Gêmeos não assumem paternidade e juiz condena ambos ao pagamento de pensão

Publicado em 03/04/2019, às 22h10
Laboratório/Ilustração | Rovena Rosa/Agência Brasil -

VEJA.com

Dois homens gêmeos idênticos foram condenados no último dia 21, pelo juiz de direito Filipe Luis Peruca, do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), a assumirem simultaneamente a paternidade biológica de uma menina de oito anos, residente de Cachoeira Alta (GO).

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A decisão do magistrado reconhece que, evidentemente, é impossível que ambos os condenados sejam pais biológicos da criança. Os dois se submeteram a exames de DNA. Como gêmeos univitelinos, no entanto, o resultado do teste foi positivo para ambos.

Diante do impasse, o juiz Filipe Peruca, tal qual a história bíblica do rei Salomão, criou uma situação em que ambos saem prejudicados com a dupla paternidade, uma vez que determinou aos dois que paguem pensões alimentícias, independentes uma da outra, punindo-os por não falarem a verdade sobre o ocorrido. Os nomes também serão acrescentados na certidão de nascimento.

Na Bíblia, no livro de Reis, consta a história de um julgamento feito por Salomão, rei de Israel, sobre o caso de duas mulheres, que se reivindicam como mães de uma criança recém-nascida. Para decidir o caso, Salomão afirma que iria cerrar ao meio o bebê, para dividi-lo entre elas. Após a ameaça, uma das mulheres abdica da criança para poupá-la e é reconhecida pelo rei como mãe, por ter se abnegado em prol do bem do bebê.

O processo da justiça goiana começou com a mãe que apontou um dos dois como sendo o pai da criança. Com o resultado positivo no exame de DNA, este implicou o irmão gêmeo como o pai. Após colher depoimentos, o magistrado avaliou que os irmãos usam a semelhança física para aplicar trapaças, simular identidades falsas em relacionamentos e ocultar relações extraconjugais.

Em sua decisão, Filipe Peruca considerou que, diante da ação dos dois para “enrolar” o pagamento da pensão, a menina não poderia ser prejudicada, já que o exame concluiu que um dos dois é com certeza o pai dela.

“Fica evidente que os requeridos, desde a adolescência, valiam-se – e valem-se –, dolosamente, do fato de serem irmãos gêmeos. Tanto assim que, no curso da instrução, ficou claro que um usava o nome do outro, quer para angariar o maior número de mulheres, quer para ocultar a traição em seus relacionamentos. Era comum, portanto, a utilização dos nomes dos irmãos de forma aleatória e dolosamente”, escreveu.

“Os filhos menores – crianças e adolescentes – gozam, por determinação constitucional, de plena proteção e prioridade absoluta em seu tratamento. Logo, seus interesses devem ser tutelados e seus direitos resguardados”, concluiu. Os dois homens também foram condenados a dividir uma indenização à mãe no valor de 3.000 reais, referentes às custas processuais.

Esse é o primeiro caso de multiparentalidade biológica no Brasil. Para inaugurar esse conceito, o juiz utilizou os preceitos adotados pela Justiça no caso da paternidade socioafetiva – quando alguém é identificado como pai por relações afetivas. Neste caso, a lei brasileira já permite que a criança tenha pais biológicos e afetivos simultaneamente.

Ao site do TJGO, a mãe da criança comemorou a decisão, mas lamentou que nenhum dos dois assuma a paternidade da filha. “É uma atitude muito triste, não precisavam disso. Eles sabem a verdade, mas se aproveitam da semelhança para fugir da responsabilidade”.

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