Redação
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O ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), assumiu em janeiro o cargo de senador pelo Maranhão, Estado do qual foi governador por dois mandatos.
Antes, exerceu o cargo de juiz federal, mas alcançou notoriedade mesmo na política.
Agora é indicado pelo presidente Lula (PT) para ser ministro do Supremo Tribunal Federal – depende apenas de aprovação em sabatina do Senado Federal.
Sua indicação tem gerado controvérsias, como colocado, no texto a seguir, pelo advogado Rafael Mafei:
“As indicações de Flávio Dino para o Supremo Tribunal Federal (STF) e de Paulo Gonet para a Procuradoria-Geral da República (PGR) não pegaram ninguém de surpresa. Pelo contrário, confirmaram uma tendência: a indicação para os mais altos cargos jurídicos do país está cada vez mais parecida com a indicação para cargos de governo. O presidencialismo de coalizão, com o Centrão, com tudo, chegou ao Judiciário – poder que também tem coronéis, ciosos de emplacar seus apadrinhados em cargos na Justiça e nos demais poderes. A disputa por uma indicação ao STF não escapa a essa lógica, o que distorce o requisito de ‘notável saber jurídico’ previsto na Constituição.
Elites jurídicas e políticas sempre estiveram ligadas por vasos comunicantes, mas nunca de forma tão aberta. Durante todo o tempo em que o nome de Dino foi especulado para o Supremo ao lado de outros ‘candidatos’ – no caso, Jorge Messias, advogado-geral da União, e Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) –, o debate público girou quase que exclusivamente em torno dos apoios e das resistências a cada um deles no governo, nos partidos, no Congresso e no Judiciário. Um observador atento do noticiário já terá decorado: Dino contava com a simpatia pessoal de Lula, mas não agradava tanto ao Senado e ao PT; Messias era mais próximo de Dilma do que de Lula, mas tinha o apoio do partido do presidente; e Dantas era o favorito da classe política e dos ministros do Supremo que se permitem pular de cabeça no jogo das indicações, Gilmar Mendes à frente.
Não era tão simples, porém, dizer o que os candidatos pensavam sobre temas jurídicos importantes, que são o objeto principal do trabalho de um ministro do STF. Isso vale inclusive para Dino, ministro da Justiça e Segurança Pública, cujas posições recentes não têm como ser diferenciadas da agenda do governo Lula, ao qual ele serve. Seu nome ganhou força, na reta final, por motivos estritamente políticos: o senador Jaques Wagner (PT-BA), um dos principais apoiadores de Jorge Messias, se indispôs com o STF depois de votar a favor da PEC que restringe as decisões monocráticas do tribunal. O advogado-geral da União, consequentemente, perdeu força. Dino foi quem sobrou de pé ao final de um tiroteio em que os próprios ministros do Supremo atuaram como pistoleiros.
Há certamente outros fatores na balança. Alguns analistas dizem que Lula, ao colocar Dino no STF, eliminou um potencial adversário na disputa pelos votos da esquerda em 2026. Seja como for, é tudo política. O pensamento e a qualidade técnica dos ‘supremáveis’ tornaram-se detalhes desimportantes. Isso não é de hoje, nem começou com Lula, pois, se vale para Cristiano Zanin, vale também para André Mendonça e Kássio Nunes, além de indicados por Fernando Henrique Cardoso. É coletiva a obra que enterrou o notável saber jurídico como critério para o STF.
O problema que daí resulta é evidente: o Supremo, como tribunal de cúpula, deveria ser a bússola de todo o Judiciário brasileiro, oferecendo respostas para os assuntos mais difíceis e complexos, às quais só é possível chegar por meio do esforço de juristas de alta capacidade, imbuídos do objetivo comum de extrair o melhor sentido das leis e da Constituição. Esse papel de liderança não pode ser cumprido por um tribunal cuja composição seja determinada, na prática, pelo mesmo tipo de jogo que orienta o preenchimento de quaisquer outros cargos políticos.
Nós, do direito, sempre acreditamos que a exigência do notável saber jurídico seria um dos mecanismos pelos quais a nossa comunidade (o ‘campo jurídico’) se protegeria da política. O presidente da República faria a indicação, o Senado a sabatina, mas só nós controlaríamos os parâmetros do tal ‘notável saber’, da mesma forma que só quem joga e conhece futebol é capaz de detectar um verdadeiro craque. É algo que pressupõe um ponto de vista interno, um olhar de quem vivencia a prática. Por mais que a escolha de um novo ministro coubesse a políticos, ela seria limitada a candidatos ungidos com uma distinção reputacional que só a comunidade jurídica poderia conferir.”
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