Com quase 77% dos registros de queimadas de todo mês de agosto concentrados em apenas 12 dias de setembro e com previsão de uma seca histórica nos rios, o governo do Amazonas decretou situação de emergência ambiental em municípios do Sul do estado e na região metropolitana de Manaus.
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O decreto foi feito após pressão de secretários municipais que denunciaram o risco do aumento de focos de incêndio e as condições precárias para combatê-los. Secretários afirmam que falta apoio dos governos estadual e federal para controlar as chamas. O Ibama, por sua vez, afirma que os registros são em áreas que fogem à competência federal.
Desde julho, as queimadas aumentaram no estado e, neste mês, com 4.127 focos até dia 12, o Amazonas está no topo do ranking de estados com maior número de incêndios, de acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Na sequência, aparecem Pará (3.500) e Mato Grosso (1.954).
Na lista dos dez municípios com maior número de queimadas, em setembro, estão cinco cidades amazonenses da região conhecida como Amacro: Novo Aripuanã, Lábrea, Humaitá, Apuí e Manicoré. O segundo lugar do ranking é Porto Velho, capital de Rondônia, também na região da Amacro. O primeiro é Altamira, no Pará.
A Amacro é a nova fronteira de expansão do agronegócio na divisa de Amazonas, Acre e Rondônia. A região também é marcada por casos de desmatamento para grilagem de terra.
No início do mês, quando a fumaça das queimadas tomou o céu de Manaus e outras cidades da região da Amacro, o município de Apuí realizou a sua festa agropecuária anual, com cortejo de políticos locais renovando promessas de lutar pela obra de pavimentação da rodovia BR-319 e pelo agro no Amazonas.
De acordo com o governo do Amazonas, os municípios de Benjamin Constant e São Paulo de Olivença, no Alto Solimões, e Envira e Itamarati, no Juruá, estão em situação de emergência em razão da estiagem. Em 15 municípios do Estado, a situação é de alerta também por causa da seca dos rios. Outros 13 estão em estado de atenção.
Os mais afetados pelas queimadas e pela fumaça, no sul do Amazonas, foram os contemplados com repasses de recursos para contratação de brigadistas.
Nas últimas duas semanas, moradores do interior tiveram lavouras e casas queimadas, suspensão de aulas em escolas, registro de acidente nos rios com embarcações, além da perda de animais silvestres e de floresta atingidos pelo fogo.
Segundo o governo, será destinado R$ 1,1 milhão para contratação de 153 brigadistas em nove municípios no sul do Amazonas e na região metropolitana de Manaus, locais com maior número de focos de calor.
O governo também anunciou medidas na saúde para facilitar a retirada de pacientes graves de cidades isoladas com a seca dos rios e apoio aos produtores rurais devido às perdas pela seca.
A secretária de Meio Ambiente de Maués (AM), Jane Crespo, que coordena o Fórum de Secretários de Meio Ambiente do Estado do Amazonas, comemora o repasse, mas lamenta que não tenha chegado a todos que enfrentam o problema e a falta de planejamento.
"Havia alertas de que passaríamos por isso. Dava para ter feito antes", avalia.
Crespo conta que os brigadistas contratados nos últimos dias e as chuvas amenizaram o fogo e a fumaça em muitos municípios. No combate às chamas, ela diz, também foi fundamental a participação de indígenas.
"Há terras que os indígenas tiveram de lidar só com o fogo porque não havia gente, nem no Ibama. Estamos orientando aqui em Maués e passando essa ideia para os demais secretários, no sentido de prevenir e combater incêndios com a ajuda das lideranças indígenas", afirma.
Ruy Marcelo, procurador de Contas do Amazonas, afirma que o MPC (Ministério Público de Contas) já atuou em várias ocasiões para fortalecer o combate às queimadas como política perene do estado. Ele aponta as queimadas como resultado do alto grau de desmatamento ilegal no primeiro semestre.
"Amontoam a vegetação, comercializam madeira nobre e convertem em pasto e campo na estiagem. Outra parte, deve-se ao hábito de ribeirinhos queimarem folhas secas e resíduos sem consciência de que vivemos numa crise climática", diz.
"Não adianta muito falar em milhões em multa se os ilícitos não forem efetivamente evitados e contidos e as áreas não forem reflorestadas. Por isso, as ações tanto de controle quanto de indução ao desenvolvimento precisam ser estratégicas e integradas", completa.
Marcelo afirma que, além de planejamento para prevenir e combater incêndios, os governantes deveriam procurar meios de lidar com a fumaça nas cidades.
"É muito importante que as autoridades entendam o que é o smog [pluma de fumaça estacionária que torna crítico o nível de qualidade do ar] e se há organização de planos de contingência para mitigar o risco numa situação assim."
Quanto à seca na região, a pesquisadora de geociência do CPRM (Serviço Geológico do Brasil) Jussara Cury afirma que as descidas dos rios Negro e Solimões, que formam o Amazonas, estão regulares, mas as cotas dos mesmos estão abaixo do normal para a época.
"Isso ocorreu pelo acumulado negativo de chuvas nessa região. Tanto em agosto como em setembro, choveu abaixo da média. Na calha do Amazonas, as descidas estão regulares, mas com níveis baixos", explica. "No rio Madeira, essa semana entramos com níveis abaixo da faixa da normalidade, mas com expectativa de recuperação no mês de setembro."
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