Contextualizando

“A segurança é a prioridade” – um tema que precisa ser colocado em pauta para debate nas campanhas eleitorais

Em 1 de Junho de 2024 às 13:31
As eleições municipais de outubro deste ano, para escolha de prefeitos e vereadores, mostrarão que se não apresentar propostas claras de combate à criminalidade o candidato não terá muita chance.
O mesmo vale, principalmente, para aqueles que tenham interesse em disputar as eleições de 2026, para deputado, senador, governador e presidente da República.
É o entendimento do empresário Nuno Vasconcellos:

“A questão ao se dar ao problema da criminalidade um tratamento meramente estatístico é que a frieza dos números não consegue mostrar a dor daqueles que perderam pessoas queridas, que tombaram vítimas de um tiroteio. Da mesma forma, os números não expõem a indignação de quem, para preservar a própria vida, se viu obrigado a entregar para um assaltante um aparelho celular que ainda nem terminou de pagar.

É esse tipo de situação, que parece aumentar sem que o estado se mostre disposto a colocar a segurança pública no topo de suas prioridades, que fará com que as pessoas, nas eleições que vierem daqui por diante, cobrem dos candidatos medidas efetivas de combate à criminalidade. Seja como for, os dados da criminalidade no Rio e no Brasil são apenas o retrato possível de um problema que cresceu sem que nenhuma autoridade parecesse disposta a combatê-lo de frente.

Um problema que só será resolvido no dia em que o governo federal, todos os governos estaduais e as prefeituras de todos os 5569 municípios brasileiros se convencerem de que o cidadão brasileiro não aceita mais ficar à mercê da bandidagem. Enquanto a sociedade não utilizar a arma mais eficaz de que ela dispõe numa democracia — o voto — para demonstrar sua indignação diante do problema, a questão da segurança pública não será elevada à condição de prioridade absoluta. E, a se confiar no que indicam os institutos de pesquisa, o momento dessa arma ser utilizada começa agora.

A verdade é que se não houver essa união de todos em torno do problema e se a segurança não for reconhecida como o principal problema que o país tem a resolver, os bandidos continuarão agindo como se fossem senhores de tudo e a sociedade permanecerá acuada e com medo. Nos últimos anos, o Comando Vermelho, de origem fluminense, e o paulista PCC se transformaram em estruturas poderosíssimas e verticalizadas, com centros de comando que controlam tudo com mão de ferro, presença em todos os estados da federação e sucursais em outros países.

Quem imagina que os roubos de celulares são obra de ladrõezinhos pé de chinelo e que isso nada têm a ver com as mega organizações criminosas está redondamente enganado. Elas se tornaram tão onipresentes que, de acordo com quem acompanha suas ações, a prática desses delitos secundários é vista no mundo do crime como uma espécie de teste de seleção para as operações mais arriscadas e lucrativas.

As corporações criminosas do Brasil são monitoradas de perto e ganharam aos olhos das autoridades internacionais de segurança o status de uma ameaça tão grande quanto a dos cartéis colombianos, dos cartéis mexicanos, da Máfia italiana, da Máfia albanesa, da Tríade chinesa, da Yacuza, do Japão e do grupo narcoterrorista Hezbollah. E como o Estado brasileiro não utilizou as ferramentas que tem à sua disposição para agir contra os bandidos quando ainda eram fracos, acabou permitindo que a fera se formasse poderosa demais para ser abatida com dois ou três golpes.

Agora, para acabar com as organizações, será preciso que se mobilizem recursos materiais e humanos muito superiores aos que estão disponíveis atualmente. Que se invista em segurança e em inteligência e que, livres dos preconceitos que têm marcado a atuação do governo federal nesse campo, se fechem acordos de cooperação com países como os Estados Unidos, Israel e Alemanha — que têm muito a contribuir com equipamentos, softwares, armas e, acima disso tudo, informações.

A tarefa, qualquer pessoa minimamente informada sabe, não será fácil e, no ponto a que a situação chegou, nenhuma mudança significativa virá da noite para o dia. Qualquer mudança expressiva que vier a ser notada no Rio de Janeiro, por exemplo, as ações devem começar em localidades situadas a milhares e milhares de quilômetros daqui.

Muito já se falou que os traficantes que transformaram as comunidades dos morros cariocas em cidadelas do crime organizado utilizam armas que não são fabricadas no Rio de Janeiro. Elas entram no Brasil pela fronteira terrestre, viajam por milhares de quilômetros e chegam a seu destino depois de passar por rodovias que deveriam ser fiscalizadas por uma série de órgãos federais e de outros estados.

Muitas dessas armas chegam ao Brasil depois de atravessar o rio Paraná na região da tríplice fronteira com a Argentina e o Paraguai, na região de Foz do Iguaçu. As autoridades do Brasil estão cansadas de saber que todas as noites mais de cem viagens de barco entre as duas margens trazem para o Brasil armas, drogas, produtos eletrônicos, cigarros, bebidas alcoólicas, roupas e calçados e uma série de outros produtos contrabandeados que, além de ajudarem a alimentar o crime, causam um estrago enorme na indústria e no comércio do Brasil.

A pergunta é: se as autoridades sabem que isso acontece, por que tudo continua a acontecer noite após noite sem que ninguém tome uma providência? A primeira tentação é considerar tudo isso como culpa de agentes que fazem vista grossa para um crime que acontece bem debaixo de seus narizes. E, no momento seguinte, considerar tudo como parte de um sistema corrupto que permite a ação dos criminosos em troca de algum benefício. Será que é assim tão simples?

Vamos aos fatos: pode até ser que entre os agentes da Polícia Federal encarregados da guarda da fronteira brasileira exista quem feche os olhos para a ação dos criminosos. Pode ser. Mas, atribuir as falhas do sistema a esse tipo de situação é, no mínimo, um ato de irresponsabilidade. Nas atuais condições de trabalho, os responsáveis pela guarda das fronteiras terrestres do Brasil não conseguiriam conter a ação dos criminosos nem se fossem dotados dos superpoderes dos heróis dos desenhos animados.

O Brasil tem quase 16 mil quilômetros de fronteiras terrestres e mais de sete mil quilômetros de costas. Todos eles, no que diz respeito à fiscalização do que entra e do que sai do país, são de responsabilidade da Polícia Federal — que conta com um efetivo total, entre pessoal de campo e a equipe de retaguarda, de pouco menos de 12 mil profissionais. Esses números falam por si e são suficientes para demonstrar a necessidade de um efetivo muito maior do que temos atualmente.

Outro ponto: é verdade que os agentes da força de segurança contam hoje com armamentos de melhor qualidade e equipamentos muito superiores aos de alguns anos atrás. Mas a cada dia fica mais evidente que os bandidos contam com armas mais modernas e dispõem de um efetivo muito superior ao das forças de segurança. Portanto, acima de pessoas e de armamentos, é preciso mudar a mentalidade: todos precisam estar atentos ao problema e se unir para resolvê-los. E mais: se a Constituição tiver que ser mudada para que o Sistema Nacional de Segurança Pública seja adequado às necessidades do momento, que se mude. O Brasil quer segurança e já passou da hora de enfrentar a bandidagem. E derrotá-la.”

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