‘É possível ser gay e ganhar muitos títulos’, diz ex-goleiro do Grêmio, Emerson Ferreti

Publicado em 19/08/2022, às 12h01
Eleito melhor goleiro do Brasileirão de 2001 pelo Bahia e campeão da Copa do Brasil em 1999 pelo Juventude, falou sobre o preconceito que enfrentou fora dos campos | Foto: Reprodução/ Redes sociais -

Correio

Ídolo do Bahia e do Juventude, o ex-goleiro Emerson Ferretti decidiu falar sobre sua sexualidade. Aos 50 anos, ele revelou publicamente ser gay e contou como foi encarar o ambiente machista do futebol ao longo da carreira. A entrevista foi exibida no último episódio do podcast "Nos Armários dos Vestiários", produzido pelo site GE. 

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"O ambiente do futebol é muito hostil para um gay, muito mesmo. Eu fico imaginando quantos garotos desistiram de se tornar jogador de futebol por conta disso, por perceberem essa situação. Quantos talentos foram perdidos? O futebol perdeu, os clubes perderam, porque o ambiente realmente não ajuda. Eu segui com tudo isso, mas sofri com as consequências de seguir, era o meu sonho. (...) Eu queria ser um jogador de futebol. Eu conquistei isso, só tive que que enfrentar um outro lado que é muito difícil", afirmou o ex-jogador, que também defendeu Grêmio, Flamengo, América-RN, América-RJ, Ituano, Bragantino e Vitória.

Campeão da Copa do Brasil com o Juventude, em 1999, e bola de prata como melhor goleiro do Campeonato Brasileiro de 2001 com a camisa do Bahia, Emerson colecionava conquistas nas quatro linhas, mas se deparava com preconceito dentro e fora delas. 

"Não tive contato nenhum com o mundo gay até os 21 anos. E o que ouvia era o pensamento de todo mundo da família que reproduzia o pensamento da época e do local, o Rio Grande do Sul, um estado bem machista, conservador. Falavam que ser gay era sem-vergonhice, descaração, uma aberração. Era inferiorizado, muito relacionado à promiscuidade. Então, tudo o que era negativo, se jogava lá. Eu cresci ouvindo isso", contou o ex-jogador, que acredita ter tido menos oportunidades do que poderia".

"Eu parei de jogar com 35 anos, fui até o final, joguei em vários clubes. Sei que a fama me prejudicou bastante. Eu poderia até ter tido muito mais sucesso. Poderia ter feito muito mais coisas do que fiz, ter conquistado muito mais coisas. Eu acredito que é muito positiva (a carreira), principalmente por ter conseguido enfrentar tudo isso, ter sobrevivido até o final. O fato de ser gay não me parou, eu fui até o final. Mas sei de dirigentes que não me contrataram porque eu sou gay", afirmou.

Emerson também comentou o fato de não ter buscado esconder a sexualidade através de um casamento e as consequências dessa decisão.

"Lógico que existem gays no futebol, e muitos optam por casar. Dessa forma, eles se protegem, se enquadram num padrão que é aceito. Eles se protegem da suspeita de serem homossexuais e aí conseguem sobreviver. Só que normalmente, quando você faz isso, acaba levando uma vida infeliz, fazendo a outra pessoa infeliz. Eu optei por não casar. Optei por não enganar ninguém, por enfrentar tudo sozinho. Talvez aí também veio a fama, os comentários, porque eu nunca casei. Eu nunca aparecia com uma namorada, então esses comentários sempre surgiam. Quando tinha alguma reunião, algum churrasco de atletas que todo mundo levava a esposa, eu estava sempre sozinho. E, logicamente, os outros jogadores falavam muito, mas eu optei por enfrentar".

O ex-goleiro também revelou como se sentia solitário e admitiu ter sofrido depressão. "Eu sofri bastante. Várias vezes eu pensei em desistir. Tive depressão, principalmente por conta da solidão. Eu não tinha com quem dividir isso e era um peso muito grande nas minhas costas. E ao mesmo tempo precisava entregar desempenho, porque no futebol, se você não entrega desempenho, se não joga bem, perde a sua posição, perde contratos. Mas se preocupavam com a condição técnica, condição tática, a condição física, que são importantes. E o emocional? O futebol não virou um negócio? O objetivo não é receita? Então trate bem da saúde mental dos seus atletas", alertou.

Emerson contou que uma das motivações para falar sobre o assunto foi fomentar a discussão a respeito do tema e, consequentemente, combater o preconceito no futebol. 

"É possível ser gay, ídolo e ganhar títulos. Dá para ser um jogador talentoso. Dá para ter sucesso no futebol. Eu cumpri minhas obrigações dignamente. Fui profissional e entreguei desempenho, isso acaba me motivando para deixar um legado fora de campo também. Falar sobre o assunto, jogar luz sobre o assunto vai fazer, com certeza, primeiro, quebrar um pouco esse silêncio que existe, porque sempre existiu gay no futebol. Só que ninguém fala, todo mundo ignora isso, faz de conta que não tem".

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