De Nuno Vasconcellos, no portal “IG”, sobre a chamada Minireforma Eleitoral aprovada pela Câmara dos Deputados:
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“A pretexto de ‘aperfeiçoar a legislação’ com vistas à disputa de 2024, quando serão escolhidos os prefeitos e os vereadores dos 5.568 municípios do país, o texto acabou promovendo uma das mais escancaradas ações em causa própria já vistas neste país. Os beneficiados, claro, são os políticos em campanha, que, a partir de agora, e se tudo permanecer como foi aprovado pelos deputados, se tornam praticamente inimputáveis à luz da legislação eleitoral.
O texto foi aprovado, em primeira votação, por 367 votos a favor, 86 contrários e uma abstenção. O resultado é para lá de expressivo. Por se tratar de um Projeto de Lei, teve 110 votos a mais dos 257 que teriam sido suficientes para a aprovação. E assim, o número superou os 342 votos necessários para a aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional na Câmara.
Os deputados votaram os destaques e aprovaram aquele que talvez seja o único ponto positivo da minirreforma: a proibição de uma aberração chamada ‘candidatura coletiva’, que permitia que uma única vaga no Parlamento fosse ocupada por uma patota de ativistas. Tirando esse e mais um ou dois pontos, o projeto é um desastre! Para entrar em vigor já nas próximas eleições, as medidas precisam agora passar pelo Senado. Caso sofram alguma mudança, voltarão à Câmara. Depois, deverão ser sancionadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes do dia 6 de outubro.
Mas, afinal, o que o texto aprovado tem de tão escandaloso assim? Num resumo apressado, o Projeto de Lei 4438/2023 e o Projeto de Lei Complementar 192/2023, obras coletivas encabeçadas pela deputada Dani Cunha (União-RJ) e relatadas pelo petista Rubens Pereira Júnior (MA), reduzem o alcance da Lei da Ficha Limpa.
Elas anulam penas a que os partidos e os políticos estariam sujeitos por irregularidades cometidas nas eleições passadas. Além disso, perdoam as multas aplicadas pela Justiça Eleitoral e criam uma espécie de blindagem para dificultar ou até mesmo evitar que novas punições venham a ser aplicadas daqui por diante. Ou seja, liberou geral!
As novas regras eleitorais reduzem as obrigações que pesam sobre os candidatos em campanha, dificultam a fiscalização de sua conduta e, em alguns casos, até mesmo impedem que recaiam sobre os partidos políticos o mesmo tipo de punição utilizado a torto e a direto contra os cidadãos que eles representam. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo de Financiamento de Campanha, por exemplo, continuam impenhoráveis e não podem, em hipótese alguma, ser objeto de bloqueio judicial ou de confisco.
A lei também legaliza práticas que, num passado recente, já despertaram a indignação contra os políticos que as cometeram. Quer um exemplo? Se tudo permanecer como está, os candidatos e os líderes partidários poderão gastar o dinheiro público que receberão a título desses fundos para adquirir ou alugar ‘veículos, embarcações e aeronaves’ e utilizá-los da forma que bem entenderem.
Se algum deles quiser, por exemplo, comprar uma lancha, um jatinho ou um helicóptero em nome do partido e, depois, embarcar num desses ‘veículos’ numa viagem de férias com a família ou com os amigos, ninguém terá o direito de abrir a boca para se queixar.
Outro ponto: sabe aqueles recursos do fundo eleitoral que, nas eleições passadas, estavam reservados para as candidaturas femininas? Pois é… Agora, eles podem ser compartilhados em dobradinhas com os homens… Só mais uma, para encerrar o assunto: candidatos de partidos diferentes podem compartilhar material de campanha. Essa possibilidade, na prática e ao lado de outras medidas da nova lei, reduz o esforço feito até aqui no sentido de promover a necessária redução da quantidade de legendas existentes no Brasil…”
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