz o músico, que conta ter conhecido o trabalho da compositora por meio das gravações de Gilberto Gil – ele gravou Só Quero Um Xodó e Tenho Sede, ambas dela e de Dominguinhos. Hoje, são amigos e parceiros em cinco canções.

O Lado B – ainda sem previsão de lançamento – terá as participações de Alceu Valença, Lenine, Geraldo Azevedo, Almério, entre outros.

Rainha do forró

Nascida no Recife (PE), Lucinete Ferreira, seu nome de batismo, tornou-se Anastácia quando chegou a São Paulo, aos 20 anos, junto com a família. Conciliando o desejo de cantar com o emprego na companhia aérea Vasp, gravou o primeiro LP, que saiu com o título de Anastácia no Torrado. Nem ela sabia quem era a pessoa do título. “Um amigo me disse que havia ouvido o disco, que era minha voz, minha foto, mas a nome da cantora era Anastácia. Corri para tirar a história a limpo”, diverte-se hoje, esclarecendo que a troca foi obra de seu primeiro empresário, o Palmeira, que achava seu nome de batismo muito comum. “No Nordeste tem muito nete. Lucinete, Marinete, Ivonete…”

De lá para cá, Anastácia atuou como locutora, radialista, atriz e comediante, e ganhou o epíteto de Rainha do Forró. Mas foi como compositora, gravada por nomes como Noite Ilustrada, o primeiro a gravar, Luiz Gonzaga, seu padrinho musical, Angela Maria, Gilberto Gil, Gal Costa e Nana Caymmi – e de sua parceria com Dominguinhos – que ela se consagrou. Ajudou a difundir a música nordestina no Sudeste, rompeu a barreira do machismo e, ao lado de Marinês, Almira e Clemilda, abriu o caminho para nomes como Elba Ramalho, nos anos 1970, e Lucy Alves, mais recentemente. “Valeu a pena. Faço o que gosto. Sou muito grata por tudo. Tenho orgulho de ter nascido no Nordeste, no Brasil”, diz, com entusiasmo.

E, como o fôlego ainda está em cima, Anastácia vai lançar mais uma gravação. Trata-se de Meu Santo é Brasa – que está em pré-venda na Amazon (com lançamento para dia 26) -, que ela fez com Jackson do Pandeiro nos anos 1980, mas esqueceu. “Há alguns anos, Lucy Alves pediu autorização para gravá-la, e pensei: nunca fiz música com Jackson. Mas não é que era minha mesmo?”, ri, explicando que tem quase 800 músicas. “Às vezes, ouço na voz de outro artista e me pergunto: fui eu que fiz essa?”, conta. Agora, é sua vez de cantar a composição que, oportunamente, fala das festas e santos juninos.

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