Opinião: “Não podemos entregar a discussão da evolução educacional às ideologias políticas”

Publicado em 21/06/2024, às 17h28

Redação

A educação brasileira nas últimas décadas tem deixado muito a desejar e são raríssimos os casos de alguém que consegue se sobressair pelo talento.

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Há, na verdade, ilhas de talento nessa área em que cada vez mais os governantes impõem políticas educacionais de acordo com a sua ideologia político.

Isso explica o nível de insucesso nos vários níveis de ensino.

A assunto é abordado por Marcos Pontes, doutor em engenharia, astronauta e senador pelo Estado de São Paulo:

 

“Quem me conhece sabe que eu valorizo a educação e luto por um país onde o jovem tenha oportunidades para transformar a sua vida e a de sua família.

Eu nasci na periferia, numa casa simples de madeira, numa rua que não tinha calçamento. Meu pai, seu Vergílio, era servente de serviços gerais e minha mãe, dona Zuleika, era escriturária da Rede Ferroviária Federal. Fui criado pelos meus pais e irmãos com disciplina e determinação, baseados nos valores da honestidade.

Quando eu era menino, tinha um sonho de ser piloto, tinha o sonho de voar e, talvez, chegar ao espaço. Mas, a minha família não tinha dinheiro para bancar as horas de voo que eu teria que estudar. Então, eu resolvi fazer dois cursos técnicos, na época chamado de ensino profissionalizante. E foi graças a um curso de elétrica de locomotiva do Senai que consegui meu primeiro emprego. Estudava de manhã, trabalhava à tarde, ganhava meio salário mínimo que pagava o curso noturno de técnico em eletrônica. E foi assim que fiz o meu ensino médio. Eu tenho muito orgulho dessa minha trajetória, que faz parte de quem eu sou hoje.

A educação é essencial para a construção de uma sociedade justa e igualitária. A nação que investe em seu sistema educacional, é uma nação próspera, inovadora e preparada para os desafios futuros. Não podemos entregar a discussão da evolução educacional às ideologias políticas. Precisamos reconhecer que a educação é uma questão do Estado Brasileiro, que ultrapassa governos. O aluno precisa sonhar e enxergar o futuro. O aluno que não enxerga o ensino superior, dificilmente se enxerga no ensino médio.

O Senado aprovou o projeto (PL 5230/2023) que cria algumas mudanças no Novo Ensino Médio (NEM) para melhor atender às necessidades dos estudantes, a fim de preparar o Brasil para o futuro. O projeto foi elaborado pela senadora professora Dorinha (União/TO) e conta com uma emenda (nº 40) de minha autoria. O texto volta, agora, para a Câmara dos Deputados para a análise das mudanças no texto.

Dentre outros pontos, o texto amplia a carga horária mínima anual do ensino médio. A soma da carga horária de formação geral básica nos três anos do ensino médio deve totalizar, no mínimo, 2.400 horas. Nos cursos técnicos e profissionais, a formação geral básica poderá ter carga horária mínima de 2.200 horas até 2028. As 200 horas restantes deverão ser implantadas até 2029, sendo as horas restantes utilizadas para aprofundamento de conteúdos da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) diretamente relacionados à profissionalização oferecida.

A União, os estados e o Distrito Federal deverão articular a implementação das estratégias previstas na Política Nacional da Educação Profissional e Tecnológica para estimular a oferta de educação profissional e tecnológica.

No projeto, já estão incluídos estudantes de baixa renda do ensino médio matriculados em escolas públicas dentro do Programa Pé-de-Meia, além do Prouni e das cotas educacionais previstas no acesso ao ensino superior. Essa flexibilização e inclusão dos alunos é importante para garantir a educação a todos os estudantes, independente da sua origem socioeconômica ou geográfica e, assim, fazer com que alcancem seus sonhos.

Em 2023, apresentei um projeto (PL 3166/2023) que sugere ao Poder Executivo implementar o Programa Bolsa Estudantil do Ensino Médio, a fim de garantir o acesso escolar dos estudantes de baixa renda matriculados em escola pública, por meio de uma bolsa disponibilizada mensalmente. Apresentei esse projeto no dia 21 de junho de 2023. O objetivo é contribuir com a redução da evasão escolar e aumentar o acesso da população de baixa renda à educação, promovendo a equidade e o desenvolvimento social e econômico do Brasil.

No início deste ano, o governo federal criou a Lei nº 14.818, publicada no dia 16 de janeiro, instituindo o Programa Pé-de-Meia que oferece incentivo financeiro aos estudantes do ensino médico de colégios públicos, na modalidade de poupança.

Analisando as duas matérias e, ao compará-las, é possível observar que muitos elementos centrais da lei vigente, estavam previstos no PL 3166 que apresentei há exato 1 ano.

A Lei nº 14.818/2024 se alinha à finalidade do PL 3166/2024 cujo objetivo é apoiar a permanência dos estudantes na escola até a sua conclusão dos estudos, utilizando o CadÚnico como critério de elegibilidade. Pelo texto do projeto (e da lei), o estudante precisa de registrar formalmente no programa que também prevê a formalização e a transparência na gestão dos benefícios educacionais.

O PL e a Lei apresentam determinações adicionais detalhadas em outra matéria, o Decreto nº 11.901, de 26 de janeiro de 2024, regulamentando os valores e os tipos oferecidos pelo Programa.

Somente uma parte do projeto que propõe que o estudante beneficiado neste programa que for aprovado no ensino superior (público ou privado) terá prioridade nos programas de assistência estudantil do governo federal e das instituições de ensino não está no texto da Lei. Mas existem outros projetos, ainda em tramitação, que tratam dessa questão.

A harmonia entre as duas propostas é importante e assegura, possivelmente, a continuidade e a eficácia dos incentivos educacionais para que estudantes de baixa renda permaneçam na escola, deem continuidade aos estudos, garantam uma formação superior e, assim, transformem sua vida de maneira significativa. No entanto, é essencial que futuras leis e regulamentações garantam a coesão e a efetividade dos programas de assistência estudantil, alinhando-se aos princípios de igualdade e acessibilidade da educação pública no Brasil.

A minha trajetória não foi fácil. O pessoal falava para mim ‘você quer ser piloto? Você nunca vai conseguir’. Mas, a minha mãe, com toda a humildade e seus lindos olhos azuis, olhava para mim e dizia ‘você pode ser tudo o que quiser na vida, desde que estude, trabalhe, persista e sempre faça mais do que esperam de você’, e ela estava certa. Eu alcancei meus sonhos. Me tornei engenheiro pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e fui o primeiro brasileiro a viajar ao espaço. Com educação e persistência, não há limites para o que podemos conquistar.”

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