Jovens moradores de grotas de Maceió vão produzir documentário sobre a pandemia

Publicado em 10/09/2020, às 19h05
Reprodução -

Agência Alagoas

“A gente não vai sair desse período do mesmo jeito. Foi um tempo de reflexão, de perceber o que realmente importa para a vida”, comentou Tauan Santos Silva, 18 anos, durante a primeira oficina de comunicação popular promovida na última quinta-feira (03) pelo projeto de monitoramento e resposta rápida à Covid-19 realizado pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) em parceria com o Governo de Alagoas nas grotas de Maceió.

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O jovem morador da Grota José Laranjeiras, no Jacintinho, é um dos nove selecionados pelo projeto que, em seu segundo componente, pretende produzir um documentário em formato de curta-metragem sobre o impacto do novo coronavírus nas comunidades mais vulnerabilizadas durante a pandemia.

Sem aglomeração, o primeiro encontro virtual com a turma havia acontecido no dia anterior para as apresentações de praxe e demais indicações acerca da missão que deverão executar durante os meses de setembro e outubro. “Além de poderem se apresentar, o objetivo foi também explicar o projeto e a atuação do ONU-Habitat junto com o Governo do Estado ao longo dos últimos três anos”, assinalou Paula Zacarias, Analista de Programas do ONU-Habitat em Alagoas.

Já na oficina – a primeira de quatro a serem realizadas quinzenalmente –, os participantes receberam uma série de orientações da equipe do ONU-Habitat sobre as atividades que deverão desenvolver ao longo da primeira fase, batizada de “Eita, que vírus é esse?”.

Todo o processo foi formatado como se fosse um jogo, com missões, desafios, pequenas recompensas, cujo objetivo é trazer os melhores materiais em audiovisual produzidos pelos jovens sobre a Covid-19. Nessa primeira etapa, cada integrante deveria enviar até esta quinta-feira (10) o mínimo de três fotos e um vídeo com duração entre 3 e 5 minutos inspirados no tema proposto.

O objetivo é identificar o conhecimento geral sobre a Covid-19 e a percepção dos jovens sobre a pandemia, bem como, estimular o engajamento comunitário por meio de registros em foto e vídeo – vale depoimento pessoal, de parentes, vizinhos e de amigos que morem nas grotas. Após ser compilado e editado, o conteúdo captado nos intervalos entre as oficinas será utilizado para conceber e enredar o documentário.

Outro desafio da fase consiste em convidar o máximo de seguidores para o perfil oficial do projeto no Instagram (@visaodasgrotas) e também que cada seguidor comente o nome da equipe da qual o jovem que ele conhece faz parte, e assim ampliar o número de pessoas interessadas em acompanhar o projeto e dar visibilidade à produção dos jovens.

Durante a primeira oficina, a apresentação de um tutorial com dicas de produção audiovisual em smartphone forneceu informações básicas antes do início das filmagens. Além de instruções sobre enquadramento de imagem, captação de áudio e limpeza da lente do celular, entre outras, houve orientações sobre o conteúdo a ser registrado, como destacar os aspectos urbanos, sociais, culturais e econômicos das grotas e evitar material de cunho eleitoral, ofensivo, preconceituoso ou degradante.

Por fim, os participantes responderam a perguntas que poderão auxiliar a produção audiovisual e deram seus depoimentos pessoais sobre como enfrentaram a pandemia da Covid-19 nos últimos meses.

Transformação

Com idade entre 16 e 28 anos, o grupo de nove jovens representa nove grotas situadas em diferentes bairros da capital. Uma junção heterogênea de jovens, com formação e atuação profissional diversificada, e diferentes engajamentos e experiências diante dos riscos de transmissão e contágio provocados pelo vírus.

Mary Alves, 26 anos, moradora do Morro do Ary, no Jacintinho, é uma das seis mulheres que integram o time. Cantora e compositora alagoana com formação em Serviço Social pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), ela perdeu o emprego numa empresa de call center no começo da pandemia e teve o pai internado por 20 dias por causa da Covid-19.

Já Josias Brito, o “Tripa”, 22 anos, que mora “entre a Grota do Rafael e a Grota do Arroz”, se declara “artista independente autônomo” e diz sobreviver da contribuição dos usuários do transporte coletivo onde solta o verbo com versos e rimas. “Passei dois meses sem rimar. No começo da pandemia, não tive retorno financeiro por causa do choque e da queda no movimento dos ônibus”, lamentou.

Entre os jovens selecionados, há também uma realizadora do audiovisual com mestrado em Cinema. É Maysa Santos, 28 anos, que apresenta currículo com diversas experiências no segmento. Formada em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo e Relações Públicas, a moradora das Piabas já participou de festivais, como a Mostra Sururu de Cinema Alagoano, que há dez anos se tornou a principal vitrine para os realizadores da Sétima Arte no estado.

Mas, também há pontos convergentes entre as minas e os manos. Descrita na abertura do texto, a percepção do jovem Tauan – morador da grota José Laranjeiras, no Jacintinho – reflete uma ideia comum expressada pelos demais colegas no decorrer da oficina: os desafios impostos pela pandemia também se tornaram sinônimo de transformação.

E transformação é palavra-chave no conceito original do próprio projeto que, em seu primeiro componente, começou a ouvir moradores de todas as 100 grotas da capital com o objetivo de coletar dados e informações sobre os impactos da Covid-19 e o contexto socioeconômico, estrutural e sanitário em que vivem.

Ao final, será preparado um diagnóstico que poderá servir de base para gestores e governantes elaborarem políticas públicas e projetos de sustentabilidade para as áreas urbanas mais vulnerabilizadas e afetada pela pandemia em Maceió.

No dia 17 de setembro, a partir das 13h, a galera do Visão das Grotas vai se reunir novamente para a segunda oficina cujo tema será “A pandemia na minha quebrada”.

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