O alagoano Arthur Lira (PP/AL) vive seus últimos meses no exercício da presidência da Câmara dos Deputados.
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Em fevereiro do próximo ano terá de passar o cargo para um sucessor, seja aliado ou não.
Nesse tempo que lhe resta andará na linha tênue de ser a favor do governo Lula (PT) e receber futuramente alguma compensação ou simplesmente contrariar os interesses do Palácio do Planalto.
Essa questão é analisada pelo jornalista Josias de Souza, no portal “UOL”:
“Em oito meses e meio, quando o Congresso entrar em recesso, Arthur Lira descobrirá que o olimpo não tem escada. Dali a mais dois meses, na alvorada de um novo ano legislativo, seja qual for o resultado da sucessão interna da Câmara, as portas já não se abrirão sozinhas. Não haverá mais mansão oficial, geladeira cheia, mordomos e jatinhos da FAB à disposição da divindade. Lira conhecerá os rigores de uma maldição que marcou a trajetória de antecessores que não souberam se reinventar.
Marco Maia não conseguiu se reeleger deputado pelo Rio Grande do Sul. O paulista João Paulo Cunha, o potiguar Henrique Eduardo Alves e o carioca Eduardo Cunha fizeram escala na cadeia. O primeiro,
carbonizado pelo mensalão, renunciou ao mandato . O segundo, após exercer 44 anos de mandatos ininterruptos como deputado, perdeu uma eleição para o governo do Rio Grande do Norte. Tentou retornar à Câmara, mas foi novamente barrado pelo eleitor. O terceiro, artífice do impeachment de Dilma Rousseff, foi afastado do cargo pelo Supremo Tribunal Federal antes de ser cassado pelos colegas.
Rodrigo Maia, um dos presidentes mais longevos da Câmara, amargou o naufrágio do plano de fazer um sucessor. Seu candidato, Baleia Rossi, foi esmigalhado por Arthur Lira. Representante do Rio de Janeiro, Maia virou secretário da gestão João Doria, em São Paulo. Vigiado pela Abin paralela de Bolsonaro e acossado pelo bolsonarismo nas redes sociais, anteviu um novo fiasco ao se abster de tentar a sorte das urnas. Migrou para a iniciativa privada.
Alheio à síndrome do que está por vir, Lira desafia o ocaso exercitando o pecado capital da soberba. Apaixonado pela própria voz, acomodou Alexandre Padilha, o articulador político do Planalto, na caixa dos “desafetos pessoais”. Chamou-o de “incompetente”. O tiro ricocheteou no dono da articulação. Lula atirou de volta: “Só de teimosia, Padilha vai ficar muito tempo nesse cargo”.
Pressentindo o cheiro de queimado, o deputado Elmar Nascimento, candidato de Lira à própria sucessão, levou as mãos ao extintor. Tenta apagar nos bastidores o incêndio que afugenta o governo para candidaturas alternativas. Os poderes de Lira decrescem na proporção direta do avanço do calendário eleitoral.
Logo, logo, premidos pela necessidade de acomodar aliados nas prefeituras de seus redutos, os deputados estarão mais interessados nas urnas do que na agenda econômica do ministro Fernando Haddad (Fazenda). Algo que transforma a irascibilidade de Lira numa aposta arriscada. Com sua “teimosia”, Lula sinaliza a disposição de demonstrar que a divindade da Câmara e o pedaço do centrão que carrega o seu andor têm mais a perder do que o Planalto. Todos os ingredientes desse embate estão impregnados de ardis.
Proprietário da pauta do plenário da Câmara, Lira pode facilitar ou infernizar o segundo ano de um governo que mantém um olho na inflação dos alimentos e outro na curva descendente
das pesquisas. Dono do Diário Oficial, Lula como que convida o imperador da Câmara e sua turma a lançarem um olhar para a caixa registradora da Codevasf, da Caixa Econômica Federal e dos ministérios terceirizados ao centrão.
Sabe-se que, nesse jogo, uma mão suja a outra. Lula não ignora que seu governo alimenta parlamentares que estarão na trincheira inimiga em 2026. Minoritário no Congresso, move-se como se desejasse esclarecer que todos os que quiserem continuar comendo na mesa do seu governo terão pelo menos que ajudar a lavar os pratos.
Lira abespinhou-se com o Planalto contra um pano de fundo manchado pelo caso Marielle Franco. Um pedaço do centrão uniu-se à milícia parlamentar de Bolsonaro na malograda articulação para abrir a cela do deputado Chiquinho Brazão, um dos acusados de encomendar a execução de Marielle. O soberano da Câmara enxergou as digitais do articulador político do Planalto na difusão da maledicência segundo a qual sua debilidade ficou gravada no painel eletrônico que manteve o preso na tranca. Daí os disparos contra Alexandre Padilha.
Para desassossego de Lira, Padilha continua dando expediente na Presidência da República. A presença de Chiquinho Brazão e seus cúmplices em presídios federais evidencia uma mudanças dos ventos na Polícia Federal. A corporação desmonta velhas blindagens. O mesmo ânimo parece pautar as ações da Procuradoria-Geral da República. Fechou-se a fábrica de escudos que operava sob Augusto Aras.
Nesse contexto, até os aliados começam a avaliar que Arthur Lira, cultor de mumunhas orçamentárias e sócio fundador da confraria do antigo orçamento secreto, brinca de corda sem atentar para o nó que asfixiou alguns dos seus antecessores. No Planalto, imagina-se que Lira, trancado em seus rancores, desperdiçará um naco do final de semana para desarmar o espírito.”
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