Análise de manual para conter óleo mostra que governo demorou a agir

Publicado em 26/10/2019, às 18h11
Folhapress
Folhapress

Por Folhapress

Uma análise do manual elaborado pelo governo para determinar se o Plano Nacional de Contingência de Incidentes com Óleo (PNC) deve ou não ser acionado mostra que o governo demorou a agir, mesmo com o agravamento diário das manchas.

O manual indica 35 perguntas que ajudam a determinar a magnitude do problema e a necessidade ou não de dar prosseguimento ao plano.

Algumas delas são: a fonte de descarga [de óleo] não foi controlada? Há possibilidade de ampliar a(s) área(s) impactada(s)? Há possibilidade de o óleo causar impactos ambientais de relevante comoção social? Há possibilidade de o óleo afetar área de importância socioeconômica?

No caso do vazamento de óleo que atinge o Nordeste brasileiro desde 30 de agosto e já afetou mais de 230 localidades, as respostas para essas perguntas é sim. Nem todas as questões precisam ter respostas positivas para que o plano seja acionado.

As perguntas devem ser discutidas pelo chamado GAA (Grupo de Acompanhamento e Avaliação). Os detalhes do manual foram revelados pelo jornal O Globo.

O documento foi aprovado pelo comitê executivo do plano nacional em reunião em março de 2018 e teve participação dos ministérios do Meio Ambiente (MMA), da Defesa, de Minas e Energia, e da Marinha, Ibama e da Agência Nacional de Petróleo, que integram o GAA.

O documento reforça a estrutura organizacional do plano de contingência. Nessa estrutura, o Ministério do Meio Ambiente é a autoridade nacional e pode dar início às ações relacionadas ao plano. O manual também detalha os procedimentos a serem tomados dependendo do acidente.

Se o plano é acionado, um coordenador operacional é designado para acompanhar o vazamento. Essa designação só foi feita em 11 de outubro em ofício interno pelo ministro Ricardo Salles, 43 dias após o aparecimento das manchas. Àquela altura, 155 locais e todos os estados do Nordeste já tinham sido afetados.

A primeira nota da Marinha sobre o óleo data de 27 de setembro. O GAA só foi citado pela primeira vez em nota de 14 de outubro. O governo diz, porém, que o GAA vem realizando ações para a retirada do óleo "desde que as primeiras manchas surgiram".

Já a primeira menção do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao vazamento de óleo foi feita em rede social em 5 de outubro. Nela, Salles dizia que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) determinou urgência na identificação na origem do óleo. No mês de setembro, o ministro viajou ao exterior para melhorar a imagem ambiental internacional do Brasil, arranhada após os aumentos no desmatamento e as queimadas na Amazônia.

Por causa da demora para ativar o plano de contingência, no dia 18 de outubro o MPF (Ministério Público Federal) entrou com uma ação contra a União por omissão e determinou que o PNC fosse ativado em até 24h.

À Justiça Federal do Sergipe, a União disse que o PNC já estava em execução desde o início de setembro, diferentemente do indicado no ofício interno do Ministério do Meio Ambiente. A Justiça do Sergipe decidiu no dia 20 que o plano já estava em ação.

Uma vez que o coordenador operacional do plano de contingência é designado, os comitês Executivo e de Suporte deveriam ajudar na gestão do incidente. Esses conselhos foram extintos por decreto de Jair Bolsonaro em abril, como revelou a Folha de S.Paulo.

Os comitês extintos também intermediariam a disponibilização de recursos humanos e materiais para ajudar na resposta ao vazamento.

Segundo funcionários do MMA e especialistas, a extinção dos comitês pode ter atrasado a resposta do governo.

O manual também aponta que cabe ao coordenador, no caso a Marinha, um centro de comunicações que facilite o acesso às informações. Somente na quinta (24) o governo lançou um site oficial com dados sobre as manchas.

De acordo com um relatório sobre medidas para conter vazamentos de óleo da EPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos), quando há um derramamento na água o material precisa ser contido o quanto antes. O equipamento mais utilizado na contenção de óleo são as barreiras flutuantes.

O Ibama chegou a questionar a eficácia das boias, mas, após decisão da Justiça Federal de Sergipe, instalou no dia 14 de outubro barreiras nos rios São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Real e Vaza Barris. No dia seguinte, porém, parte da estrutura foi levada pela água devido à velocidade das correntes na vazão dos rios.

Há outros métodos que poderiam ser usados, segundo a EPA, como os escumadores, equipamentos que ajudam a recolher óleo da superfície da água. Esses equipamentos, no entanto, tendem a recolher mais água do que óleo quando usados no mar agitado. Também seria possível utilizar materiais absorventes, segundo a agência americana.

A falta de informações sobre a origem do óleo e se ele se move abaixo da superfície da água dificulta sua contenção.

"Quando não se tem o fator de origem, não se sabe como foi e quando foi, é como [procurar] agulha no palheiro", disse Eberaldo de Almeida Neto, diretor de assuntos corporativos da Petrobras.

Análises da estatal concluíram que o óleo é uma mistura da produção de três campos na Venezuela. A companhia disse que investigações apontam como provável origem o derramamento por navio.

Gostou? Compartilhe