Redação
“Na guerra entre Supremo Tribunal Federal e Congresso Nacional, a paz está distante”
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Texto de Walter Maierovitch:
“Faz tempo que deputados e senadores acusam o STF (Supremo Tribunal Federal) de usurpar funções legislativas.
Parlamentares inconformados armaram-se de projetos que tramitam sem freios pela Câmara, que representa o povo, e o Senado, de representantes das unidades federativas. Lidas as exposições de motivos dos projetos, fica claro o revanchismo, o espírito vingativo.
Para usar a expressão do burocrata romano Flávio Vegácio, ‘si vis pacem para bellum’ (se quer a paz, prepare-se para a guerra). Assim foi que deputados e senadores, pelos projetos legislativos e emendas constitucionais, prepararam-se para a guerra contra o STF, já em curso.
Quando a chamada pauta de costumes —erva canábica e aborto à frente— foi tirada dos empoeirados escaninhos do STF e levada a julgamento depois de anos de embromação, o reclamo parlamentar virou uma espécie de guerra santa, com santarrões conservadores, oportunistas e populistas.
A esses, juntaram-se bolsonaristas ressentidos de liminares, dadas em regime de urgência e monocraticamente, concedidas para interromper as ilegalidades e ilegitimidades de um capitão que, como presidente da República, atuava frequentemente fora das quatro linhas constitucionais.
Com o senador David Alcolumbre (UB-Amapá) na presidência da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), acendeu-se a luz verde para aval às aprovações de emendas e projetos, ainda que flagrantemente inconstitucionais, como a PEC (projeto de emenda constitucional) aprovada ontem.
Grande parte das PEC estão voltados a alterar o equilíbrio entre os Poderes, comprometendo-se a independência do STF, órgão de cúpula do Judiciário nacional.
Até sobre questões ‘interna corporis’ do STF, a CCJ ousou, ontem, imiscuir-se ao dar a sua aprovação em um átimo de tempo, sem discussões e aprofundamentos constitucionais.
Atenção! Toda a vez que uma aprovada PEC tromba com regras pétreas da Constituição, temos um tumor maligno a ser extirpado.
O diagnóstico, para que todos entendam, é a existência de uma inconstitucionalidade no corpo vivo da Constituição. Em outras simples palavras, uma inconstitucionalidade na Constituição.
Se o plenário do Senado mantiver a serenidade, não aprovará a PEC que passou ontem pela CCJ. A supracitada PEC prevê vedações atinentes às decisões monocráticas com liminares para suspensões de atos dos presidentes da República, Senado, Câmara e Congresso. Também de liminares monocráticas a estabelecer a suspensão de leis e atos normativos de interesse coletivo.
Ainda tem a impossibilidade de pedido individual de vista, que acontece quando um ministro julgador, diante de divergência entre votos, propõe a saída de pauta para melhor examinar os pontos de dissensos.
Resolução contra togas abusivas
Não há dúvida que os parlamentares irados buscaram pontos francos do STF e miraram em abusos ainda bem vivos na memória dos cidadãos.
Para não alongar o texto, duas lembranças: o ministro Luiz Fux agradou o bolso dos juízes, incluída a sua filha desembargadora não concursada, ao conceder liminar para imediato pagamento de um inconstitucional pacote de penduricalhos chamado ‘auxílio moradia’.
Dada a liminar e efetivada a ordem de pagamentos mensais, Fux colocou o processo na gaveta. Com esse ardil imoral, impediu, durante longo tempo, o exame da sua liminar pelos seus pares.
O ministro Gilmar Mendes deixou na gaveta, a cozinhar por anos em banho-maria, um pedido de reconhecimento da suspeição do então juiz Sergio Moro.
Referido pedido de suspeição por parcialidade de Moro saiu da gaveta de Gilmar e foi julgado quando vieram a furo as bombásticas gravações divulgadas pelo Intercept Brasil.
Gilmar reconheceu a falta de imparcialidade de Moro e os seus pares o seguiram na anulação do processo condenatório de Lula. Como se nota, Gilmar guardava processos para tirar da gaveta quando bem entendesse.
Essas questões de decisões monocráticas, com liminares e os de pedidos de vista para adiamentos atemporais de julgamentos, que maculavam a imagem do STF, foram resolvidas administrativamente, por resolução da ministra Rosa Weber, quando na presidência do STF.
Tratava-se de uma questão de autogoverno, da atribuição interna do STF. E a resolução da ministra Weber já integra o Regimento Interno do STF, ou seja, tem força de lei.
A propósito, os prazos da resolução são muito mais curtos do que os previstos na PEC aprovada ontem pela CCJ.
Mais ainda, os ministros do STF, diante do que acontece nas Cortes constitucionais europeias, perceberam o abuso.
Nas Cortes constitucionais europeias os casos urgentes e apreciados liminarmente são colocados a reexame em prazo de 24 horas. Obedece-se ao princípio da colegialidade.
Os poderes do Estado são independentes e harmônicos. O jus-filósofo Montesquieu, que desenvolveu a tripartição fundamental entre eles, tinha por meta não deixar que um poder tivesse mais força do que o outro.
Os atritos e tentativas de submissões e intromissões não são ideais numa democracia republicana. Por isso, os presidentes devem buscar entendimentos e os órgãos de poder, que no caso são os senadores, deputados e ministros, evitar revanches.”
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