Folhapress
Vozes masculinas narraram quase todos os principais momentos do esporte brasileiro desde 19 de julho de 1931, quando o locutor Nicolau Tuma (1911-2006) fez a primeira transmissão esportiva no país, com o microfone da Rádio Educadora Paulista.
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Foi só na década de 1970 que Zuleide Ranieri (1945-2016) se tornou a primeira mulher a comandar um evento esportivo no rádio. Na televisão, a estreia foi ainda mais tardia, em 1997, com Luciana Mariano, na TV Bandeirantes.
"A sociedade é machista, muitas vezes preconceituosa, elitista e barra a possibilidade de muitas pessoas se apresentarem, crescerem e ganharem espaço", diz ao jornal Folha de S.Paulo Cléber Machado, narrador da TV Globo desde 1988. "Felizmente, as coisas estão melhorando. As pessoas estão preocupadas em combater, denunciar e protestar."
Para ele, também é preciso promover a inclusão. Na emissora carioca, levou-se exatos 55 anos para que uma narradora ganhasse espaço. No dia 10 de março deste ano, Renata Silveira tornou-se a primeira mulher a narrar uma partida de futebol -entre Moto Club e Botafogo, pela Copa do Brasil- em um dos canais do grupo (SporTV).
"Se alguém ainda precisa 'acostumar o ouvido', vai acostumar. Não tem volta, é uma inclusão necessária", defende Machado.
Depois de Renata, que veio dos canais Fox Sports, a Globo contratou recentemente Natália Lara, ex-ESPN. "Elas fazem a transmissão no padrão que se faz transmissão [na Globo]. Identificam os caras, crescem nos lances próximos da grande área, são bem informadas e entendem de futebol. Têm as características necessárias para quem transmite um evento esportivo", elogia o narrador.
Ao longo do tempo, cada uma delas também poderá desenvolver seu estilo próprio, com bordões e frases marcantes para o público, como fizeram Galvão Bueno, Silvio Luiz e Luciano do Valle (1947-2014), narradores que, segundo Cléber, reúnem as bases para o exercício da profissão.
"Nós temos a descontração do Silvio Luiz, aquela transmissão apaixonada do Luciano do Valle e a técnica, vibração e emoção do Galvão. Esses três narradores são a base do que nós fazemos hoje", diz.
Desde o início da pandemia de Covid-19, em março de 2020, o desafio para os narradores é encontrar o tom adequado para promover a euforia e a alegria provocados pelo esporte em meio ao momento de tristeza pelo crescente número de mortes.
Para Cléber, não há como não lembrar o estrago proporcionado pelo vírus mesmo durante uma partida de futebol. A Globo sempre informa o número de pessoas infectadas, mortas e vacinadas antes de cada jogo, seguido do respeito ao minuto de silêncio.
"Ao mesmo tempo, você não vai passar o jogo inteiro falando da tristeza porque talvez o jogo seja até o momento da pessoa desanuviar", comenta.
A ausência de torcedores nos estádio também reflete no trabalho do profissional. Sem os gritos e reações vindos das arquibancadas, há a necessidade de buscar outros elementos para compor a transmissão.
O narrador cita alguns, como os cartazes e mosaicos colocados nas arquibancadas e o serviço de som dos estádios, que reproduzem cânticos dos torcedores.
Há ainda as reações das torcidas nas redes sociais. Aos 59 anos, porém, Cléber Machado não é adepto de meios como o Twitter, o Instagram e o Facebook.
Ele aponta a toxicidade presente nas redes como um dos motivos que o afasta de criar perfis. "Eu fico com a sensação de que quem se manifesta nunca se manifesta muito favoravelmente", diz. "Além disso, penso que, se a pessoa fica fissurada com o número de seguidores, vira uma doença. Se ficar exultante ou triste por causa dos comentários, vira um problema. Então, acho que é por isso que eu fico ponderando."
Durante as transmissões, prefere ficar atento ao painel que indica a audiência da Globo e das emissoras concorrentes. Principalmente durante as partidas do Campeonato Brasileiro, o principal torneio de clubes do portfólio atual da Globo.
"É o campeonato que mais mexe com o público brasileiro. E que envolve vários estados, cidades. Este ano, nós temos dois estados a mais, então são 11 ao todo", ressalta o narrador.
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