Cade quer dados sobre venda de Botafogo, Cruzeiro e Vasco e avalia multa de até R$ 60 mi

Publicado em 04/06/2022, às 13h49
Gustavo Aleixo / Cruzeiro -

Folhapress

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) solicitou ao Cruzeiro e ao Botafogo informações sobre a venda dos clubes e poderá multá-los em até R$ 60 milhões por eles terem realizado a operação sem notificar previamente o órgão antitruste.

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Ao Vasco também foi encaminhado ofício com pedido de esclarecimentos, embora a transação envolvendo o time carioca ainda não tenha sido sacramentada. Os três clubes precisam apresentar as informações até o início da próxima semana.

De acordo com a legislação de defesa da concorrência, devem ser submetidos ao crivo prévio do conselho os chamados atos de concentração (fusão, aquisição, incorporação, contratos associativos e outras operações) em que pelo menos um dos grupos envolvidos tenha faturamento bruto anual ou volume de negócios no país igual ou superior a R$ 750 milhões.

Além disso, a outra parte no negócio precisa ter registrado faturamento ou movimentação igual ou maior do que R$ 75 milhões.

O descumprimento da exigência de notificação prévia implica penalidades como multas, que variam de R$ 60 mil a R$ 60 milhões. Um processo administrativo para apuração de infração à ordem econômica também pode ser instaurado, e a operação corre risco de ser anulada.

Apesar de a lei ser aplicada a empresas, há uma discussão se os clubes de futebol seriam obrigados a se submeter a essa regra.

Atualmente, os times em sua maioria são associações sem fins lucrativos. Uma lei aprovada no ano passado pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), no entanto, passou a permitir a conversão de um clube em SAF (Sociedade Anônima do Futebol) -também conhecida como clube-empresa.

No processo de migração, as SAFs passam a ter donos ou sócios investidores. O Cruzeiro e o Botafogo já adotaram o modelo, o que permitiu a venda do controle dos times.

O empresário norte-americano John Textor, sócio do Crystal Palace (ING), comprou 90% da SAF do Botafogo, com a promessa de realizar R$ 400 milhões em investimentos. Já o Cruzeiro vendeu a SAF do clube ao grupo comandado pelo ex-jogador Ronaldo.

No caso do Vasco, o clube fechou nos Estados Unidos um acordo para venda de 70% de sua futura SAF. A transformação ainda não está fechada. Por R$ 700 milhões, a porcentagem deve ser negociada com o fundo americano 777 Partners.

No entendimento de autoridades da concorrência ouvidas reservadamente pela Folha, uma interpretação literal da lei poderia excluir os clubes das regras antitruste. No entanto, o Cade pode fazer uma análise mais elástica do direito concorrencial.

Preliminarmente, pode-se avaliar que, ao se tornar uma SAF, um clube passa a ser automaticamente notificável pelo Cade. Mas, como se trata de um tema novo, a questão ainda precisa ser analisada para firmar um entendimento no órgão.

De acordo com uma das autoridades, é preciso levar em conta que os clubes exploram uma atividade econômica importante para a sociedade, em que são realizadas transações milionárias. Embora a lei da SAF tenha um dispositivo que impeça o acionista controlador do clube-empresa de ter participação em outro clube-empresa, afirma essa autoridade, o risco para a concorrência não estaria completamente afastado.

O questionamento central é: e se o controle de uma SAF é vendido a um grupo empresarial que já tem ações de outro time? Nesse caso, assessores do Cade avaliam, podem ser criados entraves concorrenciais no mercado do esporte, diminuindo a competição e trazendo prejuízos ao consumidor.

Há também uma preocupação sobre patrocínios cruzados entre clubes.

Aos três clubes o Cade solicitou cópias dos contratos e informações detalhadas da operação, tais como quem são os compradores e a estrutura societária da SAF, antes e depois da transação. O órgão também quer a lista de acionistas e cotistas diretos e indiretos.

Entre outros dados, ainda foi requerida a relação de empresas em que a SAF tenha participação acima de 20% no Brasil, o faturamento bruto de todos os envolvidos no país, além de todas as linhas de produtos e serviços ofertados pelo clube em que poderiam ser verificadas sobreposições com o grupo comprador.

A recusa, omissão ou retardamento dos dados solicitados pelo Cade pode gerar punição com multa diária de R$ 5 mil, podendo o valor ser aumentado em até 20 vezes.

Questionado pela reportagem, o Botafogo afirmou que foi procurado pelo Cade e que apresentará as respostas no prazo estabelecido. O Cruzeiro também disse que vai atender ao pedido do órgão e responder os questionamentos.

O Vasco disse que ainda está no prazo para responder e que a negociação para a venda da SAF ainda está em andamento.

Qual o problema analisado pelo Cade? - De acordo com a legislação de defesa da concorrência, devem ser submetidos ao crivo prévio do Cade os chamados atos de concentração (como compra ou fusão) em que pelo menos um dos grupos envolvidos tenha faturamento bruto anual ou volume de negócios no país igual ou superior a R$ 750 milhões. Os clubes não notificaram previamente o órgão antitruste das negociações para criação das SAFs.

Os clubes deveriam ter notificado o Cade? - Apesar de a lei ser aplicada a empresas, há uma discussão sobre os clubes serem obrigados a se submeter a essa regra.

Os clubes são empresas? - Os times em sua maioria são associações sem fins lucrativos. Uma lei aprovada no ano passado pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), no entanto, passou a permitir a conversão de um clube em Sociedade Anônima do Futebol (SAF).

Quais dos times em análise são SAFs? - O Cruzeiro e o Botafogo já foram convertidos em SAFs, o que permitiu a venda do controle dos times.

Que consequências essa primeira análise do Cade pode ter? - O descumprimento da exigência de notificação prévia implica penalidades como multas, que variam de R$ 60 mil a R$ 60 milhões. Um processo administrativo para apuração de infração à ordem econômica também pode ser instaurado, e a operação ainda corre risco de ser anulada.

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