Redação
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Há alguns anos, um grupo de cientistas forenses apresentou uma reconstrução — baseada nas pouquíssimas descrições disponíveis — da possível aparência de Jesus Cristo, e o rosto é bem diferente do homem de pele alva, madeixas (muitas vezes) louras e longas e com olhos claros que estamos acostumados a ver.
Mas, se o Nazareno era moreno e provavelmente tinha os cabelos curtos e cacheados, ou seja, se ele — obviamente — tinha a aparência mais condizente com a dos homens de sua etnia, como é que ele foi virar um homem branco e com traços europeus?
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De acordo com Richard Stockton, do portal All That Is Interesting, a atual imagem de Jesus foi “construída” após 2 mil anos de veneração mundo afora. Segundo explicou, conforme seus seguidores foram se espalhando ao longo da História — e pelo mundo —, pessoas das mais diversas culturas foram criando representações de Cristo baseadas em suas próprias imagens (e imaginação!).
A Bíblia, por exemplo, não contém nenhuma descrição detalhada sobre a aparência de Jesus e, até onde sabe, as primeiras figuras dele só começaram a ser criadas por volta do século 2 — ou seja, as representações mais antigas surgiram anos e anos depois da morte de Cristo e por obra de pessoas que jamais viram o Nazareno na frente.
Por certo, a representação mais antiga de Jesus de que se tem notícia foi uma espécie de “pichação” — que você pode ver acima — na qual um romano tira um sarrinho de um seguidor do cristianismo. Em realidade, as imagens demoraram tanto para ser criadas porque os primeiros cristãos eram fortemente perseguidos — e continuaram a ser até por volta do século 4.
As representações com conotações mais positivas começaram a aparecer em meados do século 3, e uma das primeiras a mostrar Cristo como o “bom pastor” foi encontrada nas Catacumbas de São Calisto, em Roma. Nessa imagem, Jesus é retratado com pele morena, cabelos curtos e sem barba — o que seria bastante incomum para os homens da Judeia, mas usual entre os romanos da época. Veja:
Segundo Richard, a figura se encontra em uma tumba que, provavelmente, pertenceu a uma família romana convertida ao cristianismo, e, mais tarde, o local se transformou em ponto de encontro para a prática secreta dessa religião. O mais interessante, no entanto, é que, embora a representação de Jesus tenha sido criada, a verdadeira aparência dele certamente era irrelevante para as pessoas que se reuniam ali.
Cristo retratado com vestimentas militares
Outra representação de Cristo — na qual ele aparece sem a sua tradicional barba e com os cabelos curtinhos — foi descoberta recentemente na Espanha. Ela consiste em uma gravura feita sobre um prato de vidro do início do século 4, e a aparência do messias lembra bastante a dos homens ibéricos da época em que ela foi produzida.
Os cristãos só puderam praticar sua religião com certa liberdade a partir do século 4, com a conversão de Constantino. Aliás, com a aprovação do Imperador, e com o apoio da rainha — Santa Teresa, que era extremamente devota —, vários poderosos se converteram também. Com isso, não demorou até surgirem artistas mais que felizes em criar figuras e quadros de Jesus, e eles certamente soltaram a imaginação, como no fresco abaixo:
Descoberto na Catacumba de Marcelino e Pedro, em Roma, o desenho mostra Jesus sentado em um trono entre Pedro e Paulo. A pintura traz vários dos elementos que podemos encontrar nas imagens sacras atuais, como a auréola sobre a cabeça de Cristo e os dedos de sua mão direita em posição de bendição. Além disso, ele foi retratado usando a tradicional “toga” e com os cabelos longos e ondulantes e barba.
E, de acordo com Richard, esses elementos — o halo, a mão em bendição e a pele clara — se tornaram tão prevalentes nas igrejas romanas e bizantinas que a nova representação inclusive “pegou” entre os cristãos que viviam no Oriente Médio, que adotaram essa imagem de Jesus em vez de uma que tivesse um aspecto mais mediterrâneo.
Imagem de Jesus encontrada em uma antiga igreja no Egito
Em realidade, as imagens criadas na época de Constantino mudaram muito pouco de lá para cá e, segundo Richard, isso se deve à pressão exercida pelo conservadorismo religioso e ao desejo dos artistas de vender suas obras. Afinal, não é segredo que a Igreja sempre foi muito resistente às mudanças e, no passado, nem todo mundo tinha coragem de ir contra as regras e correr o risco de ser queimado na fogueira por conta de uma representação alternativa de Jesus.
O ator Haaz Sleiman, que retratou Cristo em um especial da National Geographic
Hoje em dia, em vez de quadros e frescos, Cristo costuma ser retratado em séries e filmes. E, apesar de as representações não serem mais tão rigorosas — e de algumas produções inclusive trazerem atores com aspecto mais “nazareno” —, Jesus continua sendo mostrado como um homem branco com feições mais europeias que palestinas.
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