Estadão Conteúdo
Neste domingo, 21, um adolescente de 14 anos faleceu em Kerala, na Índia, após contrair o vírus Nipah (NiV). A infecção tem alta taxa de mortalidade e integra a lista de prioridades da Organização Mundial da Saúde (OMS) por seu potencial de causar uma emergência de saúde pública.
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A doença já provocou surtos em diversos países asiáticos ao longo dos anos e tem sido alvo de medidas de contenção na Índia, mas os riscos de a doença se espalhar para outras regiões e chegar ao Brasil é baixo, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão.
Transmissão e sintomas - O vírus é zoonótico, ou seja, transmitido de animais para humanos. Os hospedeiros naturais são morcegos da família Pteropodidae, embora outros animais, como porcos e cavalos, também possam ser infectados.
A transmissão para humanos ocorre principalmente pelo consumo de frutas e sucos contaminados com urina ou saliva dos morcegos infectados - as espécies hospedeiras são frugívoras. Também é possível haver transmissão de pessoa para pessoa em caso de contato próximo.
Inicialmente, pessoas infectadas apresentam febre, dor de cabeça, dor no corpo, vômitos e dor de garganta. Algumas pessoas também podem apresentar pneumonia atípica e problemas respiratórios graves, incluindo dificuldade respiratória.
Esses sintomas podem ser seguidos por tontura, sonolência e alteração de consciência. Em casos graves, há convulsões e encefalite (inflamação no cérebro), progredindo para coma em 24 a 48 horas.
A maioria das pessoas se recupera totalmente, mas aproximadamente 20% ficam com sequelas neurológicas, como transtorno convulsivo e alterações de personalidade. Um pequeno número de pacientes sofre recaídas ou desenvolve encefalite de início tardio.
Atualmente, não há medicamentos ou vacinas específicas, e a taxa de letalidade da infecção pelo vírus é estimada entre 40% e 75%, segundo a OMS, variando de acordo com o surto, vigilância epidemiológica e manejo clínico nas áreas afetadas.
Quais as chances de o vírus chegar ao Brasil? - Livia Casseb, chefe da seção de arbovirologia e febres hemorrágicas do Instituto Evandro Chagas (IEC), explica que o Nipah exige contato próximo com casos mais graves, e por isso tende a se espalhar menos e de forma mais lenta. "O vírus precisa de contato próximo com secreções corporais contaminadas, como sangue, saliva, urina ou secreções respiratórias de indivíduos gravemente doentes", diz.
Outro fator que pode dificultar a disseminação da doença é que, diferentemente da covid-19, ela não é transmitida por pessoas assintomáticas. Além disso, o período em que uma pessoa infectada pode transmitir a doença é curto. "Isso significa que a transmissão casual, como em ambientes públicos ou por meio de contato superficial, é improvável", afirma a especialista.
Helena Lage Ferreira, médica veterinária e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia (SBV), destaca ainda que os morcegos da família Pteropodidae não ocorrem no Brasil e sua distribuição está restrita a alguns países da Ásia, Oceania e África. "Com isso, as infecções pelo contato com os animais infectados ou suas secreções estão limitadas às regiões em que ocorrem os morcegos."
Fernando Molento, analista na área de biossegurança do IEC, acrescenta que os países onde há circulação do vírus possuem protocolos de emergência com respostas rápidas e o apoio da OMS para detecção e controle de surtos emergentes.
"A chance de o vírus chegar ao Brasil é pouco provável, mas considerando que ele é um patógeno de alta disseminação, não podemos descartar a possibilidade", sintetiza Fernando Augusto Dias e Sanches, que pesquisa o tema. Nesse caso, os especialistas afirmam que o Brasil possui protocolos e instituições preparadas para lidar com a doença.
Histórico - O Nipah foi identificado pela primeira vez na Malásia, em 1999, durante um surto entre criadores de porcos. Na ocasião, foram identificados mais de 250 casos de encefalite febril, quadro clássico da doença.
O segundo surto ocorreu em Bangladesh e na Índia, em 2001, associado ao contato com alimentos infectados com urina e saliva de morcegos. Desde então, têm acontecido surtos quase todos os anos em Bangladesh e periodicamente no leste da Índia, de acordo com a OMS.
Nesses surtos posteriores, o vírus se espalhou diretamente de humano para humano. De 2001 a 2008, por exemplo, cerca de 50% dos casos relatados em Bangladesh foram causados pela transmissão interpessoal durante os cuidados a pacientes infectados.
Como explica Sanches, os surtos normalmente acontecem em temporadas de colheita de frutas nesses países. A morte registrada nesta semana, no entanto, ocorreu fora desse período.
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