O Ministério da Saúde incinerou em 2024 cerca de 6,4 milhões de doses de vacinas da Covid-19 que perderam a validade. Os lotes descartados são avaliados em R$ 227 milhões.
Os imunizantes foram fabricados pela Janssen e usam a tecnologia de vetor viral. Esse tipo de vacina perdeu força no SUS (Sistema Único de Saúde) desde o fim de 2022, quando a Saúde passou a priorizar os imunizantes de RNA mensageiro, como da Pfizer e Moderna.
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Em nota, o ministério afirma que realizou "uma série de ações estratégicas com o compromisso de minimizar as perdas de estoques de insumos".
"Apenas em 2023, o Ministério da Saúde evitou o desperdício de R$ 251,2 milhões em vacinas. O valor equivale a mais de 12,3 milhões de doses", afirma a Saúde.
Essas doses descartadas estavam no estoque desde dezembro de 2021. Venceram entre setembro e outubro de 2023 —esses imunizantes têm 2 anos de validade.
No total, a Saúde recebeu 41 milhões de doses da vacina da Janssen, sendo que 38 milhões foram compradas com o laboratório, e 3 milhões, doadas pelos Estados Unidos.
Como a Folha revelou, a Saúde já havia perdido cerca de R$ 2 bilhões em vacinas da Covid, de diversos fabricantes, até o começo de 2023. Estes imunizantes perderam validade principalmente entre o fim de 2022 e o começo de 2023.
Os dados consideram apenas as vacinas que estavam no estoque da Saúde e perderam a validade antes da entrega aos estados e municípios. A equipe de Nísia atribui a responsabilidade destas perdas ao governo Jair Bolsonaro (PL).
As informações sobre o estoque da Saúde foram colocadas sob sigilo no governo Michel Temer (MDB) e mantidas desta forma por Bolsonaro. Em 2023, o governo Lula (PT) passou a liberar a relação de itens armazenados ou perdidos por meio da Lei de Acesso à Informação.
O ministério entregou às secretarias de Saúde do país 643 milhões de doses de imunizantes da Covid-19 desde o começo de 2021. Destas, 34,5 milhões são da Janssen.
Informações apresentadas em maio, após pedido da Folha, mostram que a Saúde descartou produtos avaliados em cerca de R$ 314 milhões em 2024. O valor inclui as vacinas da Janssen. Por regras da legislação sanitária, produtos vencidos ou que são reprovados em inspeção precisam ser incinerados
Depois deste imunizante, os lotes incinerados de maior valor são de imunoglobulina anti-hepatite B e da vacina meningocócica, contra a meningite, avaliados em cerca de R$ 16 milhões cada.
No estoque central do ministério, localizado em Guarulhos, ainda estão armazenados cerca de R$ 200 milhões em produtos já vencidos e que devem ser incinerados. Os lotes mais caros (cerca de R$ 120 milhões) são roupas de proteção doadas ao Brasil durante a pandemia e que se tornaram um problema para a gestão atual, pois o descarte é caro e causa dano ambiental.
Até novembro de 2023, a Saúde gastou R$ 26 milhões apenas para armazenar milhares de toneladas destas roupas. Parte deste material foi doado para cooperativas de reciclagem.
A atual gestão considera que herdou de Bolsonaro um estoque desorganizado e repleto de produtos com validade curta ou já vencidos. Hoje a pasta armazena milhares de produtos avaliados em R$ 4,8 bilhões. Uma empresa privada administra este estoque.
Os dados sobre produtos da Saúde são alvos de fiscalizações do TCU (Tribunal de Contas da União) e da CGU (Controladoria-Geral da União). A Saúde criou, em junho de 2023, um comitê para acompanhar o estoque.
O ministério planeja comprar 70 milhões de doses da vacina da Covid-19 em 2024. A pasta, porém, atrasou a compra emergencial de uma parcela de 12 milhões destes imunizantes.
O plano era receber em março as primeiras vacinas atualizadas para a Covid, mas as doses da fabricante Moderna começaram a ser entregues em maio.
O atraso tornou o governo Lula (PT) alvo de críticas que extrapolam o campo da política e vindas de grupos como o centrão, que cobiça o controle da pasta. Integrantes da comunidade científica, profissionais de saúde, entre outros grupos, lançaram um abaixo-assinado cobrando do Ministério da Saúde a entrega das vacinas preparadas para novas variantes e mais medidas para fortalecer o combate à doença.
O ministério ainda não abriu a disputa pelo restante das doses que pretende comprar neste ano. Em nota, a pasta disse que o processo licitatório está em andamento e que não faltará doses para a população.
"Neste ano, conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), a vacinação periódica (dose de reforço anual ou semestral, de acordo com cada público) deve ser ofertada ao grupo de maior risco e vulnerabilidade, como gestantes e puérperas, trabalhadores da saúde, imunocomprometidos e idosos com 60 anos ou mais", disse a pasta.
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