G1
A misofonia, síndrome que causa ataques de raiva nas pessoas, está ficando “cada vez mais comum” e pode atingir até 20% da população. É o que dizem especialistas ouvidas pelo g1 para explicar as características desta patologia que está se popularizando.
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O desconforto e irritação são causados por sons baixos e repetitivos, que geralmente não incomodam as pessoas. Hábitos comuns como mascar chiclete, respiração alta e até caminhar de salto alto podem se tornar gatilhos para crises de estresse em misofônicos.
A misofonia também pode ser conhecida como a Síndrome 4S – Síndrome da Sensibilidade Seletiva a Sons. O g1 conversou com a otorrinolaringologista e professora da USP, Tanit Ganz Sanchez; e com a fonoaudióloga e psicóloga Lisiane Holdefer para detalhar o assunto.
O que é misofonia? - “Misofonia é um desconforto com sons baixos e repetitivos, que não costuma incomodar a maioria das pessoas. Por exemplo, sons feitos com a boca (mastigar, mascar chiclete, estalar os lábios, passar a língua nos lábios, pigarrear), sons feitos com o nariz (assoar, respirar forte) e sons feitos com as mãos e os pés (batucar em mesa, rodar a chave, rodar o gelo no copo, andar de salto alto, arrastar chinelo)”, disse Tanit Ganz Sanchez.
O que a aversão aos sons pode causar? “Além do desconforto, a misofonia é caracterizada por uma crise de raiva muito grande e descontrolada, abrupta, que vem junto quando as pessoas ouvem esses sons. As pessoas não acham chato simplesmente, elas se irritam profundamente e rapidamente com pequenos barulhos. Elas têm total noção que o problema está com elas e não conseguem reagir diferente”, Tanit Ganz Sanchez.
É possível descrever a dor? - “É muito emocional, a parte física vem em ascensão do emocional, como se a pessoa estivesse em ameaça. No cérebro da pessoa, é como se aquele som fosse uma ameaça, seu corpo se prepara para fugir. A princípio são sons comuns, mas o cérebro interpreta de ameaça à vida, aí vem o calor, o coração acelerado, a sudorese. Geralmente a característica são de sons repetitivos”, disse Lisiane Holdefe.
Como é feito o diagnóstico? - “A gente não tem nenhum exame que diagnostica a misofonia. A gente tem exame referenciais. A gente tem exame que detecta o limiar de desconforto, o que seria um sinalizador. O diagnóstico é normalmente por esse diagnóstico diferencial e pela história e relato do paciente”, disse Lisiane Holdefe.
Misofonia é o mesmo que poluição sonora? - “Misofonia é muito diferente da ideia de poluição sonora. A misofonia é uma peculiaridade dentro dos incômodos com sons. É uma periferia do assunto de poluição sonora e sons altos. O misofônico pode ir à balada com o som alto e não se importa com isso. Mas, se tiver um som baixo e repetitivo, ele fica muito raivoso. Na poluição sonora, está tudo muito alto. Na misofonia, a causa do desconforto é um som baixinho e repetitivo”, explica Tanit Ganz Sanchez.
Quanto tempo dura? -“Pode ser que o paciente tenha a vida inteira. A gente vê já características na infância. O importante é que os pais, entendendo a misofonia, saibam lidar com sons gatilhos e os filhos. Tem gente que acha que são crianças ‘xiliquentas’, ‘mimizento’, quando na verdade ele está em um sofrimento real”, disse Lisiane Holdefe.
Como identificar em crianças? - “Expressões nítidas de raiva, tentam que você pare o som, saia da mesa, chore naquela situação de som gatilho ou a criança verbaliza, tampa os ouvidos, são sinalizadores que pode ter uma misofonia. Quando ela consegue dar nome ao sentimento, ela diz o que está incomodando”, Lisiane Holdefe.
Quais as consequências da misofonia?
Consequência familiar - “A primeira linha de problema é familiar. Como as pessoas da família, que moram na mesma casa, fazem barulhos com frequência, isso acaba causando muitas brigas na família. Como a misofonia é pouco conhecida, os familiares tendem a achar que é frescura, rotulam a pessoa como antissocial e problemático. A pessoa ganha o rótulo de paciente psiquiátrico”, Tanit Ganz Sanchez.
Repercussão profissional - “Outra repercussão é no trabalho e nos ambientes de estudo. Como no trabalho as pessoas também fazem as mesmas coisas (mastigar, respirar), existe uma inibição do misofônico de demonstrar que tem misofonia. Se ele demonstrar o acesso da raiva, ele pode criar problemas e até ser demitido. Existe mudança de comportamento por parte do misofônico e, em alguns casos, a pessoa se automutila, se machuca para não expor a raiva dela. Como as pessoas têm medo de ser rotuladas, muita gente não fala que tem misofonia”, Tanit Ganz Sanchez.
Dificuldade de concentração - “Outra repercussão é a dificuldade de se concentrar nos estudos ou trabalho por causa dos sons ao redor. Há também a dificuldade de dormir se tiver sons no ambiente. A dificuldade de concentração e sono são frequentes”, Tanit Ganz Sanchez.
Quais são os especialistas aptos para tratar misofonia? “Uma equipe multiprofissional: otorrinolaringologista, fonoaudiólogo e psicólogo como potenciais para tratar”, Lisiane Holdefe.
Lisiane também reforça: "Tem tratamento e, em alguns casos, o paciente pode ter cura da misofonia. O importante é buscar tratamento e uma alternativa, e saber que tem como viver melhor. Não é rápido, não é instantâneo, mas dá pra trazer qualidade de vida."
Existe tratamento? - Medicação - “Existem alguns medicamentos que podem diminuir a misofonia. Alguns medicamentos conseguem controlar as reações emocionais das pessoas e melhorar o comportamento delas. A misofonia continua existindo, mas o acesso de irritabilidade é menor” Tanit Ganz Sanchez.
Terapia - “Existe uma linha psicológica chamada TCC [Terapia Cognitivo-Comportamental], que ajuda qualquer problema que causa sofrimento. A TCC é consistente em bons resultados, mas ela demora e a pessoa precisa aderir” Tanit Ganz Sanchez.
Estimulação sonora - “A terceira linha de tratamento é a estimulação sonora. Sons baixos e estáveis. O misofônico se incomoda com sons baixos e repetitivos. Se eu coloco, um som baixo e estável, isso pode ajudar o paciente a não prestar a atenção em sons baixos e repetitivos. É como se fosse uma competição para saber qual som vai chegar no cérebro da pessoa com misofonia. A estimulação com som baixo e estável pode ajudar o cérebro a não perceber o som baixo e repetitivo” Tanit Ganz Sanchez.
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