Tabagismo envolve dependência química e emocional, dizem especialistas

Publicado em 12/09/2023, às 19h02
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Folhapress

"O cigarro é meu calmante, meu companheiro. Acho que toda pessoa que fuma tem isso", diz o adestrador de cães Fernando Lopes, 65, que começou a fumar aos 17 anos. Fumante há quase cinquenta anos, ele conta que conseguiu ficar longe do cigarro duas vezes: a primeira por um ano e oito meses, e a segunda por seis meses. Mas, durante esses períodos, quase todas as noites sonhava que estava fumando.

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"Sofri muito quando parei. Tive crise de ansiedade e tomei medicação receitada por um psiquiatra", afirma o adestrador, que usava adesivos de nicotina e andava segurando uma caneta para simular o cigarro. Apesar do esforço, Lopes voltou a fumar quando a mãe dele morreu. Ele pretende parar novamente, mas diz que tem uma relação emocional com o tabagismo. "Não é totalmente psicológico, eu tenho consciência que tem a dependência química, que é muito complexa."

João Paulo Lotufo, pneumologista e coordenador do projeto antitabágico do Hospital Universitário da USP (Universidade de São Paulo), explica que casos como o de Lopes são comuns porque o vício no cigarro não está apenas relacionado apenas à nicotina, que é uma substância altamente viciante, mas à dependência psicológica e comportamental.

"Você tem duas vezes mais ansiosos e depressivos entre os fumantes. O cigarro tem um poder de acalmar, o paciente usa como terapia, só que lesa o indivíduo. A nicotina é uma droga extremamente potente e legalizada", afirma o médico.

Lotufo desenvolve há 19 anos um tratamento multidisciplinar que envolve adesivos e gomas de mascar de nicotina. O uso desses produtos ajuda a reduzir a abstinência, que gera sintomas de ansiedade, irritabilidade, problemas para dormir, dor de cabeça, entre outros. Quando uma pessoa traga um cigarro, a nicotina age no cérebro em poucos segundos e estimula neurotransmissores responsáveis por sensações de prazer e de energia.

"O tratamento inicial é feito com adesivos e gomas de mascar para repor a substância em doses bem mais baixas que as do cigarro. É uma forma de enganar o cérebro do fumante", diz. Lotufo também orienta a se afastar de locais que vendam cigarro, de ambientes que tenham pessoas fumando e evitar gatilhos que dão vontade de fumar, como café e álcool. Os pacientes também são atendidos por psicólogos e participam de reuniões semanais em grupo durante um mês.

Depois disso, eles continuam indo às reuniões mensalmente para evitar recaídas. A jornalista Juliana Paiva, 43, precisou passar por um tratamento multidiciplinar, semelhante ao do HC, que envolveu consultas com nutricionista, endocrinologista, pneumologista, psiquiatra e psicólogo. Ela conseguiu parar de fumar há sete anos, mas confessa que não foi fácil. Paiva conta que teve crises de choro, problemas gastrointestinais e ficou dias sem conseguir dormir direito. "Eu tinha uma relação afetiva com o cigarro e até hoje sinto falta. Ainda sonho que estou fumando."

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