"Nossa posição é validar os cinco acordos feitos com autoridades", diz vice-presidente da Braskem

Publicado em 17/12/2023, às 16h30
Foto: Reprodução/TV Pajuçara
Foto: Reprodução/TV Pajuçara

Por Alexa Salomão/FolhaPress

O colapso da mina 18 em Maceió, capital de Alagoas, não chegou a ser uma surpresa para a Braskem. Os primeiros laudos, ainda em 2019, atestavam que aquela área era instável, afirma Marcelo Arantes, vice-presidente Global de Pessoas e Comunicação da empresa.

"Por isso tinha zero pessoas lá quando aconteceu", afirma.

O que a Braskem não esperava era que o novo colapso colocasse em risco os acordos já firmados. Suas indenizações passaram a ser disputadas pelos dois grupos políticos de Alagoas. De um lado está o senador Renan Calheiros (MDB-AL), aliado do governador Paulo Dantas (MDB). Do outro, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL) e o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL).

Na semana que passou, o Senado instalou a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para apurar o afundamento de solo, e o governador de Alagoas decidiu questionar no STF (Supremo Tribunal Federal) cláusulas dos documentos que a companhia assinou com autoridades públicas.

"Nossa posição é validar os cinco acordos", disse o executivo à Folha. Leia a seguir trechos da entrevista.  

Folha - Por que a Braskem não se declara responsável pelo desastre?

Marcelo Arantes - Primeiramente, quando CPRM [Serviço Geológico do Brasil] emitiu o relatório, em maio de 2019, apontou três hipóteses para a situação. A questão do solo, da infiltração da água e de extração de sal-gema da Braskem —e ela contava que a principal causa era a Braskem.

Desde o marco zero, independentemente do grau de responsabilidade, a Braskem tomou a dianteira para cuidar da segurança das pessoas. A gente contratou cinco institutos, nacionais e internacionais, para diagnosticar e começar as ações de remediação.

Folha - Mas não foi essa a pergunta. A questão é que vocês não se dizem responsáveis até hoje.

Marcelo Arantes - O que nós aprendemos ao longo do tempo é que a geologia é uma coisa complexa, e sempre foi dito que nunca acontece um fenômeno assim por uma situação única. A gente usa como base o relatório que traz essas três hipóteses —terreno, água e extração. Não há grau de responsabilização ou grau de participação.

Folha - É verdade que não indenizaram as pessoas até hoje?

Marcelo Arantes - É um excelente ponto. Em novembro de 2019, chegou o primeiro relatório dos institutos que contratamos, do alemão IFG. Ele dizia ser importante criar uma área de resguardo e realocar as pessoas. Conversamos com a Defesa Civil e começamos a realocação.

Vou dar os dados de hoje. Foram cerca de 14,5 mil imóveis e 40 mil pessoas realocadas —e vou explicar a diferença entre os 40 mil e os 60 mil que escutam na mídia—, das quais 99,8% receberam uma proposta, 99% já aceitaram e 93,7% já receberam, incluindo pessoas e comerciantes.

Você não perguntou, mas me permita explicar a questão do valor pago pelo imóvel.

Se eu tenho de ser realocado de um imóvel, isso já reduz o valor, então para evitar isso, adotamos a metodologia do Ibape (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia). Ela diz para pegar um bairro de referência de mesmo padrão, e dar condição para a pessoa compre um imóvel similar. Usamos a valorização do bairro padrão, não a do imóvel afetado.

Na encosta do Mutange, uma área de invasão, os imóveis tinham valores baixos, entre R$ 25 mil e R$ 35 mil. A Braskem adotou o valor da proposta mínima, R$ 85 mil, para que a pessoa pudesse ao menos comprar um Minha Casa, Minha Vida.

Folha - Mas isso é indenização ou compra de imóveis? Muitos que acompanham o caso interpretam que, como ficam com a terra, estão comprando 20% de Maceió.

Marcelo Arantes - É indenização. Fizemos um diagnóstico social por família, em cada residência, para saber qual era o núcleo familiar, a condição daquela habitação e se gerava ou não renda. Aí a pessoa era convidada a fazer parte, de forma voluntária, do programa de compensação financeira e realocação.

No caso dos comerciantes, avaliamos o negócio, o lucro e se eles gostariam de continuar ou terminar o comércio. Se quisesse terminar, a gente pagava o encerramento, indenizava o imóvel e cobria o lucro cessante. Se ele quisesse continuar, fechava aquele ponto, abria em outra região, e a Braskem arcava com o custo de transferência.

Eu não fico com os imóveis. Já demolimos cerca de 40%, e não posso construir naquela região. Está no acordo do MPF. Mas, sim, ficamos com a terra e, no mesmo acordo, essa área não pode ter edificação. Quando, em algum momento do futuro, essa área ficar completamente estável, ela será levada a audiências públicas, e seu destino definido no plano diretor.

