Perícia feita a pedido de família de brasileira morta na Argentina indica feminicídio

Publicado em 08/10/2024, às 14h08

Mayara Paixão / Folhapress

Um ano e meio após a morte de Emmily Rodrigues em Buenos Aires, ao cair do sexto andar de um prédio no bairro de Retiro, a família da brasileira insiste que houve feminicídio e contratou uma nova perícia independente cujo laudo afirma isso.

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Emmily, que tinha 26 anos, morreu em 30 de março de 2023 após cair do apartamento do empresário argentino Francisco Sáenz Valiente, que foi acusado de homicídio culposo e por facilitar o uso de drogas à vítima. Ele responde em liberdade, com uso de tornozeleira eletrônica.

A família de Emmily, porém, afirma que a brasileira não teria caído devido ao uso de entorpecentes, mas sim que foi jogada da janela do prédio. Emmily estava nua e possuía diversos ferimentos pelo corpo; a perícia contratada por sua família afirma que alguns deles foram produzidos antes da queda.

A brasileira havia chegado de madrugada ao apartamento de Sáenz Valiente com outras duas mulheres. Durante a manhã, o empresário ligou duas vezes ao serviço de emergência afirmando que Emmily estaria tendo uma espécie de surto psicótico.

O laudo assinado pelo criminalista Enrique Prueger, e que a família encaminhou à Justiça, analisa os áudios dessas chamadas, os vídeos da chegada de Emmily ao edifício e os ferimentos e conclui que se trata de um feminicídio. O documento foi detalhado inicialmente pelo jornal argentino Clarín e posteriormente enviado à Folha.

"A vítima apresentou múltiplas lesões que são incompatíveis com a dinâmica da queda, como as das mãos e do pescoço; junto à análise dos áudios, isso demonstra que a vítima sofreu tortura, foi golpeada e que seu corpo tinha traumas relacionados com medidas tomadas para evitar que ela escapasse do lugar", diz o resultado da perícia.

Nas gravações das chamadas para o serviço de emergência, é possível escutar a voz de Emmily ao fundo. Sáenz Valiente afirmou que seriam expressões do surto que a brasileira estaria tendo.

A nova perícia, que não é vinculante ao processo por se tratar de algo encomendado por uma das partes, afirma que Emmily fez ao menos 14 pedidos de socorro durante esses áudios.

"Para entender que o fato não coincide com um homicídio, é importante ter em conta que as ações que antecedem a queda da vítima foram em sua maioria para pedir ajuda, chamando 'polícia' várias vezes"", diz um trecho.

O laudo de Enrique Prueger afirma que a brasileira foi jogada pela janela. "A altura da janela e as medidas da vítima, assim como as lesões em seu tórax e abdome direito, indicam que ela foi segurada e forçada a passar pela janela para fora."

A reportagem questionou o criminalista sobre o fato de que a perícia quase não menciona as substâncias entorpecentes que Emmily usou. Ele disse que os gritos permitem ver que nem a quetamina, uma das substâncias apontadas no exame toxicológico e de efeito anestésico dissociativo, teria afetado sua capacidade de expressão. "Extraímos daí que ela é consciente da realidade de tudo que está passando naquele momento."

Sáenz Valiente tem como advogado Rafael Cúneo Libarona, de um dos escritórios de advocacia mais conhecidos da Argentina. Ele é irmão do ministro da Justiça do governo de Javier Milei, Mariano Libarona. O escritório não respondeu aos pedidos de comentário.

Emmily vivia na Argentina desde 2018. Seu pai, Aristides, afirma que ela se mudou com a expectativa de cursar medicina após trancar o curso de direito em Salvador. Com dificuldades com o espanhol, alterou os planos e passou a atuar na área de tratamentos estéticos e como modelo.

Ele está já em seu terceiro advogado no caso. Agora, é representado por Raquel Hermida Leyenda, especializada em temas de gênero.

Leyenda pleiteia que a acusação seja de crime de feminicídio e trabalha para que Juliana Magalhaes, outra brasileira que estava com Emmily e com Sáenz Valiente no momento da morte, seja investigada. O laudo da perícia familiar diz que ela atuou como cúmplice. A reportagem não conseguiu contatá-la.

A pena para homicídio culposo na Argentina varia de 3 a 6 anos de prisão. Já para o crime de feminicídio é prevista prisão perpétua.

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