Alvaro Avezum, diretor do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e um dos autores do trabalho, afirma que a descoberta pode ajudar no desenho de estratégias para prevenir o problema, que é a segunda principal causa de morte no Brasil. Nos resultados do estudo os pesquisadores observaram que a presença cumulativa dos problemas para dormir estudados pode aumentar a gravidade do acidente vascular em até 160%.

Outro estudo publicado pelos mesmos pesquisadores mostra que mitigar fatores de risco evita 9 em cada 10 dos óbitos causados pela doença no mundo. São eles hipertensão, sedentarismo, níveis elevados de colesterol, má alimentação, obesidade, fatores psicossociais, tabagismo, problema cardíacos, consumo de álcool e diabetes.

Na pesquisa, mais de 4 mil participantes, inclusive brasileiros, preencheram um questionário informando a qualidade do sono no mês corrente. O tempo de descanso de todos eles foi classificado entre curto, se menos de 5 horas, médio ou longo, quando mais de 9 horas. Distúrbios como dificuldade para dormir ou se manter dormindo, má-qualidade do descanso, cochilos longos ou não-planejados e até mesmo roncos foram relatados pelos voluntários.

Depois de analisar todos os dados informados, os pesquisadores contaram 2200 casos de AVC, dos quais 8 em cada 10 foram do tipo isquêmico, isto é, quando há obstrução de uma artéria do cérebro, e os demais hemorrágicos, quando se rompe um vaso cerebral. Chegaram à conclusão de que os distúrbios observados podem ser fatores de risco que agravam a severidade e aumentam o risco de derrame.

Coordenador do serviço de neurologia vascular do Hospital de Clínicas da Unicamp (Universidade de Campinas), Wagner Avelar afirma que o desconhecimento sobre a doença é o principal motivo para a sua gravidade. O especialista chama a atenção para a importância da prevenção, que envolve mudanças no estilo de vida para manter o mal súbito longe do radar. Parar de fumar, combater o sedentarismo com atividade física regular, evitar excesso de bebida alcoólica, controlar o sobrepeso e adequar a alimentação são algumas delas. Melhorar a qualidade do sono também.

Durante uma noite bem dormida uma série de reparações ocorre no nosso corpo. Existem flutuações hormonais, que podem inclusive ajudar a desobstruir vias sanguíneas onde há acúmulo de colesterol, diz o especialista.

Li Li Min, neurologista e professor titular da Unicamp, acrescenta que, apesar de ser um fenômeno repentino, todo AVC tem suas raízes no passado. São os anos de vida precedentes que definem a ocorrência do fenômeno.

Além de ajudar na regeneração do corpo, quem dorme mal pode ter picos de pressão, um dos fatores que pode contribuir para a ocorrência de derrames logo após acordar, período em que o risco de AVC aumenta em até 30%. A apneia do sono é outra característica que pode provocar esses acidentes vasculares.

A ocorrência também não tem idade. Em outra pesquisa feita por cientistas holandeses e também publicada na Neurology, mais de mil pacientes, com idades entre 18 e 49 anos, foram entrevistados. Os pesquisadores descobriram que os fatores de risco divergem conforme a faixa etária. Nos mais jovens o consumo de refrigerante, exercício físico intenso, sexo e uso de drogas se apresentaram como gatilhos para a doença, junto com febre e gripe.

Apesar de correrem risco, adolescentes e jovens brasileiro ainda desconhecem a doença. Entre 2019 e 2020, quase 4 mil questionários foram distribuídos em escolas do ensino fundamental, médio e universidades por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) para avaliar a conscientização dos estudantes. Apenas metade deles soube que o problema está relacionado com colesterol alto, cigarro, diabetes e hipertensão.

O professor Min destaca que o AVC se manifesta de maneira súbita, e por isso é importante considerar como um derrame qualquer alteração da função cerebral que ocorra de repente. A primeira medida que deve ser tomada é ligar para o 192 e chamar o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência).

O especialista ainda alerta que o paciente não deve ficar em casa esperando o problema passar. "Quanto mais tempo passa, mais neurônios e células nervosas morrem. É preciso que o atendimento seja o mais rápido possível. Até 4 horas e meia temos possibilidade de reverter o quadro e salvar a vida da pessoa."