Mas de onde veio a diferença de 40 mil para 60 mil? Os 60 mil são uma média estatística em relação ao número de imóveis. Eu tenho registrado o número das pessoas, casa a casa. O dado da Braskem é preciso.

Folha - Como você baixa essa conta no balanço da empresa?

Marcelo Arantes - Foram lançados R$ 14,4 bilhões, dos quais R$ 4,4 bilhões foram indenizações a pessoas e comerciantes. Entra como despesa, não como patrimônio.

Folha - Dos R$ 4 bilhões, quanto é compra de imóveis e quanto é indenização por danos morais?

Marcelo Arantes -Precisaria ver o número certo. Não tenho aqui.

Folha - Tem como saber qual foi o resultado da mina de Maceió e se o ganho foi superior, inferior ou igual ao custo que estão tendo agora?

Marcelo Arantes - Não temos como responder essa pergunta. O número não é publicado em balanço. [A título de comparação, a reportagem levantou que o valor de mercado da Braskem na sexta-feira (15) era da ordem de R$ 13,7 bilhões, menos que o custo total das indenizações].

Folha - Dizem que ainda há um grande número de pessoas afetadas que não foram atendidas. Quantos faltam?

Marcelo Arantes - É importante colocar que o MPF definiu qual era a área e as pessoas a serem realocadas. Todas, 100%, foram procuradas pela Braskem.

Folha - Recentemente, ocorreu a tentativa de incluir novas áreas para atendimento. Existe essa perspectiva?

Marcelo Arantes - A definição de área de risco é feita pela Defesa Civil. Ela não fez nenhuma alteração no mapa para incluir área de risco. Incluiu área de monitoramento, onde não há necessidade de realocar pessoas.

Folha - Por que o solo se tornou instável agora?

Marcelo Arantes - O primeiro relatório do IFG mostrava que a cavidade 18, em algum momento, poderia se movimentar, por isso tinha zero pessoas lá quando aconteceu. Temos na área os mais modernos equipamentos de monitoramento do solo, com GPS, e eles começaram a apontar movimento na cavidade 18 no início de novembro. Temos 35 cavidades, e só ocorreu lá.

Folha - O acordo fechado com a Prefeitura causou polêmica. Ele teria quitado todas as pendências, inclusive ambientais. O governador quer questionar cláusulas de todos no STF [Supremo Tribunal Federal]. Como a empresa vê isso?

Marcelo Arantes - Ao longo desses quatro anos e meio, fechamos cinco acordos com autoridades —Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Defensoria Pública da União e do Estado, Ministério do Trabalho. Todos foram fruto de ampla discussão e baseados em dados técnicos e jurídicos e homologados na Justiça.

Sobre esta ação do estado, a Braskem não foi notificada e se manifestará nos autos do processo.

O acordo específico com a prefeitura, de julho, prevê R$ 1,7 bilhão para cobrir danos a bens públicos que não foram contemplados, como praças, hospitais e perda de arrecadação. O prefeito anterior deu isenção de IPTU aos moradores da área.

Como sou empresa de capital aberto, e tenho de ter certeza do que estou pagando, equipes da prefeitura e da Braskem avaliaram com consultores se existia alguma coisa devida, e foi comprovado dano adicional ao município.

Corre a informação no mercado de que o acordo com a prefeitura deu quitação geral. Não. Dá quitação aos temas previstos nele. A prefeitura não pode voltar a requerer IPTU. O acordo socioambiental, baseado num diagnóstico de 2.000 páginas, não é com a prefeitura. É com o MPF.

Folha - Uma CPI foi instalada, e pode levar a revisão dos acordos e demandar outros. Qual a avaliação da empresa?

Marcelo Arantes - Nossa posição é validar os cinco acordos. A CPI deve funcionar a partir de fevereiro. A Braskem vai explicar cada acordo. Sempre contribuímos com as autoridades. Vamos estar disponíveis, seja com informações, esclarecimentos ou estando presentes.

Folha - Os manuais de gestão dizem que em situações mais sensíveis o presidente deve ser o porta-voz para mostrar que a empresa está comprometida com o problema. Por que na Braskem é um vice-presidente?

Marcelo Arantes - Estou há 13 anos e meio na Braskem e sou porta-voz desse tema desde o primeiro dia. Posso dizer que todos os presidentes e integrantes do conselho de administração que passaram na empresa nesses anos deram todo e qualquer apoio à questão. É um tema de diálogo interno nosso diário, e R$ 14,4 bilhões reforçam nosso compromisso.

MARCELO ARANTES, 55 - Vice-presidente Global de Comunicação e Pessoas da Braskem desde 2010. Natural de Belo Horizonte (MG), é formado em administração de empresas pela Faculdade de Ciências Gerenciais (UNA), e tem MBA Executivo pela Fundação Dom Cabral e participação no Global Leadership Program da Wharton Business School da University of Pennsylvania (EUA). Em 35 anos de carreira, exerceu diversos cargos ligados a Recursos Humanos em empresas como Fiat, Asea Brown Boveri, Unilever, Reckitt e Intelig Telecomunicações.

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