Redação
“… Dias atrás, o presidente da França, o megaprotecionista Emmanuel Macron, visitou o Brasil e esteve em Belém do Pará, que sediará em 2025 a 30ª Conferência das Nações Unidas Sobre o Clima, a COP-30. Para Macron, a Amazônia por si só não representa novidade. Mesmo porque, a 840 quilômetros em linha reta de Belém — distância relativamente curta para os padrões amazônicos — está Caiena, a capital da Guiana Francesa.
Não se trata de uma colônia, mas de um departamento ultramarino francês em plena América do Sul e único território do continente sob domínio de um país europeu. Se quisesse apenas visitar a floresta, portanto, Macron não precisava ter saído do território que governa. Aliás, pela agenda mais badalada da viagem, a impressão que ficou foi a de que Macron não tinha muito o que fazer numa mata que, para ele, não representa qualquer novidade.
A sensação, no final das contas, foi a de que, por trás do discurso preservacionista de Macron, havia uma agenda mais discreta, relacionada com a exploração dos recursos naturais estratégicos do Brasil. E essa impressão foi confirmada pelos fatos. O mais importante dos acordos assinados durante a visita do francês prevê investimentos para exploração e processamento de urânio no Brasil — cujas jazidas, em boa parte, encontram-se na Amazônia.
A razão para esse interesse é explicável: o urânio processado é essencial para a geração da energia nuclear e mais de 70% da eletricidade consumida pelos franceses é proveniente dessa fonte. Como o Niger, país africano que é o principal fornecedor do mineral para a França, atravessa um momento de instabilidade política, Macron viu no Brasil a solução de abastecimento de um produto que, para seu país, é de primeiríssima necessidade.
O acordo assinado pelos dois presidentes demonstra a forma como a França, assim como outros países europeus que ainda guardam um ranço da mentalidade colonialista do passado, encara a exploração dos recursos brasileiros. Quando se trata de algo que os beneficia, eles não veem o menor problema em explorar os recursos naturais a torto e a direito.
Quando o principal beneficiário é o próprio Brasil, no entanto, suas trombetas tocam como se anunciassem o apocalipse e suas vozes se levantam para impor exigências descabidas. Foi o que fez a França, apenas para citar um caso recente, que se valeu de desculpas ambientalistas fora de propósito para melar o acordo do Mercosul com a União Europeia, que abriria para os produtos agrícolas brasileiros as portas do bilionário mercado do Velho Continente.
Não se trata, aqui, de colocar o Brasil como uma vítima indefesa de grandes potências, mas de reconhecer que a atual postura de sua diplomacia não tem contribuído para reforçar a posição do país perante os interlocutores com quem precisa negociar questões sensíveis, mas fundamentais, como a política em relação à Amazônia. Os europeus precisam deixar de usar as acusações exageradas como arma para tentar impedir a exploração, em benefício do Brasil, dos recursos da floresta.
Precisa ficar claro para o mundo inteiro que as dimensões da região permitem que a preservação seja combinada com a exploração racional de seus recursos. Era isso, por sinal, que o Conde dos Arcos já propunha em 1796: as árvores que caírem com resultado da exploração precisam ser repostas. O efeito prático dessa postura talvez não seja sentido de imediato, mas será fundamental para que a floresta continue existindo com toda sua pujança no futuro.
Outro ponto essencial diz respeito às populações que vivem na Amazônia e que precisam da ação do Estado para manter sua integridade. O caso mais grave é o dos indígenas, especialmente os yanomami. Enquanto Macron condecorava o cacique Raoni no Pará, os yanomami de Roraima continuavam padecendo sob o impacto da exploração predatória e criminosa que a ausência histórica do Estado estimulou que se fizesse em suas terras. A situação do povo yanomami, até prova em contrário, continua tão grave no governo de Lula quanto estava no governo Bolsonaro e qualquer percepção diferente desta não passará de mera propaganda.
Uma pesquisa divulgada pela Fundação Oswaldo Cruz na semana passada mostrou que exames realizados nos cabelos de 287 yanomamis indicaram que 84% deles tinham seus organismos contaminados por mercúrio — substância tóxica, de uso proibido, mas que é livremente empregado para apuração do ouro nos garimpos ilegais. E mais: 11% desses 287 indivíduos tinham níveis de contaminação elevadíssimos e apresentavam os sintomas mais graves das doenças causadas pelo mercúrio. Essas doenças são diarreia, tremores, inflamação nas gengivas, fraqueza extrema e até demência.
Este é o ponto que deve ser trazido para o centro da agenda. É inconcebível que, em pleno século 21, seres humanos vulneráveis, como é o caso dos yanomamis e de outras nações indígenas, continuem expostos aos riscos causados pela omissão de quem tem a obrigação de protegê-los. Enquanto eles não forem postos em primeiro lugar nem contarem com a atenção de quem posa de defensor da floresta, mas que muda de ideia quando isso beneficia seus interesses, todo o discurso preservacionista em relação àquela região extensa, rica e vulnerável será inútil e não passará de mais uma das muitas lendas e mistérios da Amazônia.”
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