Ex-capitão da guarda presidencial é condenado por cobrar propina

Publicado em 28/02/2018, às 17h20

Redação


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O Superior Tribunal Militar (STM) condenou um capitão da reserva do Exército a três anos de reclusão sob a acusação de exigir propina de uma empresa a fim de garantir que ela saísse vencedora num processo de licitação referente à compra de 65 ônibus, em 2012.

O oficial atuava à época como chefe da Seção de Licitações do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), em Brasília. A sentença foi aplicada na sessão do dia 23, informou o STM. De acordo com a denúncia, o pedido de vantagem indevida por parte do militar caracterizou o crime como concussão, conforme o artigo 305 do Código Penal Militar.

Segundo a acusação, o militar procurou o representante legal da empresa e sugeriu que “tinha influência” para fazê-la vencer o processo mediante o pagamento de um porcentual do futuro contrato, orçado em mais de 17 milhões de reais.

Depois, já durante o pregão eletrônico para a aquisição dos ônibus, segundo a acusação, o militar interceptou a documentação da empresa e, por meio de mensagem eletrônica de celular, informou a ocorrência de um suposto erro que resultaria na sua inabilitação.

“Quando o preposto chegou ao Batalhão da Guarda Presidencial para fazer a correção, o militar lembrou do assunto que haviam tratado anteriormente e sugeriu, por meio de gestos, o valor de uma possível propina”, segue a acusação. “No entanto, como consta nos autos, a empresa negou-se claramente a participar do crime.”

O acusado foi denunciado à Justiça Militar da União. Em sessão de julgamento realizado no dia 24 de janeiro de 2017, na 2ª Auditoria de Brasília, o Conselho Especial de Justiça para o Exército, por unanimidade, condenou o ex-capitão pelo crime de concussão, a seis anos de reclusão.

Recurso

Na apelação julgada no Superior Tribunal Militar, dia 23, o Plenário analisou recursos do Ministério Público Militar e da defesa do réu.

O recurso do Ministério Público Militar pedia a aplicação das penas acessórias previstas no artigo 98, incisos V e VI, do Código Penal Militar – perda da função pública e inabilitação para o exercício de função pública, “tendo em vista que o acusado ocupa cargo efetivo decorrente de concurso público, fora do Exército Brasileiro”.

Ao analisar o recurso, o ministro relator do processo Péricles Aurélio de Queiroz negou o pedido. Queiroz lembrou que o cargo atualmente ocupado pelo réu é de natureza civil e que o ingresso nos quadros da administração pública federal “ocorreu em data posterior à prática delitiva”.

O magistrado fundamentou a negativa citando jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça segundo a qual “a pena de perdimento (da função pública) deve ser restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento do delito”.

Vantagem indevida

Em seu recurso, a defesa sustentou a tese de atipicidade da conduta, tendo em vista que a acusação não descreveu todas as elementares do crime de concussão, em especial o núcleo verbal do tipo do artigo 305 do Código de Conduta Militar, “exigir vantagem indevida, pois inexistiria qualquer alusão a ameaça, constrangimento ou imposição”.

Ao apreciar esse pedido específico, o ministro relator afirmou “não restar dúvida de que a denúncia trata de um fato típico, pois o militar deixou claro seu objetivo de receber vantagem indevida para influir no resultado de vultoso contrato de aquisição de dezenas de ônibus pelo Exército Brasileiro“.

Segundo o ministro, “após a negativa da empresa em concordar com a manobra ilegal, o oficial comunicou ao preposto que havia encontrado um erro na proposta”. Apesar de a companhia ter negado a ocorrência de qualquer equívoco na documentação, a empresa permaneceu com o status de “recusada” no sistema de licitações, durante dez minutos.

Diante desses fatos, o relator concluiu “ter ficado claro o intuito de incutir no preposto o receio de ver prejudicada a empresa que representava, pelo não pagamento da vantagem indevida solicitada”.

“Diante do risco de uma possível desclassificação, o militar dirigiu-se à vítima de forma ameaçadora e capaz de configurar o tipo penal em questão.”

O ministro relator declarou que as provas colhidas no transcurso da ação penal comprovam a prática delitiva. Ressaltou, por exemplo, que à época em que ocorreram os encontros, entre os meses de setembro e outubro de 2012, sequer havia se iniciado o procedimento licitatório, o que também denota “a conduta do acusado de buscar um licitante específico para, como expressamente afirmou, praticar um ato negocial”.

“Isoladamente considerados é possível afirmar que tais encontros entre o acusado e a testemunha não configuram prova direta da prática criminosa. Contudo, além de serem claramente violadores dos princípios que orientam uma administração pública proba, nos termos do artigo 37 da Constituição Federal e da Lei 8.429/92, estão alinhados com outros elementos de convicção que, em seu conjunto autorizam a formação do juízo condenatório”, destacou o ministro.

Péricles Aurélio de Queiroz concluiu que, embora o acusado não fosse o pregoeiro da licitação, “exercia total influência sobre o tenente designado para tais funções”.

Segundo a ação, “a pretexto de auxiliar o pregoeiro, o oficial influiu diretamente em todas as fases da licitação, desde a confecção do edital até a habilitação do licitante proponente do lance vencedor”.

O relator decidiu acatar os argumentos da defesa para diminuir a pena final imposta pela primeira instância.

Entre as razões para a decisão, o magistrado destacou “não ser possível aplicar a agravante genérica do artigo 70, inciso II, alínea ‘G’, do Código Penal Militar, que prevê a majoração da pena-base em um quinto pelo fato de à época o acusado exercer as funções de chefe da Seção de Licitação, sendo sua conduta juridicamente incompatível com os deveres inerentes ao cargo”.

“O fato de o apelante exercer cargo ou função é elementar do tipo do crime de concussão, motivo pelo qual não há como se majorar a pena em decorrência de tal fato, seja a título de circunstância judicial, seja em decorrência da aplicação da agravante genérica do artigo 70, inciso II, alínea ‘G’, do Código Penal Militar”, declarou o ministro Péricles, que fixou a pena definitiva em três anos de reclusão.

Defesa

Em nota, os advogados de defesa do ex-capitão da Intendência do Exército informaram que vão recorrer ao próprio Superior Tribunal Militar e ao Supremo. O ex-militar é defendido pelos advogados João Antônio S. Fonseca e Marcio Gesteira Palma.

“A decisão do Superior Tribunal Militar não é definitiva e será impugnada por recursos à própria Corte e ao Supremo Tribunal Federal”, escreveram.

“O Tribunal (Militar) conferiu valor excessivo à palavra de um único depoente, desconsiderando a de outras testemunhas que não corroboravam a solitária versão e ainda deixou de conceder ao ex-militar a oportunidade de, ao final da instrução, ser interrogado esclarecendo a narrativa formulada contra si, dando causa a nulidade.”

“O acusado é sempre o último a falar, também no Processo Penal Militar. A questão já foi pacificada pelo STF que, por meio de seu Tribunal Pleno, nos autos do HC n. 127.900, fixou entendimento de que o processo penal militar deve respeitar as alterações promovidas pela Lei 11.719/2008, adequando-se ao sistema acusatório democrático e aos preceitos constitucionais, assegurando que o interrogatório seja o último ato do processo, medidas que foram desrespeitadas no caso.”


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