Lavar as mãos. Passar álcool gel. Usar máscaras em público. Evitar aglomerações. Há meses, a rotina de boa parte do mundo está sendo afetada pela pandemia causada pelo Sars-Cov-2, o novo coronavírus. No dia 12 de outubro, um estudo sobre a resistência do vírus trouxe ainda mais preocupação: ele poderia sobreviver por até 28 dias em superfícies como dinheiro e telefones celulares.
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Mas, o que isso significa? É preciso se preocupar?
A resposta curta e simples é: não há motivo para alarde. Os próprios autores do estudo, realizado na Austrália, relatam que não haveria carga viral suficiente para causar infecção nas amostras que sobreviveram aos 28 dias. Ou seja: embora o vírus tenha sido detectado, a quantidade não seria bastante para contaminação.
“Esse não é o primeiro estudo que mostra a capacidade deste vírus de se manter em superfícies”, diz o Dr. José Luiz Módena, professor do Instituto de Biologia da Unicamp. Módena, que não faz parte da pesquisa australiana, é especialista em virologia e, desde o início da pandemia, coordena iniciativas de diagnóstico e sequenciamento de variantes virais do Covid-19.
O mais importante é que as pesquisas sobre propagação da doença indicam que objetos como dinheiro e telefone não são a principal via de contágio.
“Os estudos epidemiológicos têm mostrado que a principal via de transmissão se dá pela inalação da partícula viral – ou seja, quando a pessoa tem contato com as gotículas do vírus via boca ou nariz. Isso acontece especialmente em ambientes fechados, com ar condicionado e aglomeração de pessoas”, diz o Dr. Módena.
Entendendo o estudo australiano
No estudo, realizado pelo CSIRO, a Agência Nacional de Pesquisa da Austrália, gotículas do vírus SARS-CoV-2 foram colocadas em superfícies como papel moeda, aço inoxidável, vidro, vinil e tecidos de algodão. Para cada superfície, foram feitos testes em três diferentes temperaturas: 20, 30 e 40 graus Celsius, com a umidade relativa mantida em 50% em todos os casos.
De tempos em tempos, amostras eram coletadas para checar se alguma partícula infecciosa se mantinha ativa.
Os resultados que ganharam manchete dizem respeito às superfícies não porosas mantidas a 20 graus. Aço, vidro e papel moeda mostraram traços de vírus potencialmente infeccioso até 28 dias depois do início dos testes. No algodão, o tempo máximo foi 14 dias.
A 30 graus, o vírus foi detectado por até sete dias nas superfícies de aço, vidro e cédulas de dinheiro, mas por apenas 3 dias em algodão. Já a 40 graus, partículas infecciosas duraram menos de 16 horas no algodão e 24 horas em cédulas e aço inoxidável.
A conclusão
Embora os resultados indiquem uma resistência do vírus, os próprios autores ressaltam que é necessário mais do que uma única partícula para causar infecção.
A chamada dose infecciosa varia conforme cada tipo de vírus, mas costuma ser alta. A dose do SARS-CoV-2 ainda não foi cravada, mas a estimativa é que seja algo em torno de 300 partículas. No caso, o material detectado após 28 dias não seria suficiente para causar infecção.
Outro ponto importante para se ressaltar é que a própria estrutura do vírus causador da Covid-19 precisa de umidade para se manter ativa.
“Este é um vírus que chamamos de envelope: ele possui uma estrutura lipídica ao seu redor – uma camada de gordura que vem das células do hospedeiro e na qual estão embebidas proteínas virais de superfície. A manutenção dessa estrutura gordurosa é essencial para ele causar infecção”, diz Dr. Módena, da Unicamp.
Em outras palavras, além da transmissão por vias respiratórias, o contato direto tem muito mais chances de ser infeccioso – por exemplo, quando alguém toca no vírus e coloca a mão na boca ou nariz em um curto espaço de tempo.
Ou, em uma possibilidade extrema, se alguém infectado deixar uma quantidade grande de catarro em cima da mesa, por exemplo, o vírus tem muito mais chance de sobreviver nessa superfície por mais tempo.
“Resumindo, o contágio por objetos até pode acontecer, mas o papel disso na transmissão do vírus é muito marginal”, diz o Dr. Módena. “A chance já não é tão grande, mas lavar as mãos e passar álcool gel praticamente zera a possibilidade de pegar Covid por contato”.
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