Pela primeira vez, uma mulher conseguiu se livrar do HIV após um transplante de células-tronco. Uma paciente de Nova York, cujo caso foi publicado nesta quinta-feira na revista Cell, é a quarta pessoa que conseguiu a remissão da infecção pelo vírus da AIDS após um transplante muito específico: células-tronco que, além de compatíveis, têm um mutação que impede o vírus de entrar nas células.
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— Atualmente ela está clinicamente saudável. Ele está livre de câncer e HIV. E chamamos de cura possível, em vez de cura definitiva, basicamente esperando um período de acompanhamento mais longo — disse Yvonne Bryson, especialista da Divisão de Doenças Infecciosas do Departamento de Pediatria da Universidade da Califórnia (Los Angeles) e autora do estudo.
Em conferência de imprensa, Yvonne indicou que, embora este procedimento não seja aplicável a todas as pessoas com VIH, os resultados são "boas notícias" que abrem portas para, no futuro, desenvolver novas técnicas para dimensionar esta estratégia terapêutica.
Cerca de 38 milhões de pessoas no mundo vivem com HIV. A infecção pelo vírus da AIDS atualmente é incurável: não há vacinas preventivas ou medicamentos que a eliminem para sempre. Na grande maioria dos casos, deve-se contentar em controlá-la por meio de tratamentos antirretrovirais ao longo da vida que reduzam ao mínimo a carga viral. Mas nunca é totalmente eliminado porque o HIV costuma se esconder em uma espécie de estado dormente nos reservatórios virais e, se a medicação for interrompida, ele acorda e volta a crescer.
Estes quatro casos relatados de remissão do HIV são excepcionais, produto de uma intervenção médica impossível de transferir para a população em geral com HIV, explicam os especialistas. O transplante de células-tronco é uma técnica muito agressiva (a mortalidade pode chegar a 40%) e se destina a pacientes com tumores hematológicos que não respondem a outras terapias. Devido aos seus riscos, não é uma intervenção que possa ser generalizada a todas as pessoas com HIV: é antiético submeter os pacientes a esses tratamentos agressivos para se livrar do vírus quando existem antirretrovirais eficazes que controlam a infecção.
Os quatro pacientes carregavam um tumor no sangue e não tinham outra alternativa terapêutica para tratá-lo: tiveram que fazer um transplante de células-tronco. A terapia consiste em esvaziar a medula óssea do paciente, onde se encontram as células-tronco formadoras do sangue, para eliminar o tumor e repovoá-lo com as extraídas de um doador compatível.
Nestes casos particulares, para matar dois coelhos com uma cajadada — câncer e HIV —, buscou-se que os doadores, além de compatíveis, tivessem uma mutação específica no gene CCR5 (CCR5Δ32), que impede a penetração do vírus nas células. Se funcionar, as células-tronco do doador acabam substituindo as do paciente, levando a um encolhimento do tumor no sangue do paciente e conferindo resistência contra o HIV.
A paciente de Nova York se junta à lista desses casos especiais que chegaram à literatura científica na última década. A primeira foi em 2011 Timothy Brown, o paciente de Berlim que sofria de leucemia mieloide aguda: o homem foi submetido a um transplante de um doador que tinha a mutação no gene CCR5, necessário para a entrada do vírus nas células, e tanto o tumor quanto o HIV desapareceram de seu corpo. Brown morreu em 2019, mas não do vírus, mas da leucemia.
Seu caso abriu uma porta para derrotar o HIV. Uma esperança que se consolidou com Adam Castillejo , o paciente de Londres, que sofria de linfoma de Hodgkin: ele também foi submetido a um transplante de doador compatível e com a mutação CCR5Δ32 e tanto o vírus quanto o câncer regrediram. O terceiro caso publicado há apenas algumas semanas foi o do paciente de Düsseldorf, um homem de 53 anos que sofria de leucemia: após o transplante de células-tronco com a mesma mutação, o vírus desapareceu e as células tumorais também.
Javier Martínez-Picado, pesquisador da IrsiCaixa e colíder do consórcio internacional IciStem, que acaba de publicar a história do paciente de Düsseldorf, saúda a publicação do caso de Nova York porque reforça duas ideias:
— A cura do HIV é possível e o caso do paciente de Berlim [o primeiro] não era anedótico. Já são quatro casos e são consistentes em termos metodológicos e de observação. Esta é uma confirmação de que a intervenção funciona e a cura é possível — disse.
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